Entrevista publicada originalmente no Jornal Diário da Manhã de Goias de 27 de maio de 2017.
“O principal erro político foi, chegando ao governo, ( o PT) ter se adaptado às instituições herdadas … o invés de se jogar na convocação de uma Constituinte para transformá-las, da reforma política à regulação da mídia, passando pela estrutura agrária, o judiciário, a dívida, a militarização das polícias.”
Markus Sokol foi entrevistado por Renato Dias Da editoria de Política.
Diário da Manhã – Qual a saída para a crise política instalada, hoje, no Brasil?
Markus Sokol – Antecipação das eleições e candidatura de Lula a presidente da República, compromissada com uma Constituinte Soberana. Tanto para anular as medidas dos golpistas, como para abrir caminho para as reformas populares. É única saí- da para interromper o desastre em curso ao redor das contrarreformas da Previdência Social, com as terceirizações, e Trabalhista, que mergulharam o País em uma crise política imparável.
DM – Qual a sua análise dos áudios de Joesley Batista?
MS – É um retrato da nossa classe dominante ou, se preferirmos, uma radiografia do modo de funcionamento das instituições do Estado apodrecidas.
DM – É possível impedir a aprovação das reformas Trabalhista, Previdência Social, Tributária e Política como querem Michel Temer e seus aliados, como PSDB, DEM e PMDB?
MS– No dia de hoje, trabalhadores e setores populares estão dando seu recado em Brasília numa grande marcha: se o regime golpista, que já era ilegítimo e agora está completamente desmoralizado, insistir nesta via, vai se fazer uma greve geral ainda maior e parar o país.
“Desenlace de traição do PMDB era historicamente previsível”
DM – Há espaço e base legal para a aprovação da PEC das Diretas Já?
MS – Só não há espaço na sociedade, nem legitimidade no seio do povo, para uma eleição indireta num “colégio eleitoral” exclusivo de deputados e senadores. Falo sem medo de errar, ainda mais que à época do colégio eleitoral dos militares em 1984- 85! Afinal, hoje existe uma alternativa de governo, Lula, como mostram as pesquisas. De modo que o resto se resolve numa forma institucional, melhor que seja pelo voto da maioria dos senhores parlamentares, sem que os juízes atrapalhem, uma PEC e/ou uma interpretação do Código Eleitoral. Acrescento que quem, na oposição, se meter a negociar ao redor de eleições indiretas, com Rodrigo Maia ou outro, vai queimar os dedos.
DM – Com a antecipação das eleições gerais?
MS – Sim, o ideal é que sejam eleições para presidente e para um novo congresso, eleições gerais nesse sentido, como regras democráticas, no caso, para uma Constituinte , unicameral, proporcional, com voto em lista e financiamento público.
DM – Qual o desfecho provável da crise: renúncia de Michel Temer, cassação pelo TSE, impeachment ou queda pela mobilização das ruas?
MS – Em qualquer caso, será o produto da mobiliza- ção popular das ruas. Aliás, o processo só chegou neste ponto, devido à resistência às contrarreformas do tamanho da “maior greve geral da história” no último dia 28 de abril. Lembro que os ‘coxinhas’, por ora, desertaram das ruas, um sintoma. Isso dito, sobre o desfecho, a bolsa de apostas dos editorialistas e comentaristas da imprensa, no dia de hoje, aponta para a cassação do TSE dia 6. Veremos.
DM – Luiz Inácio Lula da Silva será condenado? Em 1ª e 2ª instâncias? O ex-operário corre o risco de ser preso?
MS – Há mais de dois anos está claro que é o objetivo maior da Lava-jato é esse, o risco existe. Mas o que significaria, agora, tirar de uma eleição presidencial o candidato favorito? É apostar num confronto maior, deslegitimar de vez as institui- ções do Estado, pois vai suscitar um movimento espontâneo de boicote das eleições, cujas taxas de participação já vem caindo ano a ano. Então, haverá enorme resistência a esse cenário, e não apensa entre petistas.
“Objetivo maior da Lava Jato é prender Lula. O risco existe”
DM – Quais pecados o PT cometeu e que deve expurgá-los?
MS – O principal erro político foi, chegando ao governo, ter se adaptado às instituições herdadas, ao invés de se jogar na convocação de uma Constituinte para transformá-las, da reforma política à regulação da mídia, passando pela estrutura agrária, o judiciário, a dívida, a militarização das polícias, etc. Pensou-se, talvez, poder avançar “por dentro” das instituições. Avançou, é verdade, mas pouco, travado pelas instituições, e parou na grande reforma que seria o Marco Regulatório do Pré-Sal. Ao fim, não mudou a enorme desigualdade social. Mas ao longo dos 13 anos foi reproduzindo o padrão de financiamento das coligações eleitorais para buscar uma sustentação em alianças sem porteira, até ficar refém delas, com tudo que isso significava, particularmente do “acordo nacional com o PMDB”, cujo desenlace de “traição” era historicamente previsível. E não faltaram advertências!
DM – É possível unidade entre PT, PC do B, PDT, PSOL, PCO, PCB, PCR e movimentos sociais urbanos e rurais?
MS – Num nível, é necessário fortalecer e ampliar as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, como frentes unitárias de mobilização na conjuntura. Noutro nível, o PT precisa terminar de revisar a política de alianças praticada, recuperando um sentido “antimperialista, antimonopolista e antilatifundiário”, como previam documentos do partido. Isto traz uma abertura suficiente, no plano da representação institucional, para uma aliança eleitoral com o PC do B, o PSOL e também setores do PDT e PSB, entre outros, que se identifiquem com a plataforma proposta. As centrais sindicais e os movimentos populares que também se identificarem, resguardando sua autonomia, terão todo seu lugar nessa luta, ainda mais como agentes conscientes da transformação social.
DM – O PT, fundado em 1980, no Colégio Sion, pode ser refundado, obter sucesso nas urnas e recuperar a imagem perante à opinião pública?
MS – Reconstruído, pode sim, sobre a base dos bons fundamentos que tem, não refundado sobre outras bases, como alguns defendem, não creio nem desejo. Agora, as pesquisas já mostram uma certa recuperação do partido. Mas nada está garantido; parte do futuro do PT se disputa, agora, no 6º Congresso do PT, que começa dia 1º de junho.