Dois anos de guerra na Ucrânia

Barbárie em solo europeu

Em 24 de fevereiro de 2024, a guerra na Ucrânia completou dois anos. Suplantada em terror e crueldade pelo genocídio televisado na Faixa de Gaza, a data passou quase despercebida do grande público. O cenário terrível é uma mostra eloquente do que o sistema capitalista, em sua atual crise, reserva à humanidade: horror e barbárie sem precedentes.

O imperialismo norte-americano tem protagonismo nas duas situações: na guerra da Ucrânia, atiça a Otan (aliança militar sob sua liderança) a continuar dando armas ao regime ucraniano de extrema-direita de Volodymyr Zelensky; na Palestina, sendo o principal suporte do Estado de Israel em sua escalada de extermínio contra o povo palestino. Nos dois casos, a indústria armamentista dos Estados Unidos (EUA) lucra como nunca: em 2023, a economia de armamentos bateu seu recorde de faturamento desde o fim da 2ª Guerra Mundial, em 1945.

A guerra ao orçamento social
O ataque criminoso decidido há dois anos pelo presidente russo, Vladimir Putin, abriu um conflito sangrento que já custou a vida de centenas de milhares de jovens russos e ucranianos nas frentes de batalha, além da população civil atingida pelos bombardeios. Ninguém é inocente neste conflito: os governos dos países europeus, juntos com a Otan, sustentam a retórica belicista, turbinam a indústria de armas e utilizam a guerra como pretexto sob medida para impor nos orçamentos os cortes sociais que defendem há anos.

Nas últimas semanas, com o governo dos EUA concentrado no apoio ao regime sionista, recaiu sobre a União Europeia a responsabilidade principal de ajudar o regime de Zelensky. Declarações e medida práticas demonstram isso. 

A presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen, chamou todos os 27 países da União Europeia (UE) a se armarem para fazer frente à Rússia: segundo ela, os russos estão se preparando para invadir outros países europeus. Registre-se que, salvo Irlanda e Portugal, todos os demais países da UE já aumentaram seus gastos militares, às custas dos gastos sociais. Para ela, é insuficiente, mesmo que o prosseguimento dessa política de guerra esteja levando a indústria e a agricultura europeias para uma catástrofe.

Risco à humanidade
O presidente da França, Emmanuel Macron, anunciou em 16 de fevereiro mais 3 bilhões de euros (cerca de 16 bilhões de reais) em ajuda militar para a Ucrânia, e citou a possibilidade de enviar tropas. Caso isso se concretizasse, seria uma escalada sem precedentes. Até o momento, o conflito só envolve diretamente os vizinhos Rússia e Ucrânia. Se tropas francesas, por hipótese, entrassem no conflito, isso traria junto os 32 países da Otan – quase todos os estados europeus, mais EUA, Canadá e Turquia. Um salto na direção de um conflito internacional de proporções devastadoras.

A União Europeia reforça essa via ao votar um plano de ajuda para a Ucrânia no montante de 50 bilhões de euros (mais de 270 bilhões de reais) ao longo dos próximos cinco anos. Na verdade, mantém o regime ucraniano em combate, apesar de estar consciente de que não tem condições de vencer a guerra. A ideia é manter uma pressão brutal para justificar os planos de austeridade que a Comissão Europeia considera inevitáveis. A quatro meses das eleições europeias, querem colocar a ameaça de guerra e a necessidade de rearmamento dos países no centro da campanha.

Putin respondeu, no nível do discurso, às ameaças de envolvimento direto da Otan na guerra, ameaçando usar armas nucleares. É preciso lembrar que poucos países controlam arsenais nucleares – sendo os maiores os dos EUA, Rússia, China, França e Reino Unido –, e que a capacidade de explosão do conjunto dos arsenais permite destruir a civilização, senão a vida no planeta Terra. Os senhores da guerra representam uma ameaça real a toda a humanidade!

Regimes semelhantes
Ao longo destes dois anos, os governos dos EUA e dos países europeus tentaram apresentar o regime de Zelensky como democrático, em contraposição ao autoritarismo russo. Uma posição que não para em pé. É mais do que sabido que, durante anos, o governo de Kiev travou uma guerra contra a minoria de língua russa no Donbass (região do leste da Ucrânia). E Zelensky, em particular, foi eleito com a (falsa) promessa de que abriria negociações com as regiões autônomas do leste.

Saltam aos olhos as semelhanças entre Ucrânia e Rússia: ambos são regimes oligárquicos nascidos da pilhagem da propriedade pública existente na União Soviética. No caso de Zelensky, os oligarcas atuam como agentes diretos das multinacionais e do imperialismo dos EUA.

A corrupção na Ucrânia chega ao ponto de a guarda de fronteira assistir impassível a ação de criminosos que cobram até 8.000 euros (cerca de R$ 40 mil) para ajudar jovens a fugir de seu país e do alistamento (o salário mínimo local não passa de R$ 422 mensais). Na Rússia, por outro lado, centenas de milhares de jovens fazem o mesmo movimento, recusando-se ao serviço militar, pois não enxergam a guerra como patriótica, mas sim para defender os privilégios dos oligarcas.

Resistência dos povos
Uma das marcas do cenário mundial da atualidade é a da resistência dos trabalhadores. Crescem as manifestações pelo mundo, tanto em apoio aos palestinos, como em boicote aos embarques de armamentos e material de guerra. Na Europa, eleva-se uma onda de protestos, em vários países, contra a escalada dos gastos militares ligados à guerra na Ucrânia e suas terríveis consequências em áreas como saúde pública, educação e Previdência.

Desde 24 de fevereiro de 2022, vozes pela independência de classe expressaram uma posição de combate: “Não à Otan! Nem Zelensky, nem Putin! Esta guerra é contra o povo!” É uma posição que reforça manifestações populares, e se expressa em petições aos governos e parlamentos, em conferências sindicais e políticas. Neste movimento, formou-se um Comitê Europeu Contra a Guerra e Contra a Guerra Social. Na prática, retoma-se a posição internacionalista contra a guerra imperialista que separou as águas, em 1914, entre os agentes operários do capital (que apoiavam cada qual a sua burguesia na guerra) e os revolucionários, que combatiam a guerra e abriram o caminho à revolução proletária.

Paulo Zocchi

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