O balanço das eleições para o Parlamento Europeu, realizadas em maio, traz duas lições essenciais: a enorme abstenção e, ligado a ela, o colapso dos partidos que se sucedem no poder há décadas.
Houve uma grande campanha pelo comparecimento às urnas, que exagerava e dramatizava o risco de um aumento dos “populismos” na Europa. Durante meses, por exemplo, o presidente francês Emmanuel Macron afirmou que a extrema direita era uma ameaça. A “lepra nacionalista”, segundo suas palavras, iria conduzir a Europa ao caos. Um refrão repetido pelos meios de comunicação e mesmo por dirigentes políticos e sindicais, alguns dos quais chegaram a acusar os abstencionistas de serem o instrumento desse caos.
Apesar de tudo isso, a abstenção atingiu 50,95% em toda a Europa. É verdade que o comparecimento aumentou alguns pontos em comparação com as eleições anteriores, até mesmo por causa dessa campanha. Mas metade dos eleitores se recusou a ir às urnas.
A situação preocupa os representantes mais lúcidos do capital. O presidente da entidade patronal italiana Cofindustria, Vincenzo Boccia, declarou: “Eu gostaria de lembrar que 50% dos italianos não votaram, e isso não é um bom sinal. (…). Há um partido da abstenção, o que deve levar todos a refletirem”.
Os dois grupos majoritários no Parlamento Europeu – Partido Popular Europeu (PPE) e Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) – desabaram, tendo perdido respectivamente 38 e 36 assentos. O PPE passa a ter 179 eurodeputados e os social-democratas, 150.
Pela primeira vez na história do Parlamento Europeu, esses dois grupos perderam a maioria absoluta que detinham. Essa maioria e sua “grande coalizão” impulsionaram, de fato, nos países da Europa, a alternância entre a suposta “esquerda” e a “direita”, para atacar, em todos os lugares, as conquistas sociais da classe operária.
Desagregação da UE
A nova situação acentuará a desagregação da União Europeia (UE), com efeitos imediatos. No Reino Unido, a primeira-ministra Theresa May pediu demissão (leia abaixo). Na Alemanha, os partidos da “Grande Coalizão” de Angela Merkel sofreram forte recuo: a CDU (direita) perdeu 6,6 pontos e o Partido Social-Democrata (SPD) teve queda ainda mais forte, de 11,5 pontos.
Na França, depois do colapso do Partido Socialista, em 2017, agora foi a vez de Os Republicanos (direita), que, com 8%, obtiveram seu pior resultado. Na Áustria, um dia após a eleição, um voto de censura aprovado pelo Parlamento derrubou o governo de Sebastian Kurz. Na Grécia, o primeiro-ministro Aléxis Tsípras, dirigente do Syriza, sancionado por haver traído as promessas feitas em 2015, anunciou a realização de eleições legislativas antecipadas.
As eleições mostraram o abismo que existe entre todo um sistema e a imensa maioria da população. Essa rejeição traz consequências importantes no terreno da luta de classes. A revolta dos coletes amarelos (“gilets jaunes”), que se desenvolve há seis meses na França, por fora do controle de direções do movimento operário que se agarram à manutenção do sistema, é a sua expressão e o seu signo anunciador.
Correspondente
REINO UNIDO EM CRISE
Os dois principais partidos britânicos – o Conservador de Theresa May e o Trabalhista de Jeremy Corbyn –, que dividem o poder há cerca de cem anos, acabam de sofrer derrota inédita. Os trabalhistas obtiveram 14,1% dos sufrágios nas eleições europeias, com queda de 11 pontos ante o resultado de 2014. Os conservadores conseguiram 9,1%, perdendo 14,8 pontos. É o pior resultado da história do Partido Conservador desde a sua criação em 1834. O mais votado no país foi o Partido Brexit (31,6%).
É bom lembrar que essas eleições nem deveriam ter ocorrido, porque a data prevista para a saída do Reino Unido da União Europeia (o Brexit) era 29 de março.
Theresa May demitiu-se do posto de primeira-ministra sem nem esperar o anúncio do resultado das eleições. Desencadeou assim uma guerra aberta entre os próprios conservadores sobre quem a sucederá. Boris Johnson, partidário de um Brexit sem acordo, é o favorito.
O voto neste ano exprimiu a exigência de respeito ao referendo de 2016, que decidiu pela saída da UE, numa votação que teve a participação de 72% dos eleitores.