Violência contra as mulheres

Cúpula da Igreja Católica pressiona contra descriminalização do aborto

O Conselho Federal de Medicina (CFM) recentemente anunciou que vai enviar à comissão do Senado que analisa a reforma do Código Penal um documento em que defende o direito da mulher de abortar até a 12ª semana de gestação.

Segundo o CFM o objetivo é dar solução para um dos mais graves problemas de saúde pública no Brasil: a morte de 200 mil mulheres ao ano em decorrência das consequências dos abortos clandestinos. O maior número de mortes incide, sobretudo, sobre as mulheres negras e pobres que não têm dinheiro para pagar clínicas com médicos e instalações seguras.

O Brasil possui uma das legislações mais retrógradas em relação ao aborto, só permitido nos casos de risco à saúde da gestante ou quando a gravidez é resultante de estupro. O médico Cristião Fernando Rosas, da federação de ginecologia e obstetrícia (Febrasgo), assinalou que a proibição “nunca reduz o número de abortamentos, ao contrário, a taxa de abortos é muito maior nos países com leis restritivas” (OESP, 22/03).

Roberto D’Ávila, presidente do CFM, diz que o país precisa quebrar o tabu em relação ao aborto, destacando que “vivemos em um Estado laico” e, por isso,as políticas de saúde pública devem ser “adotadas de acordo com o que a sociedade quer e não com o que alguns grupos permitem” (OESP, 21/03).

Frente à posição do CFM, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), reagiu dizendo que defender o aborto é “criar mentalidade de violência”! Isso quando a proibição faz do aborto clandestino a quinta causa da morte de mulheres brasileiras.

Desacreditada por sucessivos escândalos sexuais e financeiros, a cúpula da Igreja Católica está apostando grande parte de suas fichas na promoção da Jornada Mundial de Jovens no Rio de Janeiro, em julho.

Durante a campanha eleitoral de 2010, por orientação do então papa Bento XVI, a igreja pressionou para que Dilma se comprometesse a não adotar nenhuma medida para a descriminalização do aborto.

Hoje, ao invés de preocupar-se em defender a vida das mulheres que morrem em consequência de abortos clandestinos, o governo Dilma prefere aplaudir e financiar o encontro de jovens da Igreja Católica no Rio. É o que mostra a fala do ministro Gilberto Carvalho: “entendemos que, para além dos benefícios que a Jornada trará para uma comunidade religiosa, ela sem dúvida nenhuma transbordará nos seus benefícios, nas suas consequências, frutos pra toda a juventude brasileira” (OESP, 06/02). Frutos para a juventude brasileira?

É uma vergonha que Dilma deixe de afirmar a independência do estado laico diante das pressões de dogmas religiosos e não tome medidas concretas para tirar o país do atraso em uma questão que é de vida ou morte para centenas de milhares de jovens brasileiras. A descriminalização do aborto é uma questão de saúde pública e a maneira de garantir que a mulher decida o que fazer com seu corpo.

Francine Iegelski

Matéria publicada na edição nº 727 do Jornal O Trabalho

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