“Por que nós? Por que as crianças palestinas?”

Entrevista com Munir Naser, da Juventude Sanaud

Nesse momento de mobilização em várias partes do mundo frente ao genocídio em curso na Palestina, conversamos com Munir Naser, membro da Juventude Sanaud. A Sanaud é um agrupamento de jovens descendentes de árabes no Brasil que existe para amplificar a luta do povo palestino por sua libertação. Com presença nas principais cidades do país, ela tem sido importante para o engajamento da juventude na luta contra a guerra e por um futuro digno. 

Quase metade da população na Faixa de Gaza é de jovens (até 18 anos). Em que condições vivem esses jovens, numa região que sofre com a ingerência externa há décadas?
A taxa de alfabetização é alta, muitos tem curso superior. Mas 50% estão desempregados ou não estudam, por conta do bloqueio promovido por Israel, por ar e terra. Faltam muitos recursos. Até a entrega de água é calculada. Medida de “campo de concentração”. Um a cada três jovens já pensaram em suicídio. É uma negação do direito a vida, violência física e psicológica. Crianças desenvolvem transtornos como na fala e na cognição, de forma recorrentes. 

Você enxerga uma relação com as condições de vida dos jovens brasileiros, sobretudo nas periferas das grandes cidades? 
É uma relação direta, não apenas da Faixa de Gaza mas também da Cisjordânia onde forças militares e colonos israelenses assediam e agridem os jovens. É a mesma violência da Polícia Militar brasileira que ontem mesmo matou um jovem de 24 anos à luz do dia no Capão Redondo em SP. Essa prática é comum nos territórios palestinos ocupados. O Brasil é um dos maiores compradores de tecnologia e treinamento militar israelense. São as mesmas armas. Jovens lá e aqui tem o mesmo inimigo: o imperialismo que mata pelo lucro. Israel lucra com a morte dos jovens brasileiros, na Palestina e em vários lugares do mundo onde há parceira economica e militar. 

Recentemente, a Sanaud divulgou o vídeo de uma criança palestina cobrando com muita energia: “Por que nós? Por que as crianças palestinas? Queremos liberdade, assim como todas as crianças árabes”. Na sua visão, como essa declaração se conecta com os jovens ao redor do globo, que cada vez mais tem sua sobrevivência confrontada pela sanha de guerra do sistema capitalista?
As crianças palestinas são as mais afetadas pela guerra. O número de crianças mortas nesse conflito atual (cerca de quatro mil) já supera vários outros conflitos existentes no mundo. O grito “queremos ser livres” ecoa em várias partes do mundo. Na verdade as crianças árabes no sul do Líbano, na Síria, no Iraque, no Iêmen, sofrem com a guerra imposta pelo imperialismo, através de Israel, da União Europeia, dos Estados Unidos. De Ucrânia e Rússia aos países árabes, as potências lucram enquanto os jovens pagam o preço. Infelizmente é o que acontece, hoje nos conectamos nessa luta contra o inimigo, para libertar os povos oprimidos no mundo todo. 

Também foi distribuído o vídeo de um grupo de crianças participando de uma vigília em Gaza pelo fim dos bombardeios. Como se dá o engajamento da juventude palestina nas mobilizações no território?
Elas estão nas mobilizações, nas vigílias, exigindo fim dos bombardeios. É um engajamento forte na luta pela libertação palestina. Jovens jornalistas fazem cobertura em várias línguas. Correm vários riscos para fortalecer a mobilização e a luta ao redor do mundo. Motaz, Plestia, Bisan e Abod são exemplos, tem entre 17 e 25 anos. Jovens na Cisjordânia também estão enfrentando o sionismo, a exemplo da militante Ahed Tamini, 22 anos, presa por Israel dois dias atrás. É um papel fundamental na manutenção da esperança e no fracasso da limpeza étnica. A juventude palestina é uma massa, com espírito de luta e resistência, em condições extremamente difíceis. 

Para além de cessar o fogo imediatamente, que solução é necessária para por um fim ao genocídio dos jovens palestinos?
Para por fim ao genocídio dos palestinos é preciso romper as relações com Israel em escala global, isso inclui Lula e o Brasil. Esse Estado Sionista precisa acabar. O caminho é a construção de um Estado Palestino, livre, laico e soberano, com suas fronteiras reestabelecidas, com uma Constituinte que atenda os dois povos (judeus e árabes), que garanta o direito ao retorno dos refugiados e desocupe as terras invadidas. Muitos palestinos foram expulsos e até hoje guardam a chave de suas casas com esperança de retorno. Israel tenta expulsar a população de Gaza, mas eles não saem. Essa resistência não é do Hamas, é do próprio povo palestino.

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