COP 27: um fracasso anunciado

A eleição de Lula acabou sendo a “melhor notícia climática” 

por Julio Turra

Quando a ativista ambiental Greta Thumberg, rosto presente em todas as  conferências de clima da ONU desde 2018 na Polônia, anunciou que não viajaria ao Egito para a COP 27, já não havia muitas  expectativas de avanço em acordos sobre a questão do meio ambiente nessa conferência de governos, empresários e sociedade civil acolhida por um regime ditatorial (ver abaixo). 

A ativista sueca hoje diz que as COPs não produzem efeitos práticos pois “não são destinadas a mudar todo o sistema”. Ela não deixa de ter razão, mas o fracasso anunciado da COP 27 se deve diretamente à guerra que explodiu na Europa logo após a COP anterior de Glasgow, detonando os planos de “consenso” para a “transição climática” ali acordados. 

Afinal, a guerra na Ucrânia, com a escassez de gás russo vital para a economia européia, provocou uma corrida para aumentar a produção de petróleo, gás e até mesmo carvão, que deveriam ser substituídos por “energia limpa”.

Os líderes mundiais, como Biden e Macron, até fizeram discursos no Egito “em defesa do planeta”, mas rapidamente se deslocaram para a reunião do G 20 na Indonésia em 15 e 16 de novembro, onde o tema  era a guerra na Ucrânia e o interlocutor principal o chinês Xi-Jin-Ping (na ausência de Putin, representado por seu chanceler Lavrov). 

O que deveria ser o centro da COP 27, a reparação aos países pobres pelos danos ambientais provocados pelas emissões poluentes das  grandes potências industriais, se reduziu a uma promessa do presidente dos EUA de 180 milhões de dólares de ajuda para toda a África, uma soma irrisória.

Um palanque para Lula 

Assim, a presença de Lula, presidente eleito do Brasil, e seu discurso em 16 de novembro, acabaram sendo o destaque da mídia internacional e junto aos participantes da COP 27. Com Bolsonaro ausente, tanto da COP como do G 20, Lula aproveitou a ocasião para reuniões bilaterais com enviados da China, EUA e outros líderes, transmitindo a mensagem que “o Brasil está de volta à agenda climática”.

Em seu discurso principal, Lula associou a defesa do meio ambiente ao combate à fome no mundo, cobrou a responsabilidade dos países ricos, ofereceu a Amazônia brasileira para sediar uma futura COP, além de não poupar críticas ao governo Bolsonaro. 

Segundo a revista “Time”, a vitória eleitoral de Lula foi “a melhor notícia que a luta climática global recebeu em muito tempo”, refletindo tanto o clima que o cercou no Egito, como a falta de outras “boas notícias” vindas da COP 27.


Egito, uma ditadura militar sediando a COP

País de 95 milhões de habitantes no norte da África é uma ditadura violenta. Abaixo artigo de Samir Hassan, publicado no jornal francês “Informations Ouvrières” nº 731.

“A prisão, a menos de uma semana do início da COP 27 no Egito, de um arquiteto e ativista ecologista indiano de renome, Ajit Rajagolpal, que iniciava uma marcha pacífica de oito dias do Cairo a Sharm-el-Sheik para sensibilizar a população sobre a crise climática, ilustra a repressão contínua que existe no país desde o golpe de Estado que levou o marechal Sissi ao poder há nove anos.

Há mais de 60 mil presos políticos, dentre eles militantes dos direitos humanos e do meio ambiente, nas cadeias egípcias, sob falsas acusações e inclusive torturas. É com esse cenário de fundo que os líderes mundiais discursam, fechando os olhos aos crimes do regime militar, olhando para outro lado. 

Regime militar recebe bilhões dos EUA

O regime militar recebe uma ajuda dos EUA de 1,3 bilhões de dólares anuais desde que assinou os acordos de paz com Israel em 1979. Ajuda que, em 2021, sofreu a retenção de 130 milhões, em função da questão dos presos políticos, mas em janeiro de 2022 foi restaurada por Biden, que em sua campanha eleitoral tinha dito ‘não mais cheque em branco para o ditador favorito de Trump’. 

Em meados de outubro, diante de chamados para manifestações populares em 11 de novembro contra a inflação, Sissi mandou prender centenas de pessoas no Cairo, Alexandria, Suez e outras cidades.  

O FMI anunciou em 27 de outubro uma ajuda de 3 bilhões ao Egito, exigindo em contrapartida a desvalorização da libra, moeda local, em 15% e sua flutuação no mercado de câmbio, o que provocou uma alta brutal nos preços, sobretudo nos bens de primeira necessidade. 

Com a guerra na Ucrânia mais de 22 bilhões de dólares fugiram do Egito. Resultado, no início de outubro 800 mil toneladas de trigo, cerca da metade que o Egito importa cada mês, estavam bloqueadas nos portos do país por falta de pagamento aos fornecedores. Os preços do pão e massas explodem, com moinhos parados em 80% e demissões de pessoal. 

Ocorre o mesmo com outros importados, como medicamentos. É a miséria colocada diante de milhões de egípcios, um terço dos quais já vivendo abaixo do nível de pobreza.”

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