Praça da Paz Celestial, 25 anos depois

Onda revolucionária na China foi massacrada, mas as consequências marcam o país

Há 25 anos, em 4 de junho de 1989, os tanques e soldados enviados pelo governo chinês esmagavam a ampla mobilização de jovens e trabalhadores reunidos na Praça da Paz Celestial (Tiananmen), em Pequim. Milhares de manifestantes foram mortos, feridos ou presos – o número exato é desconhecido até hoje.

 

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Comício estudantil na Praça da Paz Celestial (Tiananmen) em 1989

Os burocratas do Partido Comunista Chinês (PCC) acusavam os ocupantes da praça de serem “contrarrevolucionários”. Na verdade, as palavras de ordem e os cartazes dos manifestantes deixavam claro que defendiam as conquistas da Revolução de 1949, mas não podiam aceitar os privilégios dos dirigentes do partido e do governo, imersos na corrupção. Lutavam por democracia e pelo direito de organização, contra os burocratas que ousam falar em nome do socialismo enquanto introduziam “reformas” pró-capitalistas.

A mobilização alcançou dimensão gigantesca em menos de dois meses.

No dia 15 de abril de 1989, morreu Hu Yaobang, ex-secretário do PCC. Ele havia sido afastado do poder porque se opusera à repressão às manifestações estudantis de dezembro de 1986. Por essa razão, os estudantes o consideravam um dirigente mais democrático, e pediam a sua reabilitação. Defendiam que ele fosse homenageado “pela extensão da democracia”.

No dia 21 de abril, 200 mil jovens, trabalhadores e aposentados manifestaram-se na Praça da Paz Celestial para prestar homenagens a Hu, apesar da proibição oficial. Outras manifestações começaram a ocorrer em vários pontos do país. No dia do funeral, os manifestantes gritaram diante dos governantes presentes: “Tremei, corruptos, o povo acorda!” e “Viva a democracia! Viva a liberdade!”.

Foi o início de uma onda revolucionária que se estendeu por seis semanas. Na Praça da Paz Celestial, e também em todas as grandes cidades chinesas, multiplicaram-se as manifestações reunindo milhões de jovens, operários e funcionários públicos contra a burocracia.

O pano de fundo dessa insatisfação era a política desenvolvida pelo PCC desde 1978. A chamada “abertura ao mercado” provocava naquela época as primeiras demissões, o aumento do custo de vida e da corrupção, que hoje em dia alcançam níveis muito maiores.

 

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Estudantes e trabalhadores juntos nos protestos de 1989.

 

As massas tinham necessidade de seus próprios órgãos de defesa. Por isso, os estudantes constituíam sindicatos, independentes do Estado, com delegados e dirigentes eleitos. O mesmo começou a ocorrer com os operários. Esse poderoso movimento, intolerável para o PCC, foi esmagado por meio da violenta repressão militar executada em Pequim e em toda a China.

GREVES E MANIFESTAÇÕES EM 2014

O que pode ser dito da situação chinesa hoje, 25 anos depois desse massacre que marcou tão profundamente uma geração de combatentes pelo socialismo no mundo todo?

Em entrevista à edição de 5/6 do jornal “Informations Ouvrières” (Informações Operárias), do Partido Operário Independente da França, o presidente da Comissão de Inquérito China, Alain Denizo, afirma que “essa imensa onda revolucionária que submergiu o país e fez vacilar o todo-poderoso PCC representou uma virada, e suas consequências ainda marcam a situação atual”.

Prova disso, diz Denizo, é a ocorrência cada vez mais comum de greves nas fábricas chinesas: “No primeiro trimestre deste ano houve mais de 400 greves e manifestações operárias, num país onde esses dois direitos não são reconhecidos”.

Ele continua: “Como escrevemos em um jornal recente, há um ‘renascimento do movimento operário chinês’, na medida em que os operários procuram tomar seu destino em mãos, ou seja, se organizar recusando a tutela do partido. Ocorre um debate muito rico no interior da classe operária, entre os militantes, os professores universitários, e mesmo alguns quadros dirigentes do sindicato oficial ACFTU”.

 

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Lutas operárias desenvolvem na China: greve na Panasonic, 2011.

PAÍS “SOB TENSÃO”

O presidente da Comissão de Inquérito – criada em janeiro de 1990 depois de uma campanha de milhares de assinaturas de militantes operários contra a repressão e pela libertação de sindicalistas presos em 1989 – avalia que a China está “sob tensão”. Diz isso com base em recentes acontecimentos: “No interior do país, assiste-se a uma multiplicação de atentados. O último, em 22 de maio, causou 39 mortes em um mercado, na província de Xinjiang, rica em petróleo e gás. Outros enfrentamentos já haviam ocorrido ali, entre grupos qualificados de ‘separatistas’ uigures (povo majoritário na província) e forças da polícia, mas agora são atentados que buscam semear o terror e a morte entre a população. Externamente, batalhas navais que arriscam ampliar-se ocorrem em torno de ilhotas contestadas no Mar da China, sem falar dos frequentes exercícios militares de navios estadunidenses, japoneses e sul-coreanos. Além disso, a desaceleração do crescimento inquieta muito, ainda mais porque o PCC apela ao ‘mercado’ para criar empregos! E esse mercado está em plena crise em escala internacional”.

Esses elementos, avalia Denizo, aliados a uma crise na direção do PCC, indicam que os ingredientes para uma nova confrontação estão mais uma vez reunidos.

Cláudio Soares

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PT ROMPEU RELAÇÕES COM PC CHINÊS

Poucos dias depois do massacre da Praça da Paz Celestial, reuniu-se o 6º  Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores (16 a 18/6/1989).

Sob o impacto dos acontecimentos, foram aprovados vários encaminhamentos, entre os quais o envio de telegrama rompendo relações políticas entre o PT e o PC Chinês. Decidiu-se também pela realização de campanha, dirigida ao governo da China, pela libertação dos prisioneiros.

Na resolução aprovada pelo Encontro pode-se ler (trecho):

“O governo chinês decretou guerra ao seu próprio povo. O autodenominado Exército Popular fez no final de semana de 3 e 4 de junho um banho de sangue que poucas vezes se viu na história. A China conta seus mortos, e os trabalhadores de todo o mundo olham estarrecidos a barbárie cometida, em nome do socialismo, pelos dirigentes chineses.

O PT, que defende o socialismo com liberdade, não poderia se calar neste momento trágico, que obscurece a imagem do socialismo aos olhos dos trabalhadores de todo o mundo.

Um comunicado oficial do governo, transmitido no domingo pela TV, dizia que o Exército acabou com uma tentativa de golpe contrarrevolucionário, comandada por bandidos. A mais sórdida mentira estava sendo contada pelos burocratas assassinos, para esconder a verdade que as telas da TV mostraram a todo o mundo nas últimas três semanas.”

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