Em Curitiba, professora é punida por ensinar Marx, alunos reagem
No início de julho, um trabalho de sociologia dos alunos do primeiro ano de uma escola pública de Curitiba causou o afastamento da professora. Motivo? O ex-blogueiro da Veja, Rodrigo Constantino, a acusou de fazer “doutrinação marxista”.
Com o título “Marx é Baile de Favela”, o trabalho dos alunos do 1º B do Colégio Estadual Profª Maria Gai Grendel consistia em uma paródia do funk Baile de Favela, com uma letra que abordava o pensamento de Karl Marx, a partir da matéria vista em sala e que consta das Diretrizes Curriculares.
Diz a letra:
… “Os burgueses não moram na favela/
Estão nas empresas explorando a galera/
E os proletários, o salário é uma miséria/
Essa é a mais-valia, vamos acabar com ela.
O vídeo alcançou mais de 150 mil visualizações em menos de 24 horas e virou alvo dos conservadores.
A partir da “denúncia” feita por Constantino na página do Facebook da escola, o Núcleo de Educação afastou a professora de sociologia Gabriela Viola das aulas. Gabriela é professora PSS, ou seja, tem um contrato precário como professora.
Alunos reagem e direção a recua
O afastamento gerou imediata mobilização dos estudantes, que iniciaram a campanha #VoltaGabi. No dia 6, os alunos fizeram um protesto silencioso durante a execução do Hino Nacional e oração (os alunos são obrigados a rezar todos os dias) e, durante o intervalo, cantaram a paródia. A direção da escola tentou impedir a filmagem do protesto e chamou a Polícia Militar, que entrou na escola fortemente armada para intimidar os alunos. A intimidação chegou ao cúmulo de um representante do Núcleo de Educação passar em sala, com a direção da escola para ameaçar os estudantes de negar a matrícula deles no ano que vem em toda a região.
A partir de toda essa mobilização dos estudantes e com a intervenção do Sindicato, a professora pôde retornar à escola na segunda, dia 11, mas essa luta não acaba aqui.
“Assédio ideológico?!”
Não é possível aceitar esses ataques. Tais tentativas de proibir autores ou assuntos com a desculpa fajuta de “doutrinação” significam proibir parte do conhecimento humano e científico.
É exatamente isso que os vários projetos de “Escola Sem Partido” pretendem: a liquidação do conhecimento científico. Todos os projetos ligados ao tal programa, como o PL 867/2015 do deputado Izalci Lucas Ferreira (PSDB- -DF), defendem que os professores, livros didáticos, avaliações e vestibulares devem apresentar “as principais versões, teorias, opiniões e perspectivas concorrentes”, independentemente de serem científicas ou acadêmicas ou serem meros chutes preconceituosos.
Outro projeto, o PL 1411/2015 do deputado Rogério Marinho (PSDB/ RN), tipifica o crime de “assédio ideológico” em sala de aula, prevendo cadeia e multa aos professores que ousarem apresentar qualquer conhecimento acadêmico que contrarie o que ensinado no “ambiente familiar”. Mais 11 estados tem projetos semelhantes.
Os apoiadores do golpe do impeachment são seus autores.
Maurício Moura
Artigo originalmente publicado na edição nº 790 do jornal O TRABALHO de 21 de julho de 2016.