A visita de Nicolás Maduro a Brasília para a reunião de chefes de Estado da América do Sul promovida por Lula evidencia um degelo em curso. Em 2019, quase 60 países negavam legitimidade ao seu governo, hoje, há um reconhecimento implícito da “comunidade internacional” do seu mandato, que nunca deixou de governar na Venezuela.
O início da guerra na Ucrânia levou o governo Biden dos EUA a ajustar a sua política diante da Venezuela, visando o suprimento de petróleo e gás a mercados que dependiam da Rússia. Isso aliviou um pouco a pressão sobre o país, mesmo se permanecem as sanções mais duras.
A enfática defesa de Lula ao direito do Estado venezuelano estar representado em reuniões internacionais foi um apoio muito importante recebido por Maduro num contexto de erosão do poder hegemônico dos EUA. Um avanço que ampliou a sua reinserção no cenário internacional e a legitimidade de seu governo.
As declarações feitas por Lula ao lado de Maduro provocaram reações. O Departamento de Estado dos EUA afirmou que “a política estadunidense respalda o esforço conjunto com a comunidade internacional para abordar a situação humanitária na Venezuela, bem como apoia as negociações que levem a eleições livres”. Os presidentes do Uruguai, Luís Lacalle Pou, e do Chile, Gabriel Boric, fizeram críticas ao governo venezuelano. Apesar dessa posição, Boric designou um novo embaixador para Caracas. A direita brasileira aprovou, na Câmara dos Deputados, uma moção de rechaço à visita de Nicolás Maduro.
Na Venezuela, o que causou desconcerto foi o anúncio de Maduro sobre o oferecimento de energia elétrica ao Brasil, apelando a investidores privados para reconstruir a linha de transmissão, pois há apagões elétricos em quase todos os estados do país.
O momento da situação
As políticas implementadas atualmente pelo governo Maduro são aquelas exigidas pela oposição liberal e de direita há décadas: privatizações, eliminação do controle de câmbio e a dolarização das transações econômicas.
O governo avança numa política de substituir reajustes reais de salários por bônus, o que, além de destruir os salários, afeta as prestações sociais, violentando a Constituição. Há salários mensais equivalentes a 5 dólares, muito abaixo do que organismos internacionais estabelecem como salário de pobreza extrema (57 dólares), o que barateia as demissões, além de ter gerado a emigração de milhares de trabalhadores e o aumento da desigualdade social.
O país segue mergulhado numa crise persistente. A oposição de direita tem um lucrativo negócio com o bloqueio do país (contas no exterior, dolarização). Passamos da situação de resistir aos ataques do imperialismo para a de entrega da soberania econômica nacional.
Daí vem a deriva autoritária e bonapartista do governo que persegue partidos da Revolução Bolivariana, como o PPT, UPV, Tupamaros e o Partido Comunista (PCV). Há criminalização, detenções e processos contra trabalhadores e sindicalistas que exigem seus direitos laborais.
Diante do cenário eleitoral que se abre em 2024, não há clareza sobre que rumo tomará o processo aberto com a chegada do chavismo ao poder.
Alberto Salcedo, de Maracaibo