Venezuela: termina um ano muito difícil

Mas o governo Maduro não foi derrubado e há resistência do povo trabalhador

A eventualidade de um golpe de Estado que derrubasse o governo de Nicolás Maduro na Venezuela esteve muito presente no período transcorrido entre dezembro de 2015 e agosto de 2016.

Como se recorda, em 6 de dezembro de 2015 o chavismo sofreu uma grande derrota eleitoral nas eleições para a Assembleia Nacional, que passou a ter uma maioria de 2/3 da opositora Mesa de Unidade Democrática (MUD).

Desde então agudizaram-se os efeitos da “guerra econômica” promovida pela burguesia local associada ao imperialismo, que se combinaram com o agravamento da queda dos preços do petróleo (que chegaram ao piso de 22 dólares o barril), a redução do ingresso proveniente das exportações (que chegou a zero) e uma persistente seca que afetou o aprovisionamento de energia elétrica e produtos agrícolas.

O cenário se completava com o desabastecimento, hiperinflação, contrabando, presença de paramilitares, ONGs conspirativas e provocações.

No plano político, a MUD fazia campanha pelo referendo revogatório do mandato de Maduro, utilizando-se também da carta de um julgamento político do presidente pela Assembleia Nacional, inspirando-se no golpe do “impeachment” do Congresso do Brasil contra a presidente Dilma Rousseff.

Como pano de fundo dessa situação crítica estava a reiterada ofensiva do imperialismo norte-americano que persegue o objetivo de recuperar o controle da principal reserva petrolífera do continente.

Diferentemente de outros governos denominados “progressistas”, o chavismo havia confrontado abertamente os Estados Unidos, se chocado com os interesses da burguesia rentista apoiando-se na mobilização do povo trabalhador, o que o converteu, para o imperialismo, numa prioridade de governo a ser derrubado.

Ao iniciar-se o mês de maio, essa a crise atingia seu ponto mais alto e a possibilidade de o governo ser derrubado converteu-se em algo real e imediato. As pesquisas assinalavam que apenas 20% da população apoiava o presidente Maduro.

Maduro resistiu e seu governo não caiu

O 1º de maio de 2015, de forma até emblemática, deu início a uma contraofensiva do chavismo, com o anúncio pelo governo de aumentos nos salários e de medidas para enfrentar a “guerra econômica”.

O povo trabalhador, que é a base social do chavismo, e mesmo os setores populares que são críticos a Maduro mas não se identificam com a oposição (ainda que possam nela votar, como “castigo” ao governo) decidiram não entrar na onda de incitação permanente à explosão social e saques que era animada fervorosamente pela direita e os meios de comunicação que ela dispõe (jornais e TVs privadas).

Uma parte importante do chavismo continuou mobilizando-se permanentemente, as organizações de base não implodiram. Conselhos comunais e unidades básicas do PSUV (partido criado por Hugo Chávez), setores sociais e organizações sindicais dos trabalhadores não se paralisaram diante da crise.

Nessa situação, foi chave o presidente Maduro ter anunciado medidas como a constituição de Comitês locais de abastecimento e produção solidária (CLAPS) e a criação da Missão de abastecimento soberano, que foram acompanhadas por aumentos de salários e vale alimentação, assinatura de convenções coletivas e outorga de novas pensões aos aposentados pelo governo.

Um setor da cúpula do chavismo já começava a planejar uma retirada, promovendo a aproximação com a oposição e a burguesia local que, segundo seus cálculos, ao obterem concessões importantes, poderiam diminuir a pressão e até passar a integrar o governo. Atitude derrotista que foi compartilhada por distintos personagens instalados em diversos níveis do poder (governadores de Estados, prefeitos, altos funcionários).

O presidente Maduro resistiu e não caiu renunciar a seu cargo e seguiu defendendo a orientação social que havia adotado, num momento em que estava sendo submergido pela “guerra econômica” e submetido a fortes pressões internas para fraquejar diante da burguesia.

Na Venezuela está terminando um ano muito difícil, no qual houve possibilidades efetivas de que o governo fosse derrubado da pior forma possível e em que houve pressões muito fortes para que o presidente Maduro renunciasse. Nem uma, nem outra coisa ocorreram, fundamentalmente pela resistência do povo trabalhador chavista que, pouco a pouco, foi retirando terreno dos pés daqueles que queriam encurtar o mandato do atual governo.

Ao mesmo tempo, abre-se um panorama com indicadores macroeconômicos e geopolíticos – neste caso, a crise do imperialismo aprofundada com a eleição de Trump nos EUA – mais favoráveis para a continuidade do governo Maduro.

Assim, o mais provável é que se torne mais difícil um golpe de Estado em 2017, o que levará para o terreno eleitoral o conflito entre o chavismo e a oposição pró-imperialista, conflito que será determinado, em última análise, pelo combate de resistência dos trabalhadores e setores oprimidos da nação venezuelana.

Alberto Salcedo, de Maracaibo (Venezuela)

Artigo originalmente publicado na edição nº 799 do jornal O Trabalho de 1 de dezembro de 2016.

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