Luta contra o PL 1904 ganha as ruas

Uma forte reação ganhou as redes sociais e as ruas das principais cidades do país, contra o Projeto de Lei 1904/2024, o qual transforma em crime o aborto em caso de estupro realizado a partir da 22a semana de gestação e equipara a pena do aborto realizada a partir desse estágio à de homicídio (até 20 anos de prisão). Como está sendo largamente debatido, as maiores vítimas desse PL são crianças e adolescente que representam 8 em cada 10 vítimas de estupro no país e que, em 70% dos casos, são violentadas dentro de casa.

Na quarta-feira (12), o presidente da Câmara Federal, Arthur Lira (PP-AL), aprovou o regime de urgência para o projeto em 23 segundos. Na quinta, dia 13, milhares de mulheres e homens realizaram atos em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. A resposta imediata se estendeu com uma rodada de atos já convocados pelo Brasil desta sexta até segunda.

A forte mobilização das mulheres e sua posição de vanguarda na luta contra o bolsonarismo e demais setores reacionários surpreendeu a todos aqueles que apostaram que o PL teria uma avenida aberta. Tanto os patrocinadores da proposta, como Lira, quanto o governo federal, que refém do cenário no Congresso Nacional afirmava que não reagiria (assim como os deputados – e deputadas – do PT, entre os quais poucos se manifestaram desde o início).

Aliás, em 48 horas, o governo Lula passou de liberar o voto da bancada governista a dizer que vai ”trabalhar para que um projeto como esse não seja votado”, nas palavras de Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais, em entrevista na sexta (14).

O proponente do PL, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), havia dito que a bancada evangélica queria testar Lula – o que em si já é revoltante ao colocar em risco a vida de crianças e mulheres só para atender interesses do podre jogo parlamentar. O mais revoltante é o fato de Lula e o PT ter aceitado lavar as mãos nessa pauta histórica dos movimentos das mulheres – pelo menos até que a indignação explodiu.

Histórico
A possibilidade de realização do aborto legal a partir da 22a semana, através do método nomeado assistolia fetal, tem sido alvo desde o final do ano passado, quando o prefeito de São Paulo suspendeu o serviço no Hospital Vila Nova Cachoeirinha, único serviço municipal da cidade que realizava o procedimento.

Depois, o Conselho Federal de Medicina editou uma resolução que proibia médicos de realizarem a assistolia. A resolução vigorou por cerca de 2 meses. Neste período, as defensorias públicas e a Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia reuniram casos de meninas e mulheres que tiveram seu direito ao aborto negado; e o Conselho Regional de Medicina de São Paulo suspendeu o registro profissional de duas médicas que supostamente teriam realizado o procedimento meses antes da resolução entrar em vigor.

No dia 17 de maio, o ministro do supremo, Alexandre de Moraes, suspendeu a resolução do CFM. Foi no mesmo dia que o PL 1904 foi apresentado na Câmara Federal. A bancada evangélica se preparava para uma aprovação a galope da proibição.

Depois de anos de ofensiva reacionária na questão do aborto, a maré pode virar nesta pauta, a partir da indignação generalizada da população. Indignação plenamente legítima, em defesa da vida das meninas e mulheres vítimas de violência sexual, e é obrigatório manter a luta contra o PL 1904 em alta.

O combate a este PL é ponto de unidade e deve ser o foco nessa mobilização, mas também é possível aproveitar a brecha aberta para debater com mais setores da sociedade sobre a necessidade de encarar a questão do aborto como uma questão de saúde pública, buscando os argumentos para dialogar com aquelas pessoas – uma grande fatia da população – que é contra o aborto de forma geral, mas é firmemente favorável em casos de violência sexual. Neste caso, como em muitos outros, a melhor defesa é o ataque.

Priscilla Chandretti

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