“Quando eu morrer quero ir de FAL e de bereta/ chegar no inferno e dar um tiro no capeta / E o capeta vai gritar desesperado / meu Deus do céu, tira daqui esse soldado / Quando eu morrer quero meu último desejo / Ser enterrado numa pista de rastejo / E o coveiro tem de ser um bom guerreiro / Abrir a minha cova com granada e morteiro”.
Este canto do exército foi entoado por crianças e jovens que marchavam pelas ruas de Brasília com uniformes “pré militares”. A cena chocante, divulgada por um vídeo do Portal Metrópoles, tem se tornado comum em diversas cidades grandes e médias brasileiras, onde florescem academias paramilitares, sob o registro, na receita, de cursos preparatórios para concursos e exames das escolas militares oficiais.
Antes vendidos para pais de alunos como uma chance para ingresso em colégios militares, foram transformados em campos de doutrinação ideológica de extrema direita e até treinamento para uso de armas.
A jornalista Vanessa Lippelt publicou no site “Congresso em Foco” uma longa investigação. Nela, Vanessa relata a situação na “Academia Militar Mirim”. Seu proprietário, Maurício Almeida, informa que “a iniciativa é 100% privada” e que não há “nenhuma ideologia política que seja aplicada durante o curso”. Mas em vídeos disponibilizados na internet é possível assistir crianças, alunas da Academia Militar Mirim, encerrando suas atividades com o brado “Brasil Acima de Tudo”, grito de guerra das Forças Armadas incorporado ao marketing político do presidente Jair Bolsonaro.
Treinamento com réplicas de armas
A mesma reportagem denuncia com detalhes a organização paramilitar de um desses cursos, a Força Pré-Militar Brasileira (FOPE). “No manual, disponível na internet, é possível ver que a FOPE apresenta uma hierarquia dentro da escola emulando uma instituição militar de fato. Há o comandante pré-militar, o 1º oficial pré-militar, 2º oficial pré-militar, 1º sargento pré-militar, 2º sargento pré-militar” e assim por diante, até o recruta pré-militar.
Nas redes sociais deste curso é possível ver jovens com réplicas de fuzis e outras armas em treinamentos.
O aliciamento de crianças e jovens para entrar nesses cursos ocorre em todo lugar, inclusive dentro de escolas públicas. Segundo um professor da rede pública de Minas Gerais, ouvido por O Trabalho, “homens com vestimentas de tipo militar entraram na escola em que leciono e começaram a passar em sala fazendo propaganda do curso, autorizados pela direção. Com tom autoritário, típico de militares, exigiam silêncio de jovens que não eram seus alunos, chamavam crianças de 13 anos de ‘senhores’, repreendiam qualquer comentário enquanto prometiam mundos e fundos da carreira militar, transmissão de ‘valores cívicos’ e treinamentos físicos.”
Alexandre Linares