Resgatar o vermelho da bandeira na luta contra a opressão da mulher!
O 8 de março de 2016, no Brasil, ocorre em uma situação na qual as mulheres, em particular das classes trabalhadoras, estão ameaçadas de gerar fetos com microcefalia. Dadas as suas condições materiais, elas são mais sujeitas ao zika vírus, um possível responsável por essa anomalia.
Num país ainda coberto pelo manto obscurantista que impede o direito democrático à opção ao aborto, o governo, através de seu ministro da Saúde, Marcelo Castro (PMDB), se nega a legalizar o aborto em comprovada situação de microcefalia, uma questão elementar de saúde. Um fato que expressa o quão atrasado é o Brasil em relação aos direitos das mulheres. No caso do aborto, um direito elementar é negado com as bençãos do Papa Francisco que, em sua última incursão pela América Latina (Cuba e México), manifestou-se contrário ao aborto de fetos com microcefalia, argumentando: “é matar uma pessoa para salvar outra, no melhor dos casos, ou para deixá-la bem. É um mal em si mesmo”.
Em relação aos direitos, como mulheres trabalhadoras, o atraso não é menor. Se alarde o fato de que a mulher participa mais do mercado de trabalho, é verdade. Mas participam em condição inferior, recebendo cerca de 70% do salário em mesma função exercida por um homem. E as mães trabalhadoras, que dependem do serviço público para deixarem os filhos e poderem trabalhar, amargam em todo país a carência de creches, situação que se agrava com a política do ajuste fiscal praticada pelo governo da presidente Dilma.
Na situação em que o ataque aos direitos democráticos e trabalhistas é a consequência da política de guerra do imperialismo, buscando safar-se da crise em que jogou o planeta, a discussão da luta contra a opressão da mulher ganha toda sua dimensão.
É preciso resgatar essa luta como uma luta do conjunto da classe trabalhadora – mulheres e homens – por sua emancipação. Em outras palavras, para pôr fim ao sistema baseado na propriedade privada dos grandes meios de produção que empurra a humanidade para a barbárie.
Esse resgate torna-se mais necessário quando, em uma situação já muito difícil para os oprimidos, a política do imperialismo visa destruir e desnaturar, as organizações construídas pela classe trabalhadora que vertebram a luta das amplas massas.
A concepção feminista que propaga ser a questão de gênero: homem x mulher, e não a questão de classe, a causa da opressão da mulher – de onde deriva, por exemplo, a política de cotas e de “empoderamento” das mulheres – divide e enfraquece a luta das trabalhadoras, ao lado de sua classe e de suas organizações.
do vermelho ao lilás
O lilás, a cor adotada pelas feministas, passou a predominar depois que a ONU em 1975 reconheceu a data de 8 de março como dia internacional da mulher. Em relação a ONU, que em sua Assembleia Geral em 2010 criou a “ONU Mulheres, a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres”, não é necessário discorrer sobre seu compromisso com o sistema capitalista e sua cínica preocupação com a opressão da mulher. Basta lembrar suas tropas de ocupação no Haiti, onde os soldados violam mulheres e crianças.
O vermelho das militantes socialistas no início do século 20 representava a luta contra a opressão das mulheres no mesmo processo de luta pela revolução. A adoção do lilás expressa uma ruptura com a tradição do movimento e das organizações da classe operária pela revolução socialista que integrou a luta contra a opressão da mulher como uma tarefa de toda a classe, homens e mulheres.
na luta pelo socialismo
Em 1925, em “Das memórias sobre Lenin”, Clara Zetkin relata o que ele lhe dissera em uma discussão:
“Nenhuma organização especial para as mulheres. Uma mulher comunista é membro do Partido tanto como um homem comunista. Não deve existir quanto a isso nenhuma imposição especial. Todavia, não devemos esquecer que o Partido deve possuir pessoas, grupos de trabalho, comissões, comitês, escritórios ou o que mais for preciso, com a tarefa específica de despertar as massas feminina (…) Necessitamos de organismos apropriados para realizar o trabalho entre as mulheres. Isso não é feminismo: é o caminho prático, revolucionário. ”
Dois anos depois da Revolução Russa de 1917, falando sobre os avanços do governo soviético em relação aos direitos das mulheres, Lenin escreve: “A posição da mulher põe particularmente em evidência a diferença entre a democracia burguesa e a socialista e dá uma resposta particularmente clara ao problema que antes levantamos. Em nenhuma república burguesa (isto é, onde existe a propriedade privada da terra, das fábricas, das minas, das ações, etc.) mesmo na mais democrática, em nenhum lugar do mundo, mesmo no país mais avançado, a mulher goza de plena igualdade de direitos. E isso apesar de haver decorrido 130 anos desde a grande revolução francesa democrático-burguesa. ”
Da plena igualdade de direitos no socialismo, ou o direito ao aborto, a políticas públicas e igualdade salarial no capitalismo, a luta contra a opressão da mulher é uma luta da classe explorada contra a classe exploradora, não de um gênero contra o outro. Sua bandeira é vermelha e não lilás.
Misa Boito
São Paulo, Brasil, 1917: greve geral
Em julho de 1917, com a decisão de parar a produção, as operárias de duas fábricas têxteis do Cotonifício Rodolfo Crespi deram início a uma greve que rapidamente se estendeu para outras categorias da cidade e depois pelo país. Apesar de fortemente reprimida pela Força Pública, a greve geral foi mantida por 36 dias. Entre as conquistas das reivindicações inscritas na plataforma da greve estavam a abolição do trabalho noturno das mulheres e também a proibição da exploração, nas fábricas, oficinas, etc, do trabalho de menores de 14 anos. Na foto, passeata durante a Greve Geral de 1917 onde a grande maioria é de mulheres.
Petrogrado, Rússia, 1917: “O dia das operárias”
O dia internacional de luta das mulheres trabalhadoras foi uma decisão das delegadas dos partidos socialistas, entre elas, Clara Zetkin, Rosa Luxemburgo e Alexandra Kollontai, na 2ª Conferência de Mulheres Socialistas, realizada na Dinamarca, em 1910. Na Rússia czarista, houve uma primeira atividade em 3 de março de 1913. No ano seguinte, 1914, as organizadoras foram presas e não houve atividade.
Em 1917, as mulheres socialistas organizaram o Dia da Mulher em 23 de fevereiro (calendário russo, que no calendário ocidental correspondia a 8 de março). Nesse mesmo dia, explodia uma greve das trabalhadoras em tecelagem de Petrogrado. A manifestação do Dia da Mulher desencadeou o processo revolucionário que em outubro levaria à tomada do poder. “O dia das operárias, 8 de março, foi uma data memorável na história. Nesse dia as mulheres russas levantaram a tocha da revolução”, escreveu Alexandra Kollontai.
Artigos originalmente publicados na edição nº 781 do jornal O Trabalho de 3 de março de 2016.