África do Sul: 30 anos depois do primeiro governo do Congresso Nacional do Povo

A efervescência revolucionária que foi sufocada pelos governos do Congresso Nacional do Povo (CNA) está ressurgindo.

Durante mais de trinta anos, o CNA, totalmente corrompido, conseguiu enganar o povo do nosso país utilizando o incensado Nelson Mandela, que na realidade fez muito pouco pela maioria negra. O questionamento da sua posição de verdadeiro movimento de libertação foi escondido por detrás dos 27 anos de prisão de Nelson Mandela. Quase toda a decomposição e corrupção começaram durante a presidência de Mandela.

Não que os trabalhadores e a maioria negra não tivessem consciência da situação desastrosa, mas acreditavam sinceramente em Nelson Mandela e no seu CNA, que eram totalmente subservientes. Mandela e o seu CNA eram os “queridinhos” das instituições financeiras de Brettenwood.

Trinta anos depois, é cada vez mais evidente que 1994 não trouxe a liberdade e que os acordos CODESA de Kempton Park (1) não passaram de uma traição total às aspirações da maioria negra e dos trabalhadores, nomeadamente da classe operária negra.

A dimensão da sua corrupção ficou demonstrada no auge da pandemia de covid-19: os 500 bilhões de dólares emprestados pelo FMI nem chegaram a ser postos em cima da mesa. Tudo, repetimos, tudo foi desviado pelos dirigentes do CNA, mesmo quando dezenas de milhares de pessoas morriam pela covid. Quase todos os governantes estiveram envolvidos nesta corrupção em grande escala. O mais doloroso de tudo isto é que foram mencionados nomes, mas ninguém foi preso.

Certamente todos concordamos que o apartheid não podia ser reformado e que tinha de ser completamente desmantelado e abandonado.

O que aconteceu foi que o governo do CNA [eleito após o acordo, Ndt] o preservou e, ao fazê-lo, infligiu graves prejuízos à maioria negra, transformando a África do Sul na sociedade mais desigual do mundo. O CNA roubou indiscriminadamente o país.

O país inteiro está num estado lamentável. O que está acontecendo no nosso país não se deve a catástrofes naturais inevitáveis, é obra do homem.

Continuam a dizer que a África do Sul é um país com escassez de água, escondendo o fato de que sempre temos chuvas regulares, mas que o partido no poder é totalmente incapaz de recolher a água. Em vez disso, eles deixam que os esgotos fluam para barragens, que são mal conservadas e estão em mau estado.

Beber água da torneira já não é seguro. As pessoas são obrigadas a comprar água se quiserem permanecer saudáveis. Para quem está desempregado, isso é impossível. O problema da terra e da água está literalmente em toda parte na África do Sul.

Doenças que eram muito raras na África do Sul estão aparecendo agora. Estamos falando do cólera. Todos os anos, o governo consagra um orçamento considerável à água e ao saneamento, mas esse dinheiro acaba nos bolsos dos ministros envolvidos. As crianças frequentam escolas ainda equipadas com latrinas de fossa, porque não há água. Há revoltas regulares por causa da escassez artificial de água deliberadamente criada.

Na África do Sul, não há mais trens. Toda a infraestrutura ferroviária foi completamente destruída. Era o meio de transporte mais confiável e acessível, sobretudo para os trabalhadores. A ausência de trens favoreceu a utilização excessiva das estradas. Quase todas as estradas provinciais e nacionais estão esburacadas. Já não é aconselhável conduzir nestas estradas.

Eles destroem tudo o que tocam. O sistema de eliminação de esgotos é literalmente inexistente. Quando chove, as pessoas têm que tirar os sapatos porque as ruas transbordam.

Veja-se o caso de Joanesburgo, por exemplo, que era considerada uma das cidades que mais crescia no mundo. O CNA destruiu-a completamente. Toda a infraestrutura está em frangalhos. Muitas vezes não há iluminação pública, a maioria dos edifícios históricos foram destruídos ou estão em ruínas.

O outro grande problema é a eletricidade. Sofremos constantes cortes de energia. Mais uma vez, os pobres são os mais duramente atingidos, pois as empresas fecham por causa dos apagões. Por vezes, temos cortes de energia quatro vezes por dia e não há muito que possamos fazer.

Foi recomendado à África do Sul que deixasse de utilizar o seu carvão, que é de muito boa qualidade, e que se concentrasse nas energias renováveis. A África do Sul dependia deste carvão para produzir eletricidade. O governo do CNA recebeu 8 bilhões de rands (cerca de 400 milhões de euros) para implementar o programa de energias renováveis, enquanto nós vendemos o nosso carvão. É completamente insano.

Devido à situação geral e à incapacidade do governo de dar qualquer resposta positiva, a África do Sul tornou-se o centro dos protestos no mundo. Neste contexto, algumas pessoas estão queimando as camisetas do CNA, mesmo as que usam o rosto de Mandela.

Agosto de 2023

Correspondente

Tradução de Adaias Muniz

1.Negociações pelo fim do regime do apartheid, entre 1990 e 93, nas quais participaram o Partido Nacional (governista) e o CNA de Mandela e outras organizações.

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