A solução declarada pelo Banco Central dos Estados Unidos para o aumento dos preços: aumentar o desemprego!

Na conferência anual de Jackson Hole em agosto, o presidente do FED, banco central dos Estados Unidos da América, deixou claras suas decisões: vai aumentar fortemente a taxa de juros do banco central, pois o desemprego precisa ser aumentado para trazer a inflação de volta a 2% ao ano (ela atingiu 10%).

Por Christian Coudène, para o Informations Ouvrières (Paris, 02/11/2022)

Se, por exemplo, o FED empresta a 1% ao BNP ou à Société Générale (bancos franceses), eles, por sua vez, emprestam a 2,5% a indivíduos para a compra de sua casa e a 3% para a compra de um carro. Qualquer aumento na taxa do FED é, portanto, repassado em cascata para as famílias e para as empresas. O crédito se torna mais caro, tanto para investimento quanto para consumo. O FED já aumentou as taxas duas vezes em 0,75 pontos percentuais este ano, e espera-se que o faça novamente em novembro.

A inflação aumenta

Desde 2020, as quebras das cadeias de produção provocaram desabastecimento, que foi imediatamente explorado para especulação sobre mercadorias que se tornaram mais escassas no mercado (commodities, energia, transporte, semicondutores etc.). Além disso, a precarização dos empregos e o congelamento dos salários, num primeiro momento, impediram o aumento dos salários, o que acentuou a perda do seu poder aquisitivo.

Em seguida, a ruptura das cadeias produtivas piorou por causa da guerra na Ucrânia. Somam-se a isto as medidas de confinamento na China, o aumento da especulação sobre commodities e produtos alimentícios e a corrida armamentista.

Diante do agravamento da inflação e do aumento das greves por salário, o FED decidiu atacar duramente e está causando reações de pânico nos governos, entre os jornalistas e até mesmo no júri do prêmio Nobel de Economia, que é um painel de banqueiros suecos.

Rumo à uma nova crise financeira

Com o aumento dos conflitos em torno poder de compra, o FED restringe o crédito para forçar capitalistas e governos a resistirem às exigências de aumentos salariais. A desaceleração na atividade tem duas consequências contraditórias. Ela provoca o aumento do desemprego como meio de chantagear os trabalhadores para se opor às reivindicações, que é de fato o objetivo. Mas as empresas são estranguladas por essa desaceleração nas suas vendas, enquanto seus custos disparam devido à especulação desenfreada sobre os preços da energia, e elas não podem aumentar seu endividamento por causa do aumento das taxas de juros.

As falências na França aumentaram acentuadamente no terceiro trimestre. O desacordo entre a França e a Alemanha que veio à tona na Cúpula Europeia de 20 de outubro, diz respeito à divergência de interesses entre os dois países em salvar o que ainda resta da União Europeia.

A gestão de massas de capital fictício

Assim, embora a inflação seja o resultado da política dos bancos centrais que tentaram superar a crise financeira de 2008 fornecendo enormes quantidades de capital aos bancos, eles resolveram fazer uma ofensiva brutal para conter os salários e acentuar o caos, enquanto o aumento das taxas de juros estadunidenses empurra para cima o dólar; os países europeus, que têm que pagar por suas importações de energia e matérias-primas em dólar, são pressionados a reforçar suas medidas de austeridade.

O Banco Central Europeu (BCE) é obrigado a seguir o FED. O imperialismo dos Estados Unidos está reduzindo a Europa ao mínimo possível. A decisão do FED tem efeitos em todos os outros países. A queda espetacular da Libra esterlina ilustra o impasse dos governos pró-mercado. Liz Truss, então 1ª ministra do Reino Unido, que pensava estar satisfazendo os mercados financeiros cortando impostos para os ricos, segundo os métodos até aqui recomendados pelos banqueiros, foi varrida pelos mesmos mercados financeiros, que exigem uma clara ofensiva contra os salários e conquistas sociais que estão sendo corroídos no Reino Unido, onde a pobreza está assumindo proporções dramáticas. Liz Truss não havia entendido os sinais do Fed.

Macron mostrou-se preocupado pelo fato de “seus amigos noruegueses e americanos” venderem seu gás para países da União Europeia quatro vezes mais caro do que para seus próprios fabricantes nacionais, o que cria uma grande desvantagem para as indústrias europeias, cuja competitividade desaba diante dos gigantes americanos.

A Europa em pânico…

O Ministro da Indústria francês, entrevistado pelo jornal Les Echos, indica o risco de uma nova onda de relocalizações e teme um colapso da indústria. A Alemanha decidiu apoiar maciçamente sua indústria com 200 bilhões de euros de ajuda, mas não quer suportar o peso de uma despesa à escala da UE para conter o preço do gás, sabendo que sua parte do fardo (é o principal contribuinte para a UE) é como enxugar gelo diante do jogo dos EUA, que utilizam a guerra. A Cúpula Europeia deve camuflar o que está explodindo tudo: a pressão dos Estados Unidos, tanto por meio da Otan como pelo FED …

Os países “emergentes” em uma situação crítica

Na semana passada, o FMI e o Banco Mundial advertiram sobre as consequências das decisões do FED sobre os chamados países “emergentes”, como Egito, Hungria, Turquia etc. Eles se beneficiaram da queda das taxas de juros globais em 2008-2015 para contrair dívidas. Favoreceram os investimentos financeiros de bancos estrangeiros, principalmente dos EUA, e de outros fundos de investimento. No entanto, agora estão arbitrando a favor de investimentos em dólares, já que o dólar continuará a subir enquanto o FED aumentar suas taxas. Antecipando a escassez de dinheiro (em dólares) nesses países, os bancos abandonam o barco repatriando capital para os Estados Unidos, o que eleva ainda mais o dólar. Assim, as moedas desses países caíram de 15 a 20% nos últimos meses, com a consequente aceleração da inflação.

A moeda da Índia está em queda, o que significa riscos financeiros, mas também pressão para novas relocalizações, porque quando a moeda de um país se desvaloriza em relação ao dólar, o custo dos salários em dólares cai de acordo. E as multinacionais comparam esses custos ao decidir em qual país se instalar. O risco de um pânico bancário está se tornando mais claro, e os bancos estadunidenses se prepararam para isso, em certa medida. A Europa e os países “emergentes” estão no olho do furacão. O colapso do tipo do Líbano ou do Sri Lanka está no radar do FMI como uma possibilidade também em países maiores.

Daí as críticas, mesmo no interior dos EUA, acusando de “egoísmo” o FED, que ignora as consequências de suas decisões sobre outros países. Esta crítica sempre floresceu em tempos de crise do dólar.

Uma recompensa

O Prêmio Nobel de Economia acaba de ser concedido a três especialistas em pânico financeiro. O mais conhecido é Ben Bernanke, que esteve à frente do FED de 2006 a 2010 e, portanto, administrou o gigantesco resgate dos bancos estadunidenses de 2007 a 2010. Em seu livro de “memórias”, ele relatou essa gestão. Vemos ali, a partir do próprio interior do capital financeiro, o desenvolvimento das estratégias dos financistas. Muito revelador. Ao escolhê-lo, os banqueiros suecos estão prestando uma espécie de homenagem a sua decisão de liberar cinco trilhões de dólares para permitir aos bancos superar a gigantesca fraude do subprime nos EUA. Mas isso só vem reforçar o pânico daqueles que esperam novos truques para enfrentar um caos muito maior hoje.

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A Europa à beira do abismo

De acordo com as estatísticas da Comissão Europeia publicadas na quinta-feira 27 de outubro, a inflação está atualmente acima de 10% na zona do euro e estabeleceu um novo recorde em outubro.

Em uma entrevista ao Journal du dimanche (JDD) em 30 de outubro, intitulada “A Europa está mais vulnerável ao risco de recessão”, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, fez o seguinte diagnóstico: “Nossas previsões colocam metade das economias da zona do euro em recessão técnica, ou seja, dois trimestres consecutivos de crescimento negativo. E até mesmo três trimestres para a Itália e Alemanha”.

Duzentos mil empregos ameaçados na França

O mesmo jornal, que abre com a manchete “Alerta vermelho na economia”, acrescenta à observação: “A crise energética, que é ainda mais dolorosa do outro lado do Reno, onde a produção já diminuiu, arrasta a maioria dos países para a zona de perigo”.

Segundo Jean-Eudes du Mesnil, secretário geral da Confederação das Pequenas e Médias Empresas (CPME), citado pelo semanário: “150 mil empresas estão em perigo de morte” na França.

Também na mesma publicação: “8.950 processos coletivos (de falências comerciais, Nota do editor) foram abertos entre 1 de julho e 30 de setembro, um salto de 69% em comparação com o verão de 2021. Este é um aumento sem precedentes nos últimos vinte e cinco anos. Ao longo de um ano, a marca de 38 mil quebras foi superada”.

Thierry Millon, especialista em dados de negócios, citado pelo JDD, estima que 200 mil empregos poderiam estar em risco caso 50 mil empresas fossem fechadas em 2023. “O número de falências que pensávamos atingir em dois anos será alcançado em apenas um”, antecipa.

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