As notícias que nos chegam de companheiros da Coordenação Autônoma e Independente de Trabalhadores (CAIT) dão um sinal de alerta: a partir do governo de Nicolás Maduro e do PSUV, gradualmente estão sendo desmantelados os pilares do processo “bolivariano” iniciado por Hugo Chávez.
Esse processo regressivo se dá nas dramáticas condições impostas pelo bloqueio do imperialismo dos EUA ao país, que hoje são agravadas pela crise geral do sistema capitalista e a pandemia. A luta pelo fim do bloqueio e das sanções à Venezuela é central e incondicional: trata-se da defesa da soberania nacional.
Mas, em 31 de agosto, Maduro indultou 110 presos, a maioria deputados e líderes da oposição pró-imperialista acusados de conspiração, acenando para uma “reconciliação nacional”. Como explicar isso em relação às eleições para a Assembleia Nacional do próximo 6 de dezembro?
Programa econômico destruiu os salários
Em 2014, em seu primeiro mandato, Maduro adotou o “regime especial de investimentos” que abriu espaço para as multinacionais na Faixa do Orinoco (petróleo e metais). Em 2016, o seu governo promoveu uma desvalorização brutal do bolívar (moeda nacional), ao mesmo tempo que devolveu empresas a seus antigos donos, liberou preços e entregou recursos públicos ao setor privado. Tudo em nome de “sobreviver ao bloqueio de Trump”, o que não impediu o colapso da economia.
Já em 2018, após a sua reeleição contestada por Trump e outros, foi lançado o Programa de Recuperação e Prosperidade Econômica (PRPE), acentuando a abertura ao setor privado e acompanhada por uma política salarial regressiva.
O ministro da planificação, Ricardo Meléndez, impôs tabelas salariais por cima das convenções coletivas, dizendo que o aumento do salário mínimo naquele ano para 1.800 bs (30 dólares) era tão “integral” que dispensava os direitos inscritos na Lei Orgânica do Trabalho (LOTT). A hiperinflação comeu aquele aumento em poucos dias e hoje o salário mínimo alcança 800 mil bs (2,5 dólares).
A destruição dos salários empobreceu a níveis jamais vistos a classe trabalhadora, enquanto altos funcionários, gerentes de empresas públicas – muitos deles militares – bem como os empresários privados, chamados de “burguesia revolucionária” por autoridades do governo, tiveram sua renda aumentada, ampliando a desigualdade social.
Daí as mobilizações e greves que se multiplicavam contra a política salarial do governo quando chegou ao país a Covid-19. Muitas delas foram reprimidas e outras criminalizadas com lideranças perseguidas, demitidas e presas. Neste ano, em meio à quarentena, houve protestos de petroleiros e de outros setores em defesa dos salários e da LOTT. Um movimento que se choca com a cúpula da CSTB (central sindical bolivariana), cooptada pelo governo.
O momento pré-eleitoral
Em 18 de agosto, Maduro anunciou que a Assembleia Constituinte seria encerrada em dezembro, após as eleições para a Assembleia Nacional. Apesar das expectativas que criou na base popular do chavismo, a Constituinte serviu apenas para o Executivo passar suas propostas, diante de um parlamento, eleito em 2015 com maioria opositora, que apoiava o “autoproclamado” Guaidó, marionete de Trump.
De olho numa eventual vitória de Biden nas eleições dos EUA (novembro), Maduro adotou um discurso de “reconciliação nacional” dirigido a setores da oposição, tendo obtido um eco favorável de Capriles, oponente de Chávez em 2012. Com Guaidó desmoralizado, a oposição está dividida entre boicotar ou participar das eleições.
Entretanto, o Partido Comunista (PCV), o PPT e outras formações políticas que participaram junto com o PSUV do Pólo Patriótico em eleições anteriores, lançaram a Alternativa Popular Revolucionária condenando a política atual de Maduro como contrária à herança de Chávez, defendendo os salários e denunciando as privatizações e a repressão ao movimento sindical e popular.
O CAIT prepara uma plataforma para intervir nesse processo eleitoral, dirigindo-se aos candidatos que se reivindicam da classe trabalhadora. Voltaremos ao assunto em próximas edições.
Lauro Fagundes