GAZA – Em que pé está o “plano de paz de Trump”?

A suspensão dos bombardeamentos durou apenas um instante

A trégua do lado israelense durou apenas um instante. Em 19 de outubro, uma explosão em Rafah destruiu uma escavadeira conduzida por um colono israelense. Acusando imediatamente o Hamas de ter rompido a trégua, Benjamin Netanyahu ordenou o fechamento dos corredores humanitários e reiniciou os bombardeios. 

Naquela mesma noite, ele se gabou de ter lançado 153 toneladas de bombas sobre Rafah. Resultado: 44 civis mortos, incluindo mulheres e crianças. A versão oficial, porém, rapidamente desmoronou: a escavadeira havia passado por cima de uma munição israelense não detonada. Milhares de engenhos semelhantes ainda estariam espalhados pela Faixa de Gaza.

Sob pressão dos EUA, Netanyahu é imediatamente forçado a reabrir a passagem da ajuda humanitária e a reconhecer a realidade do incidente. Apesar dos fatos, a imprensa israelense ainda continuou por um dia inteiro a acusar o Hamas, mencionando supostos combatentes que surgiram de um túnel.

De acordo com o gabinete de imprensa do governo de Gaza, Israel cometeu 47 violações do cessar-fogo desde a sua entrada em vigor: disparos contra civis, ataques direcionados, prisões arbitrárias. Estes ataques prolongam a lógica genocida de destruição sistemática iniciada há dois anos. Desde o início da guerra, em outubro de 2023, foram identificados 68.216 mortos e mais de 170.000 feridos em Gaza, de acordo com os números divulgados pela agência Wafa em 20 de outubro de 2025.

Diante dessa escalada, os emissários de Donald Trump tiveram que lembrar a Netanyahu que “o direito à autodefesa não justifica o questionamento do cessar-fogo”. No terreno, o exército israelense definiu uma “linha amarela” intransponível, anexando de fato cerca de 60% do território de Gaza. Além dessa linha (ver mapa…), toda a presença palestina está sob controle total.

A aceleração da retomada do controle da situação diretamente pelo próprio Trump se explica em parte pelo caos diplomático provocado pelo ataque israelense a Doha em setembro, com o objetivo de matar os negociadores do Hamas que se encontravam lá. O Catar, mediador-chave entre Israel e o Hamas, é um parceiro estratégico e um terreno de negócios muito lucrativo para Jared Kushner, genro de Trump e principal negociador do “plano de paz”. Na CBS, Kushner explicou que, após o ataque a Doha, os círculos dirigentes estadunidenses consideraram que “os israelenses estavam perdendo o controle” e que era necessário “impedi-los de prejudicar seus próprios interesses”. Witkoff, enviado especial dos EUA, por sua vez, denunciou uma perda de confiança do Catar em relação a Washington: “Nos sentimos traídos”, disseram-lhe em Doha.

Um elemento importante dessa retomada está relacionado ao aumento da rejeição a Israel no mundo, à multiplicação das sanções oficiais impostas por países como a Espanha, aos processos judiciais movidos nas mais altas instâncias do mundo, aos apelos generalizados ao boicote, à organização de flotilhas, com ajuda humanitária. Neste contexto em que a imagem de Israel desmorona, mesmo nos Estados Unidos, inclusive no seu próprio campo, Trump decidiu reagir, acelerando um acordo à sua maneira.

Thomas Barrack, um dos seus conselheiros mais próximos, resume a visão do presidente estadunidense: “Cooperar através da segurança e do investimento.” Tradução: a paz como alavanca econômica, com uma ordem regional estabilizada pelos fluxos financeiros e pelos investimentos. Neste contexto, trata-se de preservar a todo custo o Estado israelense, ao mesmo tempo em que se tomam medidas para controlá-lo, pois ele continua sendo o principal braço armado do imperialismo dos Estados Unidos na região.

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