Há mais de um ano, as greves e mobilizações se multiplicam na Tunísia.
A deterioração das condições de vida, o congelamento dos salários, a alta vertiginosa dos preços e a corrupção escancarada tornaram inevitável uma explosão social.
Em 25 de julho, manifestações eclodiram em todo o país, tendo como alvo principal o partido islâmico Ennahdha (Renascença) e pedindo a dissolução do parlamento servil ao capital financeiro, cuja eleição, em outubro de 2019, foi boicotada por quase 60% dos eleitores.
Na mesma noite, o presidente da República, Kaïs Saïed, destituiu o Primeiro-Ministro Hichem Mechichi, suspendeu por trinta dias as atividades do Parlamento e tomou as rédeas do Ministério Público.
Para adotar tais medidas ele recorreu ao artigo 80 da Constituição que as autoriza em caso de perigo grave que ameace a soberania do país.
Defesa da soberania
No dia seguinte, 26 de julho, Saïed demitiu o ministro da Defesa e a porta-voz do governo que acumulava os cargos de ministra da Justiça e da Administração.
Espera-se que, agora, seja investigado o assassinato dos dirigentes políticos Chokri Belaïd e Mohamed Brahmi, ocorrido em 2013, por denunciarem o recrutamento de milhares de jovens para o grupo terrorista Estado Islâmico na Síria.
O presidente do Parlamento e do partido islâmico Ennahdha, Rached Ghannouchi, foi proibido de sair do país e denunciou “uma operação inconstitucional”.
A União Geral dos Trabalhadores da Tunísia (UGTT) considerou que as decisões do presidente estão “em conformidade com a Constituição”, apelando à continuação do processo democrático.
As grandes potências europeias e os EUA, além da Turquia, pedem o “retorno à ordem constitucional o mais rápido possível”.
Tanto nas manifestações de rua quanto nos congressos da UGTT, o povo tunisiano expressou firmemente seu apego à defesa de sua soberania.
Os problemas profundamente enraizados do desemprego e da degradação da infraestrutura pública, que deflagraram o levante de 2011, nunca foram resolvidos. Dez anos depois, as mesmas causas provocam os mesmos efeitos.
A continuação do processo da revolução de 2011
A revolução que estourou em janeiro de 2011 derrubou o ditador, general Ben Ali, que havia reinado supremo durante vinte e três anos, apoiado pelas grandes potências.
Comitês revolucionários foram constituídos em todo o país. Uma manifestação de mais de quinhentos mil cidadãos diante do parlamento arrancou o chamado à eleição de uma Assembleia Constituinte e Soberana.
Rapidamente, o aparelho da contrarrevolução começa a agir. Em vez da proposta de Constituinte dos Comitês Revolucionários, portadores da vontade das massas populares e de suas reivindicações, a União Europeia e os EUA sustentaram o processo manipulado da Alta Instância para a Proteção da Revolução, em nome de uma “transição democrática”.
E por não ser a Assembleia Constituinte e Soberana reivindicada pelo povo, ela foi boicotada por cerca de 50% do eleitorado e 37% dos que votaram, o fizeram por listas que não estiveram representadas nessa assembleia.
As reivindicações colocadas pela revolução continuam: o desemprego aumenta cada vez mais, do mesmo modo que a degradação da educação e da saúde públicas… E o terrorismo se tornou uma ameaça permanente que arrisca mergulhar o país numa guerra civil.
Correspondente