Há 81 anos, em 3 de setembro de 1938, num subúrbio de Paris, realizou-se a Conferência de fundação da 4ª Internacional. Delegados representando seções de dez países – União Soviética, Reino Unido, França, Alemanha, Polônia, Itália, Grécia, Holanda, Bélgica e Estados Unidos – e mais o brasileiro Mário Pedrosa(1), em nome dos grupos da América Latina, adotaram o seu programa – “A agonia do capitalismo e as tarefas da 4ª Internacional”, conhecido como Programa de Transição – e um manifesto aos trabalhadores do mundo às vésperas dos “horrores de uma nova guerra imperialista mundial”, que seria a 2ª Guerra (1939-1945), “provocada pela agonia do mundo capitalista, que exala os venenos do fascismo e da guerra totalitária”.
Ausente da conferência, León Trotsky, desde o seu exílio no México – onde seria assassinado, menos de dois anos depois, por um agente de Stálin em 20 de agosto de 1940 – foi o seu principal arquiteto. Dadas as circunstâncias históricas – que incluíam o massacre de toda uma geração de revolucionários por Stálin – Trotsky considerava a construção da 4ª Internacional como uma tarefa para a qual ele seria insubstituível,
dadas a sua experiência e seu papel dirigente, ao lado de Lênin, na Revolução de Outubro de 1917.
Mas, ao contrário da ideia divulgada por seus adversários, a 4ª Internacional não nasceu da cabeça de Trotsky e da ação de grupos exteriores à luta de classes. Ela foi produto de um combate de mais de 15 anos no movimento operário, que tem suas raízes em 1923, quando Trotsky e outros 46 dirigentes bolcheviques apresentaram no 10º Congresso do Partido Comunista da União Soviética uma plataforma contra a burocratização do partido e do Estado nascido da revolução, originando a Oposição de Esquerda que lutava pela reorientação da 3ª Internacional comunista (IC).
Mesmo diante de perseguições, expulsões, prisões e assassinatos, os membros da Oposição de Esquerda Internacional batalharam em seus países – inclusive no Brasil – para redirecionar os Partidos comunistas, livrando-os da burocracia que os dirigia sob as ordens de Stálin, buscando dialogar com seus militantes e intervindo como fração na luta de classes.
O Movimento pela 4ª Internacional surge em 1933, após a vitória de Hitler na Alemanha, fruto da política de divisão da classe operária mais forte da Europa, orquestrada pela IC. Stálin apontava a socialdemocracia como o “inimigo principal”, e não o perigo nazista, e o PC alemão executou ao pé da letra as suas ordens, negando-se à frente única operária contra Hitler. Em 12 de março de 1933, Trotsky chama a combater por um novo partido na Alemanha, em 15 de julho, diante do silêncio de todos os partidos membros da IC sobre
a tragédia alemã, que preparava as condições políticas para a 2ª Guerra Mundial, ele formula pela primeira vez a necessidade de se abrir a batalha por uma nova Internacional.
Um combate para reagrupar a vanguarda
Os bolcheviques-leninistas, assim se intitulavam os partidários de Trotsky, tinham sua própria organização internacional – a Oposição de Esquerda, depois Liga Comunista Internacional – mas não viam a 4ª Internacional como um assunto apenas deles. Todo o seu esforço, ao longo de cinco anos, foi o de buscar associar à luta comum por uma nova Internacional não só os militantes dos PCs em ruptura com Stálin, mas também grupos que se constituíram em ruptura com a socialdemocracia.
Uma aplicação desta orientação foi a “Declaração dos Quatro sobre a necessidade e os princípios de uma nova Internacional”, assinada pelo SAP (criado por deputados da esquerda do SPD, partido social-democrata alemão), pela OSP e RSP da Holanda e pela Oposição de Esquerda Internacional, para incidir num encontro da IAG (conhecida como “Internacional 2 e meio”, pelo seu caráter centrista, ou Birô de Londres), com o objetivo de abrir uma discussão com partidos como o britânico ILP (racha à esquerda do Partido Trabalhista).
Os recuos e vacilações do SAP e outros, impediram que eles fossem até a fundação da nova Internacional. Mas o método utilizado por Trotsky, apoiando-se no de Marx para constituir a 1ª Internacional, recusando que sua organização já fosse o partido revolucionário acabado e buscando associar amplamente sobre uma base de princípios, permitiu à LCI ligar-se a setores do movimento operário: seu grupo nos Estados Unidos fundiu-se com uma organização socialista originando o SWP; um setor da OSP fundiu-se com a LCI na Holanda.
Na França, em 1935, Trotsky convenceu seus camaradas a entrar na SFIO (2), que vivia um afluxo de jovens em suas fileiras. Os trotskistas saíram da SFIO anos depois, mas reforçados numérica e politicamente.
Ao soar o alarme de guerra iminente e após a experiência com as políticas de Frente Popular (aliança com a burguesia “democrática”) impulsionadas por Stálin a partir de 1936, que provocaram derrotas dos trabalhadores na Espanha e na França, é fundada a 4ª Internacional como instrumento para superar
a crise de direção revolucionária do proletariado que se confunde com a crise da humanidade.
Passados 81 anos de sua criação e 79 anos da morte de seu inspirador, a 4ª Internacional vive e luta!
Lauro Fagundes
Notas
1. Mário Pedrosa (1900-1981), um dos pioneiros do trotskismo no Brasil. Com o “nome de guerra” Lebrun representou o Partido Operário Leninista (POL) na Conferência. Foi, anos mais tarde, escritor e crítico de arte renomado e filiado número um do PT quando de sua fundação em 1980.
2. Seção Francesa da Internacional Operária (SFIO), nome da seção da 2ª Internacional à época, que depois viria a ser o Partido Socialista francês.