A entrevista concedida à “Folha de S. Paulo” (11/11) pelo comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, deixa clara, se alguma dúvida havia, a condição de Lula como preso político. E mais: é a confissão de que o Judiciário, protagonista do golpe desde 2016 (com o impeachment, a Lava Jato e as perseguições ao PT), tem a seu lado as Forças Armadas nessa ação. Em sua fala, o militar admite ter interferido para que o Supremo Tribunal Federal (STF) não ousasse conceder o habeas corpus preventivo. Lula foi preso três dias após esse julgamento.
Para impedir que Lula vencesse a eleição, o que poderia ter ocorrido até mesmo no primeiro turno, Sergio Moro (premiado com um ministério por Bolsonaro) condenou, sem provas, o ex-presidente. Com base nessa fraude, além das outras que se desenvolveram durante a própria campanha eleitoral, Bolsonaro se elegeu.
Villas Bôas admite que interveio, em abril, para que o STF não concedesse o habeas corpus a Lula. Naquela ocasião, ele divulgou uma mensagem pelo Twitter que ameaçava implicitamente alguma forma de retaliação militar caso Lula fosse mantido solto. Sua justificativa, dada na entrevista, é a de que “temos a preocupação com a estabilidade, porque o agravamento da situação depois cai no nosso colo”.
A visão é a de que as Forças Armadas são o poder invisível que está por cima dos poderes legalmente constituídos. Ele só pode se pronunciar dessa maneira porque os crimes da ditadura nunca foram punidos e o chamado “entulho autoritário” do regime, como a Lei de Anistia de 1979, se mantém em vigor.
O general fala sem preocupações, como se fosse normal um comandante militar ordenar qualquer coisa aos ministros do Supremo: “Eu reconheço que houve um episódio em que nós estivemos realmente no limite, que foi aquele tuíte da véspera da votação no Supremo da questão do Lula. Ali, nós conscientemente trabalhamos sabendo que estávamos no limite. Mas sentimos que a coisa poderia fugir ao nosso controle se eu não me expressasse. Porque outras pessoas, militares da reserva e civis identificados conosco, estavam se pronunciando de maneira mais enfática”.
É a confissão de um ataque à democracia. Como disse corretamente a presidente do PT, Gleisi Hoffmann: “A fala do general Villas Bôas evidencia a trama política contra Lula. Deixa claro que houve ingerência em decisão do STF”.
Intervenção no STF
Em artigo publicado nas redes sociais, o advogado Paulo Emendabili Souza Barros de Carvalhosa relata um episódio que parece fazer sentido, considerando-se a fala do comandante do Exército. De acordo com Carvalhosa, na noite em que houve a facada contra Bolsonaro, em setembro, reuniu-se emergencialmente o Alto Comando das Forças Armadas. Na reunião, alguns comandantes estariam dispostos a intervir, colocando tropas na rua.
Para não chegar a isso, a solução encontrada teria sido colocar um general da reserva no STF. Como se sabe, em seguida, o presidente da corte, Dias Toffoli, indicou o general Fernando Azevedo e Silva, mesmo sem qualificação jurídica, como seu assessor. Ele teria sido levado a Toffoli pelo próprio Villas Bôas, segundo “fontes civis e militares” que o advogado não nomeia.
Cláudio Soares