A julgar pelas fotos, o encontro de Lula com o presidente da França, Emmanuel Macron, em 26 de abril, em Belém (PA), estava sendo ótimo para os dois, que passeavam de mãos dadas, rindo e conversando. O visitante tinha seus motivos: acossado em seu país pelo movimento de massas devido à sua política pelo bem do grande capital e contra a classe operária e os camponeses, o presidente de direita resolveu dar uma escapada de três dias ao Brasil, para consolidar pautas de maior interesse para o imperialismo francês.
Mas, e quanto a Lula?
Em seu primeiro dia em território brasileiro, Macron pôde formalizar com Lula um programa de investimentos de 1 bilhão de euros (R$ 5,7 bilhões) em quatro anos em bioeconomia (amazônica) e preservação das florestas. Tudo é apresentado como uma agenda de convergência entre os países, que compartilham o compromisso de combate às “mudanças climáticas”. Só que… a tal parceria visa, segundo a imprensa francesa, “construir uma nova estratégia transfronteiriça,” porque tal programa visa a Amazônia “brasileira e guianesa”. Opa, não está se falando de outro país, mas da Guiana Francesa, território colonial da França e vizinho ao Brasil.
Vamos recordar que, no ano passado, para espanto geral, a França pediu para integrar a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, que reúne os países da região. Isso não andou. Agora, por meio desses movimentos, busca legitimar sua dominação colonial sobre um território amazônico, contando com a chancela do Brasil e do governo Lula.
No dia seguinte, Macron e Lula lançaram ao mar, no Rio, um novo submarino construído por um programa comum entre Brasil e França. Era o momento para tratar de acordos militares entre os dois países, nos quais nosso país entra com o dinheiro, e os franceses, com a venda de produtos e serviços (e com bastante “cuidado” para não transferir tecnologia!).
Em seu discurso, Macron saudou a “parceria naval”, que incluiu a produção de quatro submarinos (o último vai ao mar no ano que vem), e já prepara o projeto do submarino nuclear. Envolveu também a compra de 50 helicópteros pelo Brasil. Aproveitando o embalo, Macron também sugeriu que o Brasil renovasse a compra de tanques, e, quem sabe, de aviões de combate franceses. A Agência France Presse explicou: “Os dois mandatários sublinharam a importância dessa parceria estratégica num mundo posto à prova por guerras e crises”. Está aí a senha: as guerras em curso dão a base para um aumento sem precedentes dos gastos militares no mundo, em proveito das grandes potências, como a França.
No último dia, reservado às questões de parceria geopolítica, houve certa dissonância de discursos. Macron cerra fileiras, junto aos Estados Unidos e à União Europeia, no apoio à Ucrânia em guerra, chegando a falar recentemente em enviar tropas; Lula aponta responsabilidades dos dois lados em confronto e não concorda com as sanções à Rússia. Macron apoia o Estado de Israel em sua agressão à Faixa de Gaza; Lula classifica a ação como genocídio e a comparou ao assassinato de judeus por Hitler. O objetivo do encontro, porém, foi o de proclamar objetivos comuns, evocando uma “nova página” nas relações bilaterais, uma “parceria estratégica” no período em que o Brasil vai sediar a reunião do G20 (novembro, no Rio) e a COP 30 (novembro de 2025, em Belém). A França quer ter voz ativa nos rumos desses encontros.
Questão indígena
A nota combativa dessa extensa agenda foi dada por Raoni Metuktire, chefe indígena dos Caiapós. Uma semana depois de povos indígenas terem feito um ato em frente ao STF contra o Marco Temporal, coube a Raoni, em discurso frente aos dois chefes de Estado, lembrar da subida da rampa com Lula e cobrar firmemente do presidente brasileiro que barre a ferrovia Ferrogrão, prevista para atravessar a floresta e áreas protegidas, e sobretudo que demarque as terras dos indígenas que ainda esperam – o que exige, claro, enfrentar o centrão e o agronegócio, que querem dar as cartas em Brasília. Pela boca do chefe indígena de 92 anos, o povo brasileiro resiste e luta!
Paulo Zocchi