Publicado no jornal francês Informations Ouvrières
Este fim de semana foi o ponto culminante da intensa campanha de comunicação do governo sobre a vacinação. Ele anuncia que dezenas de milhares de pessoas teriam recebido uma dose nos “vacinódromos” montados no fim de semana, enquanto dezenas de milhares ainda não conseguiram se inscrever nas listas. Nesta situação, o que pensar do manifesto internacional intitulado “Suspendam as patentes das vacinas contra a Covid”, dirigido à OMS e assinado por políticos, ministros, ex-ministros, ex-presidentes de vários continentes, que propõe: “Hoje, são algumas multinacionais da Big Pharma que estão enchendo os cofres (…). Propomos a suspensão das patentes de vacinas e de futuros tratamentos contra a Covid. O dinheiro não deve ser um entrave à saúde mundial”.
Uma reorganização do capitalismo
Trata-se de pedir aos atuais governos (Macron, portanto) o favor de retirar das multinacionais uma de suas galinhas dos ovos de ouro? Sem dúvida, Macron vai se apressar. E o capitalismo ficaria “um pouco menos pior” …
Outra iniciativa foi tomada na Europa: uma petição dirigida à União Europeia, para que decrete que as vacinas são bens comuns. Nesta petição, afirma-se: “A saúde não é uma mercadoria”. Na França, várias organizações de “esquerda”, ou de “esquerda da esquerda”, como são chamadas agora, estão divulgando essas iniciativas exigindo que o governo Macron declare as patentes como bem comum.
Por trás da linguagem radical contra a Big Pharma, no entanto, há uma realidade inescapável: no sistema capitalista tudo é uma mercadoria, inclusive a saúde. Em “Informations Ouvrières” abordamos várias vezes os monopólios farmacêuticos e seus altíssimos lucros.
O fórum internacional de personalidades propõe, portanto, com esta campanha sobre patentes em relação com os problemas ambientais, estabelecer uma nova “sociedade de ajuda mútua”.
“A Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos previu que poderíamos entrar em uma ‘era de pandemias’ devido aos danos ecológicos. Não vamos enfrentar isso priorizando os interesses privados e as fortunas da Big Pharma. Ao contrário, devemos construir uma sociedade de ajuda mútua em escala mundial. Podemos começar agora dizendo que as vacinas e os tratamentos anti-Covid são bens comuns”.
Ainda durante o primeiro confinamento, houve um apelo de personalidades, intitulado “O dia seguinte” para fazer os dias atuais desaparecerem. Agora, quando o tempo urge, está sendo oferecida, de fato, uma reestruturação do sistema capitalista por um longo período.
É, de certa forma, o equivalente à chamada “transição ecológica” tão enfatizada no plano econômico, quando o capital está usando a pandemia e o argumento ecológico para implementar todos os planos de reestruturação e de dispensas que ele tinha em suas gavetas. É em nome da luta pelo meio ambiente e da redução “necessária” do transporte aéreo que 30 mil empregos estão ameaçados nos aeroportos de Paris.
Quem pode acreditar que esses monopólios, que lucram bilhões de dólares, concordarão em colocar a patente das vacinas no domínio público? Quem pode acreditar que a OMS, a União Europeia, Macron queiram e possam dobrar esses monopólios? Quem pode acreditar que Biden, que está lançando um “pacote de estímulo” de 2 trilhões de dólares para financiar a indústria, vai pedir às grandes multinacionais farmacêuticas – em sua maioria estadunidenses – que renunciem a seus lucros? É o mesmo que acreditar que uma ovelha possa comer um lobo.
A luta concreta contra o capital é a luta contra os governos que impõem as exigências do capital.
Desviando as atenções da responsabilidade do governo Macron
Será preciso, pois, esperar por esta “reforma” do capitalismo – ou mesmo, para os mais radicais, a expropriação do capital – para que os que desejam possam ser vacinados? No exato momento em que a União Europeia e o governo Macron denunciam o número insuficiente de vacinas entregues pelos laboratórios, essas campanhas sobre a patente como bem comum contra as Big Pharma não ajudam a comunicação do governo e da União Europeia?
De fato, ao concentrar tudo na Big Pharma, desvia-se a atenção da responsabilidade do governo Macron. Este último, depois de mentir sobre os testes e as máscaras, lançou uma nova campanha indicando a população como responsável pelos atrasos na vacinação. Mas os fatos são teimosos. Segundo dados oficiais, mais de 60% das vacinas entregues pelos laboratórios ainda estão nas geladeiras e não foram distribuídas. Todos os dias ouvimos os responsáveis de vacinação, eleitos, protestando contra o fato de estarem recebendo doses mínimas, sendo forçados a cancelar os agendamentos. Portanto, a responsabilidade é do governo.
O governo nos impôs o confinamento como a única solução. Informations Ouvrières denunciou incansavelmente um confinamento medieval, que não serve para nada. Ora, em 3 de março, Le Canard Enchaîné cita as observações do primeiro-ministro Castex ao sair de um Conselho de Defesa: “Não devemos deixar os franceses acreditarem que o confinamento é a solução de uma vez por todas. Fizemos isso em março passado e não terminou com a pandemia. Na verdade, a Alemanha está saindo de 8 semanas de confinamento rígido e isso não parou o vírus!”
Em plena pandemia, governo continua fechando leitos
E agora nos apresenta a vacinação como única e exclusiva solução… por quê, a propósito? E os tratamentos? Existe uma vacina contra a gripe, mas nós também tratamos a gripe. Na realidade, esta intensa campanha visa esconder a responsabilidade do governo na destruição de hospitais. Só em 2018-2019, ele fechou 7.500 leitos e, em meio à pandemia, continua fechando leitos e quer fechar até os hospitais Beaujon e Bichat, em Paris.
É essa realidade que explica o assédio do governo, lançando à ira popular os trabalhadores de saúde que não se vacinem, e até mesmo ameaçando tornar a vacinação obrigatória para os enfermeiros e médicos, escondendo cuidadosamente o fato de que os dias de carência foram restabelecidos para o pessoal em caso de licença médica (que a vacina muitas vezes torna necessária). Assim, quer empurrar os profissionais de saúde já cansados, exaustos, sobrecarregados pelas condições de trabalho, a abandonarem o hospital. O governo poderia, assim, continuar sua ofensiva e cortar ainda mais postos e leitos para sua política de rentabilidade. É por isso que está atacando os trabalhadores da saúde, procurando colocar a população contra eles.
Mas, por trás dos discursos está a realidade: para quem quer se vacinar, é a maior dificuldade para conseguir um agendamento. É a anarquia capitalista, é responsabilidade do governo Macron.
Àqueles que dizem que todos têm o mesmo inimigo, o vírus, e que, portanto, devemos nos unir na luta contra ele, respondemos: nenhuma união nacional, nenhum apoio, nenhuma confiança neste governo que não protege a população, mas o capital. Eles são diretamente responsáveis por esta situação. Fim dos fechamentos de leitos, reabertura de leitos fechados, criação de postos de trabalho, cessação do confinamento, fim dos toques de recolher, fim do estado de emergência, reabertura de faculdades, vacinação imediata para todos os que o desejarem.
Esta é a linha do combate contra o governo Macron. Neste jornal, somos maiores e vacinados contra Macron e seu governo.
Lucien Gauthier
Publicado no jornal francês Informations Ouvrières
Tradução Adaias Muniz