A repulsa legítima ao discurso de extrema-direita de Jair Bolsonaro e seus seguidores, leva muita gente a dizer que estamos diante da ameaça do fascismo.
É preciso saber identificar o inimigo para ser eficaz no combate a ele. Há uma mania em setores da esquerda de tratar todos os inimigos da classe trabalhadora e dos oprimidos como “fascistas”, como se fosse um insulto dirigido a eles. Assim, Aécio, Temer, ACM Neto, Caiado, todos já foram ou seriam “fascistas” que “não passarão”.
O que tem origem, mesmo que não se tenha consciência, na posição da socialdemocracia e do stalinismo que não combateram o fascismo e o nazismo quando eles surgiram na Europa. “Socialistas” achavam que era um partido de direita com o qual se podia conviver no parlamento, e o stalinismo minimizou o nazismo, transformando a socialdemocracia (que passou a chamar de “social-fascista”) em “inimigo principal”. Quando veio o desastre, com as organizações dos trabalhadores destruídas e com elas a democracia, aí os partidos stalinistas, sem a menor autocrítica, viraram campeões de “frentes antifascistas”, escondendo-se atrás de qualquer democrata burguês!
O marxista que melhor identificou o nazi-fascismo, León Trotsky, propondo a frente única para barrá-lo, viu no fenômeno, desde o seu início, um movimento de massas, enquadrado por um partido disciplinado e com uma ideologia totalitária, voltado à destruição das organizações dos trabalhadores e financiado pelas grandes empresas, numa situação em que o funcionamento normal da democracia burguesa era incapaz de conter a instabilidade política provocada pela luta de classes (ver abaixo).
Bolsonaro é o fascismo?
O “bolsonarismo” é um ajuntamento de viúvas da ditadura militar com ramificações nas Forças Armadas (do candidato a vice, a generais “futuros ministros”), com chefes de Igrejas evangélicas, deputados das bancadas ruralista e da bala, abrigados numa legenda de aluguel que é o PSL (até pouco Bolsonaro era PSC), que canaliza um amplo sentimento “contra o sistema político corrupto” existente na classe média arruinada e em setores populares, iludindo-os com um discurso moralista e de ódio, fazendo do “antipetismo” o seu cavalo de batalha, no que foi ajudado pela grande mídia, pelo PSDB, MDB e outros políticos da burguesia.
Não se trata de diminuir o perigo que representa Bolsonaro, muito pelo contrário. É claro que há slogans, atitudes e ações criminosas de cunho fascista no “bolsonarismo”, mas ele é sobretudo a manipulação, através de meios modernos nas redes sociais importados da campanha de Trump nos EUA, que faz pessoas “normais” acreditarem que um deputado que há quase 30 anos é parte do sistema político apodrecido que deu o golpe de 2016 (que inclui o Judiciário), que votou a favor de todas as medidas de ataque aos direitos e à soberania nacional do governo Temer, seja um candidato “anti-sistema”.
Não se trata de uma discussão acadêmica sobre o fascismo. É uma questão concreta: tratar todos os eleitores de Bolsonaro como “fascistas”, ao contrário de desmascarar esse farsante, só vai coesioná-los ao redor do ex-capitão. Na prática, ainda que de boa fé, é o que acaba se passando com movimentos como “mulheres contra o fascismo” ou “frente antifascista”.
O PCdoB e o PSOL, agitam também o “antifascismo”. A UNE, por exemplo, propõe “frentes antifascistas” nas Universidades. Setores do PSOL convocam “plenárias antifascistas”, buscando prolongar o “#elenão” que escondeu o voto 13 e deu munição para “mulheres com Bolsonaro”, “ele sim” etc.
Outro campeão do “#elenão” foi o PSTU, que agora chama o voto 13, mas nega “apoio político aos candidatos” e “alerta” que Haddad vai atacar os trabalhadores e seus direitos, ajudando a lançar confusão entre os trabalhadores!
É hora de falar claro para as amplas massas: para barrar o retrocesso e os ataques aos direitos e à democracia que Bolsonaro representa, só há uma via: em 28 de outubro, o voto é 13 em Haddad. Mais adiante, somente uma Constituinte soberana eleita pelo povo poderá enterrar o “sistema podre”, expresso na composição do próximo Congresso nacional, e abrir a via para a satisfação dos interesses populares!
Julio Turra
TROTSKY E O FASCISMO
O revolucionário russo Leon Trotsky analisou o fenômeno do fascismo, desde suas origens na Itália nos anos 20 a seu ápice na Alemanha dos anos 30 do século XX, para caracterizá-lo:
“O fascismo baseia seu programa na dissolução das organizações operárias, na destruição das reformas sociais e no aniquilamento completo dos direitos democráticos, com o objetivo de impedir o renascimento da luta de classes do proletariado. O Estado Fascista legaliza oficialmente a degradação dos trabalhadores e a pauperização das classes médias em nome da salvação da ‘nação’ e da ‘raça’, nomes presunçosos sob os quais se oculta o capitalismo em decadência”. (1939 – “O Marxismo e nossa época’).
A base de massa dos partidos fascistas é a pequena burguesia arruinada pelo próprio capital, mas que diante da política passiva das direções reformistas das grandes organizações operárias, se transforma em instrumento de ataque a essas organizações a serviço do grande capital, atraindo até mesmo setores operários desmoralizados, além do lumpesinato, para suas fileiras, explicou Trotsky.
Bolsonaro ao bater continência à bandeira dos EUA, impensável para o nacionalismo xenófobo de Hitler ou Mussolini, traduz os limites do “fascismo” nos países dominados, como o Brasil: um arremedo a serviço do imperialismo dominante. O Partido Social Liberal (PSL) no qual Bolsonaro abrigou-se, está longe de ser um partido fascista que enquadra massas, ainda que existam grupelhos fascistóides (MBL e outros) ao seu redor. Mas hoje o que temos que enfrentar e derrotar é uma operação de extrema direita, autoritária e que prepara o retorno aos piores tempos da ditadura, chamando as coisas pelo seu nome.
UM EXEMPLO DE ARMADILHA “ANTIFASCISTA”
Em 9 de outubro, a direção do Andes-SN – que ganhou apertado a eleição do sindicato nacional dos docentes universitários diante da oposição Renova Andes – convocou reunião dos setores estaduais e federais para discutir o 2º turno.
Docentes ligados ao Renova apresentaram uma proposta de resolução defendendo o voto em Haddad e Manuela em defesa da democracia e dos direitos, contra o retrocesso representado por Bolsonaro.
A direção do Andes, apresentou outra resolução, partindo da afirmação que “o cenário que se desenha em nenhuma possibilidade será interessante para a classe trabalhadora”, que não tomava posição sobre o voto no 2º turno e concluía propondo “frentes antifascistas” nas universidades! Resolução adotada por 14 votos contra 10 obtidos pela que propunha o voto 13!