“Queremos colocar um contraponto à teoria da evolução e disseminar que a ideia da existência de um design inteligente pode estar presente a partir da educação básica, de uma maneira que podemos, com argumentos científicos, discutir o criacionismo”. Essa declaração foi dada em outubro pelo então reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, Benedito Guimarães Aguiar Neto, ao site da própria instituição.
Não poderia ser mais claro, “design inteligente” é como cristãos disfarçam o criacionismo para lhe dar ares científicos. A concepção é obviamente anticientífica, não é aceita por cientistas no mundo todo e serve para se opor à teoria da evolução, de Charles Darwin, que há mais de um século é universalmente aceita como a teoria que explica a evolução da vida no planeta Terra.
Três meses depois dessa declaração Aguiar Neto foi nomeado pelo governo Bolsonaro presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a CAPES. Evangélico calvinista, Aguiar Neto ainda é membro honorário da Força Aérea Brasileira e recebeu medalhas de amigo da Marinha e do Exército.
O fato de um criacionista (e amigo do Exército) ser nomeado para o governo não espanta mais ninguém. O governo já era, sem Benedito, uma reunião de obscurantistas obstinados com preconceituosos de vários tipos, terraplanistas, pregadores de abstinência sexual e detentores de outras “qualidades”. Ganhou novo reforço.
Ganham os “tubarões do ensino”
A nomeação para a CAPES, entretanto, liga o alerta à possibilidade de medidas que podem ir além da pura retórica reacionária. E exige a preparação da resistência por todos os setores ligados à ciência e à educação.
Ligada ao MEC, a CAPES é responsável pelos cursos de pós-graduação em todo o país e por boa parte das bolsas concedidas para pesquisas científicas. Apesar do orçamento em queda vertiginosa desde o golpe de 2016, com quase 65% de corte acumulado, ela ainda concentra o poder de decidir a abertura e o encerramento de cursos de pós nas universidades, incluindo universidades privadas e de ditar o rumo das pesquisas científicas.
A atuação deste senhor pode influenciar decisivamente os rumos da ciência brasileira, que pode passar do sofrimento da censura velada exercida por meios econômicos a uma censura aberta, pela combinação do poder acumulado pela CAPES e as concepções anticientíficas de seu novo presidente.
Suas relações evidentes com o setor privado estão também no rol de preocupações. Embora muitos critérios da CAPES para a pós-graduação sejam questionados por membros da comunidade acadêmica, como o produtivismo, ainda há certa rigidez que evita a abertura indiscriminada de cursos caças niqueis voltados para engordar os bolsos dos “tubarões do ensino” como são conhecidos os grandes empresários do setor. Com o reitor da Universidade Mackenzie no comando, continuará assim?
Luã Cupolillo