China: a situação da classe trabalhadora na abertura da Assembleia Nacional Popular

A Assembleia Popular Nacional (APN) foi aberta em Pequim em 22 de maio. Ela é composta de deputados eleitos de forma muito controlada pelas províncias, pelas regiões autônomas e os municípios vinculados diretamente às autoridades centrais e ao Exército. Dos 2980 membros, 2119 são membros do PC chinês, partido no poder. Em que situação?

Para o tabloide do PC chinês Global Times (19 de maio), “temos que admitir que a epidemia de Covid-19 atingiu a economia chinesa e nós sentimos o golpe. Adicionalmente, a recessão mundial, as tendências ao aumento do conservadorismo, a intensificação do confronto sino-americano e o complicado contexto da opinião pública, afetaram a China em diversos graus.”

Para a Confederação Sindical de Hong Kong (HKCTU), num estudo publicado em 6 de maio, “ainda é muito difícil avaliar o impacto da epidemia na economia chinesa. Apesar do governo ter anunciado que a taxa de desemprego permaneceu em 5,9%, Li Xunlei, diretor do Zhongtai Securities, assinalou no relatório ‘Qual é a taxa de desemprego real da China?’ (26 de abril) que os números oficiais não correspondem à situação econômica atual. Ele calcula que a taxa de desemprego na China é de 20%”. Entretanto, depois que seu relatório foi publicado, Li Xunlei, que declarou não ter sido o autor, foi transferido para outra companhia (Beijing News, 30 de abril).

E o Boletim do Trabalho da China, uma publicação independente (NdOT), lembra em 21 de maio que a APN “este ano deveria anunciar a realização do primeiro ‘objetivo centenário’ do Partido, a instauração de uma ‘sociedade moderadamente próspera até o fim de 2020’”. Contudo, pelas razões expostas, “este objetivo parece cada vez mais distante para os milhões de trabalhadores que foram demitidos ou que sofreram a suspensão dos contratos e a baixa dos salários”.

Ele explica a experiência dos trabalhadores do vestuário, numa fábrica no delta do rio das Pérolas, reveladora da situação dos trabalhadores com baixos salários em todo o país, desde o ano novo lunar. Aqui estão os fatos: “De acordo com os regulamentos do governo provincial de Guangdong, os empregados deveriam retornar ao trabalho em 10 de fevereiro mas, com um risco de infecção pelo Covid-19 muito alto, o patrão solicitou a todos os empregados que fizessem ‘um sacrifício pelo bem da empresa’ e aceitassem uma licença sem salário até o fim daquele mês. Depois que a fábrica retomou sua produção, em março, a propagação da pandemia na Europa e Estados Unidos resultou num intenso cancelamento de pedidos e na falta ou perda de trabalho dos operários da cadeia de produção. O patrão inicialmente anulou todas as horas-extras, depois começou a pedir aos empregados que se demitissem.

Os trabalhadores que ficaram viram seus salários cair drasticamente. Antes da pandemia, o pessoal trabalhava geralmente seis dias por semana, fazendo horas-extras suficientes para ganhar mais de 5.000 yuans num mês intenso. Agora, sem horas-extras e só com o salário base, os trabalhadores ganham 2.000 yuans por mês, que não dá para sobreviver nas cidades do delta do rio das Pérolas. Com a redução de mais de 50% nos salários, muitos operários sentiram que não tinham outra escolha, senão aceitar a ‘demissão voluntária’ oferecida pelo patrão, mesmo se isso significava abrir mão da indenização à qual eles tinham direito por lei, se tivessem sido demitidos. Muito poucos locais de trabalho estão contratando atualmente, e somente para trabalhos precários de curta duração com pouco ou nenhum benefício social. Mesmo no setor de serviços, que antes servia como rede de segurança para os trabalhadores demitidos das fábricas, os empregos estão cada vez mais difíceis de encontrar, após três meses de retração.”

E conclui: “O sonho de uma sociedade moderadamente prospera, que antes parecia ao alcance da China, afasta-se rapidamente para uma ampla gama de trabalhadores. Se o governo e os sindicatos não agirem com urgência para recolocar esse sonho no caminho certo, as consequências para o Partido poderão ser graves.”

Albert Tarp

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