Passada uma semana do intento frustrado de golpe de Estado no Brasil, qual é a situação política no país e os desafios postos diante dela?
As intenções golpistas de Bolsonaro eram anunciadas há muito tempo, pelo menos desde os atos de massa promovidos pelo então presidente em 7 de setembro de 2021. A iminência de um golpe ficou ainda mais evidente nos dois meses de acampamentos bolsonaristas diante de quartéis do Exército pedindo uma intervenção militar que anulasse a vitória eleitoral de Lula de 30 de outubro.
Era um golpe anunciado e esperado, mas que ainda assim pegou o governo Lula, uma semana após a sua posse triunfal diante de mais de 200 mil manifestantes em Brasília, desprevenido e desguarnecido.
Entre 4 a 5 mil pessoas foram trazidas à luz do dia à capital federal orientadas a invadir o Palácio do Planalto, o STF e o Congresso, golpistas e fascistas que pediam uma intervenção militar. Para que a turba chegasse aos seus alvos houve uma clara conivência de autoridades do GDF e do Comando do Exército, como foi amplamente reportado.
A intervenção federal decretada por Lula na Segurança da capital federal, horas depois do início das ações golpistas, seguida pelo afastamento do governador do GDF Ibaneis (MDB) pelo ministro do STF Alexandre Moraes, permitiram restabelecer a ordem, desalojando os bolsonaristas dos prédios ocupados e vandalizados, com muitos deles presos. Empresários que financiaram os ônibus e estadia dos golpistas em Brasília, muitos ligados ao agronegócio, também estão na mira da Justiça e com bens bloqueados.
Ao longo da semana, o ex-ministro da Justiça e secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, que viajara a Orlando (EUA) para encontrar-se com Bolsonaro, teve sua prisão preventiva decretada por Moraes e o próprio Bolsonaro, à pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), foi incluído no inquérito que apura responsabilidades sobre a tentativa de golpe.
Mas faltam entre os “peixes grandes” comprometidos com a ação golpista chefes das Forças Armadas, em particular do Exército, que até o momento não foram incomodados, apesar de terem claramente faltado com suas obrigações. É certo que Lula falou diante de jornalistas que as Forças Armadas, “ao contrário do que pensam”, não são um “poder moderador” e que deveriam ater-se às suas funções constitucionais. Mas, ao mesmo tempo, José Múcio, que falou que os acampamentos golpistas eram “manifestação democrática”, foi prestigiado como ministro da Defesa.
As manifestações nas ruas de capitais em defesa do governo Lula e contra o golpe em 9 de janeiro, marcadas pelos gritos de “Sem anistia” e “Bolsonaro na cadeia”, as pesquisas que indicaram 93% de desaprovação da ação golpista, a raríssima unidade na sua condenação por parte de partidos, governadores (inclusive os eleitos com apoio de Bolsonaro), indicam que agora é o momento de levar a contra-ofensiva até o fim, o que implica a “desbolsonarização” do aparelho de Estado, por certo, mas também a limpeza no comando das Forças Armadas, que, se não ocorrer, manterá a ameaça de golpe pairando no ar, prolongando a tutela militar sobre os poderes de Estado.
Num cenário de crise econômica mundial e diante dos estragos em todos os níveis herdados do governo Bolsonaro, o principal apoio que Lula terá para governar será a maioria explorada e oprimida do povo, a qual espera medidas concretas que melhorem as suas condições de vida e trabalho. O apoio de tipo “união nacional” contra os golpistas, alimentado pela grande imprensa que fala em isolar “terroristas” e “bolsonaristas radicais” (como se houvesse os “moderados”), pode evaporar-se diante da primeira medida do governo Lula que desagrade o “mercado”.
Neste momento, levar até o fim a apuração e condenação de todos os envolvidos no intento golpista de 8 de janeiro é o mais urgente. Se isso for feito, será um passo firme para mais adiante abordar as profundas reformas nas instituições políticas que a nação brasileira pede para alcançar a plena democracia e a soberania popular e nacional.
14 de janeiro de 2023
Julio Turra