Trabalhadora de Call Center relata luta e condições de trabalho durante pandemia

No dia 19 de março trabalhadores da empresa de Call Center “AlmaViva” em Juiz de Fora – MG realizaram uma manifestação que paralisou as atividades exigindo medidas de proteção contra a pandemia do Coronavírus. O movimento levantou uma série de reivindicações, num setor que foi considerado pelo governo como “Essencial” e que emprega muitos jovens, com baixos salários e condições precárias de trabalho.
O Trabalho entrevistou uma jovem trabalhadora da empresa (que por razões de segurança não vamos identificar), sobre o movimento e a situação dos trabalhadores neste momento.

O Trabalho: Como trabalhadores da AlmaViva começaram a organizar a paralisação e a manifestação no dia 19/03?

Começou dentro das operações mesmo com insatisfação de muitos e muitos funcionários. E nem só operadores mas também supervisores insatisfeitos porque a empresa AlmaViva não estava tendo nenhum posicionamento perante seus funcionários para prevenção do coronavírus. Então começou dentro das operações, foi espalhando pelos corredores de manhã do dia 18. Quando chegou de tarde já tinha um grupo e facebook pra espalhar pra todo mundo.

O Trabalho: E qual foi o resultado da manifestação? Na AlmaViva eles passaram a agir diferente ou a liberar pessoas?

A manifestação aconteceu no dia 19, na quinta-feira, mas os resultados passaram a vir mesmo na segunda. De imediato, dia 20 eles liberaram férias de uma semana, férias de 15 dias para alguns operadores, mesmo assim as operações continuaram pouco cheias no sábado.

A partir de segunda as operações já estavam mais vazias, então fizeram esquema de colocar um operador e pular um operador, distância de uma P.A. (posto de atendimento).
Outra coisa é o álcool em gel que já tinha, porém tava sempre em falta porque os operadores usavam com frequência e eles não estavam dando conta de repor e a partir de segunda-feira eles começaram a repor com mais frequência.

Outra coisa também é um produto similar ao “veja” e um paninho flanelinha. Começaram a dar um paninho por dia pra cada operador pra gente chegar pra trabalhar e limpar nosso P.A.

Já sobre liberar pessoas: a opção que as pessoas tinham era, se tiver com suspeita de coronavírus, vai no médico e pega atestado ou então a empresa tava liberando mas depois como ficou número muito grande com suspeita, a empresa começou dar férias pra essas pessoas. Se a pessoa tá com suspeita a empresa dava férias de 15 dias e assim tava indo. Outra coisa que passaram a fazer após a manifestação foi procurar saber das grávidas e idosos pra poder liberar eles das operações, que são pessoas consideradas de alto risco.

O Trabalho: E a empresa cumpriu com o que tinha se comprometido?

A empresa disse, através dos seus gerentes de operações que se preocupa com a saúde dos funcionários, que estava tomando medidas pra prevenção do contágio da doença, que estava sim preocupada com a atual situação. Porém começam a tomar medidas que depois não conseguem sustentar totalmente, porque se chega no dia 20 pra trabalhar, tem flanelinha, produto pra limpar a P.A.. Aí quando chega na outra semana já tá faltando pano pra limpar, quando o pano chega, chega 1 h depois do horário que a pessoa pega na empresa, então você já tá ali, você já tá trabalhando, já ta tocando no mobiliário sem fazer higiene porque não tem material pra fazer higiene.

Outra coisa, eles pensam na operação em afastar um Posto de Atendimento mas quando chega no refeitório tava em aglomeração. Só mudaram isso no dia que a vigilância sanitária foi visitar a AlmaViva. Muito estranho isso, por que não fizeram antes, mas só no dia que a vigilância sanitária foi visitar? E agora iniciou uma nova semana, estamos no final de março.

Desde o dia da manifestação até hoje já mudou muita coisa. Hoje se chega pra trabalhar e já não tem nem mais o pano, de novo, pra você limpar seu P.A.. Tem o produto, que eles mudaram, que não é similar ao veja, tem um produto que é usado em hospitais, segundo o que eles falaram.

Porém a gente vê que ainda tem um descaso com o funcionário. Tem operador gripado dentro da operação, operador com “tosse de cachorro”, tá dentro da operação. E o que a AlmaViva faz? Dá uma máscara pro funcionário, e simplesmente fala com ele que tem que ficar numa P.A. exclusiva e pra não ficar mudando, mas mesmo assim vai chegar um operador em outro turno e vai trabalhar na mesma P.A. que ele.

O Trabalho: Como você tem visto a atuação do governo Bolsonaro nessa situação?

Infelizmente a atuação do governo Bolsonaro nessa situação é a pior. Porque a gente sabe que estamos com um governo que só favorece quem é de classe alta, quem tá em casa e não precisa trabalhar. Quem é de classe baixa, quem é pobre e precisa trabalhar tá se ferrando com esse governo. Temos um presidente que fala que é simplesmente uma gripezinha. Ele não sabe o que é trabalhar num call center, onde o fluxo de pessoas é muito alto. Então seja uma gripezinha ou um vírus que mata, o contágio é muito rápido. A aglomeração de pessoas acontece não só dentro da operação, ela acontece nos corredores, é onde a gente vai, é na hora de entrar e de sair. E ele não tá vendo isso.

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