Chile: por que votar “Aprovo” em 4 de setembro?

Entrevistamos o dirigente da Confederação Bancária do Chile, coordenador do movimento “Não Mais AFP” (fundos de pensão privados) e membro do Comitê Internacional de Ligação e Intercâmbio (CILI), Luís Mesina.

Mesina, no “estalido social” que sacudiu o Chile ao final de 2019, foi o porta-voz da Unidade Social, conjunto de organizações populares e sindicais que se somaram aos protestos. Foi candidato independente à Convenção Constitucional, com mais de nove mil votos, e por pouco não foi eleito. Durante todo o período em que os constituintes elaboraram a nova carta, junto a seus companheiros sindicalistas e da coordenação “Não Mais AFPs”, ele esteve ativo na elaboração de propostas de iniciativas populares em temas caros à classe trabalhadora.

O Trabalho: Porque se deve votar pelo “Aprovo” em 4 de setembro?
Luís Mesina:
Por varias razões, a mais importante, porque reconhece o Chile como um “Estado social e democrático de direito”, o que supõe deixar para trás a Constituição Pinochetista que consagrava o Estado chileno como subsidiário, deixando todo o terreno da economia para a iniciativa privada, limitando completamente a ação do Estado.

Além disso, a proposta de nova Constituição reconhece certos direitos como fundamentais. Saúde, seguridade social, educação, moradia passam a adquirir uma categoria superior à da atual Constituição que havia entregado esses direitos a organismos privados, o que os converteu em negócios nestes 41 anos. E, talvez o mais importante, a nova Carta consagra a liberdade sindical com caráter constitucional, estabelecendo o direito à sindicalização, de greve e de negociação coletiva por ramo. Consagra também o sindicato como a única organização titular exclusiva de direito, portanto, a única representante dos trabalhadores na negociação coletiva.

O plebiscito se realiza após os primeiros cinco meses de governo Boric. Como vem sendo a sua ação inicial e como repercute entre os que o elegeram?
Nos primeiros meses a ação do governo tem sido um tanto errática. O povo tinha muitas expectativas, afinal trata-se do presidente mais jovem e que obteve a mais alta votação das últimas décadas. Sua eleição aparecia como a concretização das demandas da revolta de 18 de outubro de 2019. Entretanto, sofrendo uma pressão enorme da direita que não lhe perdoa o mínimo erro, o governo abandonou parte importante de seu discurso de transformações que a cidadania exigia, como o fim das AFPs, a desmilitarização do Wallmapu (território indígena Mapuche), dentre outras. Todo esse discurso foi sendo moderado na tentativa de tranquilizar a direita que pressiona e o grande empresariado que resiste às mudanças prometidas.

Essa pressão da direita é tamanha que o governo interferiu no processo constituinte antes que se sancione no 4 de setembro a nova Constituição, ao anunciar a sua vontade de modificar a Carta uma vez aprovada, o que seria uma transgressão aberta da soberania popular. Uma atitude que revela a disposição do governo de deslizar ainda mais à direita para ter maior governabilidade. O que envolve, ao mesmo tempo, muitos riscos, pois o povo teria que tolerar que se desconheça a sua vontade expressa durante todo o período aberto com o estalido social.

Em 4 de setembro há duas alternativas: aprovar ou rechaçar. Aprovar implica iniciar uma nova etapa de transformações que a Constituição por si só não resolverá, mas oferece uma saída. Rechaçar implica ficar com a Constituição de Pinochet e um modelo que privatizou os direitos sociais e reduziu o sindicalismo à sua mínima expressão. É o que estará em jogo no próximo 4 de setembro.

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