Publicamos um artigo enviado desde a Venezuela no dia da posse de Nicolás Maduro para um novo mandato presidencial em 10 de janeiro.
Em 11 de janeiro, o presidente da Assembleia Nacional de maioria opositora (eleita em 2015), Juan Guaidó, acatou a ordem do Grupo de Lima de não reconhecer a posse de Maduro, declarando-se “presidente interino” que convocaria novas eleições, num “show” para demonstrar sua submissão total ao imperialismo. No dia 15, a mesma casa declarou Maduro “usurpador” e emitiu decreto anulando seus atos desde a posse, o que não tem qualquer efeito prático, pois ela não tem respaldo popular e nem poder para tanto.
O que não impediu que o secretário da OEA, Luís Almagro, já comece a tratar Guaidó como “presidente interino”, enquanto Trump estaria estudando o reconhecimento do “governo de transição”. Razão a mais para as forças anti-imperialistas ficarem em alerta para defender a soberania do povo venezuelano.
Desde Maracaibo, na Venezuela, o dirigente do coletivo “Trabalho e Juventude” Alberto Salcedo expõe sua posição sobre a situação, que publicamos abaixo:
Não à ingerência do Grupo de Lima e dos EUA na Venezuela
Nicolás Maduro assumiu seu mandato de presidente para o período 2019-2025 diante do Tribunal Supremo de Justiça e, depois, da Assembleia Constituinte. Ele foi reeleito em 20 de maio de 2018 com 67,84% dos votos, com uma participação de 46,07% dos eleitores (o voto não é obrigatório na Venezuela), ou seja, de 9 milhões 369 mil e 56 votantes. Dois candidatos de oposição, Henry Falcón e Javier Bertucci, disputaram o pleito, apesar do boicote da linha dura direitista e dos EUA. Hoje o chavismo governa 20 dos 24 estados da federação e 310 das 335 prefeituras, além de contar com a totalidade da Assembleia Constituinte.
O governo Trump, que aplica sanções políticas, econômicas e diplomáticas contra a Venezuela, anunciou que considera uma “opção militar”, baseada em voluntários na Colômbia e no Brasil que seriam preparados para uma “intervenção humanitária”.
Para tanto, conta com os governos reunidos no Grupo de Lima – Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Guiana, Honduras, Jamaica, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lucia – que com a exceção do México, agora governado por Obrador, não reconhecem o presidente eleito na Venezuela. A União Europeia também não reconhece o segundo mandato de Maduro.
O que está em jogo é a luta para controlar os recursos naturais do país, em particular as maiores reservas de petróleo do mundo e também a segunda de ouro, numa situação de crise e desintegração do mercado mundial, com uma guerra entre os monopólios imperialistas que atropela todos os tratados comerciais e regulamentações existentes. Neste quadro, os EUA pretendem restaurar um regime obediente a seus interesses em Caracas.
Combater a grave crise econômica
Desde 2015 a Venezuela vive uma grave crise económica: recessão produtiva, contração do mercado interno, hiperinflação desde novembro de 2017 que provocou a queda da qualidade de vida, atingindo o povo trabalhador.
Assim, não há aumento salarial que consiga cobrir as necessidades, o que faz aumentar os conflitos trabalhistas por maiores salários e respeito às convenções coletivas, incorporando denúncias sobre a “política de preços acordados” (que empresários não respeitam) e sobre a transferência de dólares da renda petroleira para o capital privado no quadro do plano de recuperação econômica em curso.
O futuro do novo mandato de Maduro depende em grande medida da capacidade de seu governo de reverter a hiperinflação e a queda de 40% na produção nacional. É preciso ancorar o bolívar (moeda nacional, NdT) nas riquezas naturais, aumentar as reservas de ouro, controlar o uso das divisas que entram pela exportação de petróleo, recuperar a produção petroleira, avançar no controle do comércio exterior e do sistema bancário.
Segue pendente também o combate à corrupção, punindo os que boicotam o abastecimento de alimentos e remédios, os empresários do setor privado que receberam divisas baratas, para proteger a classe trabalhadora, ativa ou aposentada, e assim manter a paz e defender nossas fronteiras.
Nossa nação resistiu esses 20 anos à ofensiva do imperialismo, por isso fazemos um chamado a todos os trabalhadores e povos do mundo a denunciar a política de intervenção do governo dos EUA para se apossar dos recursos naturais da Venezuela.
Alberto Salcedo
“A QUEM INTERESSA UMA INTERVENÇÃO NA VENEZUELA?”
Em 14/01, Gleisi Hoffman, presidente do PT, publicou artigo com o título acima, onde defende a sua presença na posse de Nicolás Maduro e rebate críticas vindas desde o falastrão Ciro Gomes, passando por Tarso (PT) e Luciana Genro (PSOL), até, é claro, da direita, como do vice-presidente Mourão e toda a imprensa burguesa. No artigo de Gleisi lemos:
“Os problemas internos da Venezuela, econômicos, sociais e políticos, têm sido motivo de pressões externas indevidas, que só agravam a situação interna. Mas a posse de Maduro em seu segundo mandato desatou um movimento coordenado de intervenção sobre a Venezuela, patrocinado pelo governo dos Estados Unidos e referendado por governos de direita na América Latina, entre os quais se destaca, pela vergonhosa subserviência a Donald Trump, o de Jair Bolsonaro. (…)
Desde a eleição de Hugo Chávez, em 1998, a Venezuela vem desafiando os modelos econômicos e políticos excludentes que vigoravam naquele país – e na América Latina – e exercendo cada vez mais fortemente sua soberania.
O interesse dos Estados Unidos e seus aliados de subjugar esse incômodo vizinho e avançar sobre suas reservas estratégicas é notório. (…)
São muito preocupantes os movimentos dos governos Trump e Bolsonaro, entre outros, para desestabilizar o governo eleito de Maduro e sustentar um governo paralelo da oposição. Usam uma retórica de guerra como há muito não se ouvia em nosso continente. Querem intervir na Venezuela – considerando até uma intervenção militar – com a narrativa de que seria uma ditadura, que os direitos humanos não são respeitados, que há crise humanitária; precisa-se intervir para salvar o povo.
Alguém acha, sinceramente, que os EUA estão preocupados com a democracia e com os diretos humanos na Venezuela?”