Maduro toma posse e a oposição volta a fracassar

Para os trabalhadores, uma nova etapa na luta da classe

Em 10 de janeiro Nicolás Maduro tomou posse como presidente da Venezuela diante da Assembleia Nacional, conforme o artigo 231 da Constituição. Este evento deu início a seu terceiro mandato consecutivo, em meio a intensas disputas sobre a legitimidade dos resultados eleitorais.

A pressão de organismos e governos estrangeiros pediu uma recontagem de votos que garantisse a sua verificação e transparência.

O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), entretanto, não acolheu os recursos constitucionais de Maria Alejandra Díaz, ex constituinte de 2017, e Enrique Márquez, ex candidato presidencial e confirmou a vitória de Maduro. A cerimônia de posse foi presenciada unicamente pelos presidentes Miguel Díaz-Canel de Cuba e Daniel Ortega da Nicarágua.

A oposição de direita, que não recorreu a nenhum mecanismo constitucional disponível, viu esvaziar-se a sua estratégia de provocar uma fratura dentro das Forças Armadas, a qual não se materializou. Deste modo Maduro inicia um novo ciclo na luta de classes e na evolução histórica do projeto político do chavismo.

A posse se deu num entorno marcado por um notável dispositivo de forças policiais e militares, além de coletivos e milicianos ligados às estruturas do PSUV. Ocorreram detenções arbitrárias e um contínuo assédio policial contra líderes políticos e representantes de organizações de direitos humanos. Entre os detidos esteve Enrique Márquez, ex candidato presidencial do partido Centrados e ex vicepresidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Juan Barreto, ex prefeito de Caracas pelo chavismo, e a advogada María Alejandra Díaz também foram alvos das forças de segurança que estabeleceram uma forte presença militar diante de suas residências. Também foram reportadas detenções de familiares de membros da oposição.

No mundo virtual das redes sociais se anunciava algo como um confronto nas ruas que provocaria uma intervenção militar a partir de uma rebelião civil, suspendendo a posse de Maduro. O cenário incluía a chegada de Edmundo González ao país, apoiado pela direita pró-imperialista da região, por ex presidentes e ex chefes de Estado integrantes da Iniciativa Democrática da Espanha e Américas (Grupo IDEA) e pelas grosseiras pretensões de ingerências dos EUA e União Europeia. Mas a mobilização opositora de 9 de janeiro foi frágil e junto com o simulacro de detenção de Maria Corina Machado, passou a ser outro fracasso para a direita extremista.

O governo Biden condenou a investidura de Nicolás Maduro, aumentando a recompensa que os EUA oferecem por sua captura. Também foram impostas sanções a oito altos funcionários venezuelanos ligados a organismos económicos e de segurança, mas não foram anuladas as licenças que permitem petroleiras estadunidenses operar no país. A Venezuela segue à espera da política que adotará Trump em relação ao governo Maduro.

É em meio a essa crise política que se exerce a pressão do imperialismo através de sanções econômicas impostas pelos EUA e países europeus. O novo modelo econômico de Maduro tornou-se extremamente neoliberal e aberturista, com a dolarização, o achatamento salarial e exoneração de impostos para os setores económicos e transnacionais mais privilegiados.

Além disso, se levou a cabo a transferência de ativos em segredo, amparada pela Lei Antibloqueio, o que possibilitou mudanças na estrutura acionária das empresas mistas de petróleo e gás, com o setor privado chegando inclusive ao nível de “sócio majoritário” ou dono direto das mesmas, o que se choca com a própria Lei Orgânica de Hidrocarbonetos e aponta para mais privatizações no setor petroleiro. Milhões de trabalhadores e membros de setores populares tiveram suas condições de vida destruídas, submergindo nas mais precárias condições já registradas em 25 anos de governo bolivariano.

A posse foi empregada pelo presidente Maduro para iniciar a sua contraofensiva política. Em seu discurso abordou a convocação das próximas eleições para prefeitos, governadores e renovação do parlamento venezuelano. Anunciou ao mesmo tempo uma reforma para atualizar os postulados da Constituição em relação com a “nova economia” e para fomentar a democratização do Estado. Em sua mensagem de prestação de contas diante da Assembleia Nacional, Maduro assinou o decreto de criação da comissão nacional para a reforma constitucional, que será presidida pelo atual procurador da República, Tarek William Saab, e contará com a presença da vice-presidenta Delcy Rodríguez, do deputado Herman Escarrá e de Cilia Flores, deputada e esposa de Maduro.

Hoje, a Constituição Bolivariana representa uma limitação para Maduro. Mediante a reforma o governo busca estabelecer um novo “pacto social” que inclua empresários e opositores políticos. O objetivo é proporcionar um marco constitucional para o retrocesso iniciado por Maduro e a atenção se volta para a revisão da Lei Orgânica do Trabalho (LOTTT), pois o setor empresarial pede a sua modificação como requisito para o incremento dos salários.

A estratégia de Maduro a respeito da reforma democrática do Estado parece enfocar-se em limitar a participação política, tentando utilizar o “Estado comunal” como um meio para exercer controle e cooptar o movimento popular. Esta reforma poderia levar á criação de um regime de partido único, com uma suposta “democracia popular direta”, na qual unicamente o madurismo e seus aliados teriam acesso ao poder político, restringindo assim as liberdades fundamentais próprias da democracia.

Na Coordenadora Nacional Autônoma e Independente de Trabalhadores (CAIT) destacamos a relevância de se respeitar a Constituição Bolivariana e as leis para salvaguardar as liberdades democráticas nela alcançadas. Os direitos de reunião, de greve, protesto e participação eleitoral estão intrinsecamente ligados às reivindicações da classe trabalhadora. É vital preparar-se para esse novo ciclo que começou em 10 de janeiro, considerando uma mudança significativa na situação nacional dentro de um contexto global complicado. A prioridade deve ser a luta por um polo de resistência independente e a criação de uma referência política que defenda os interesses dos trabalhadores.

Alberto Salcedo

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