Trump e bolsonaristas contra as mulheres

Extrema direita segue em ofensiva contra o aborto

Poucos dias após tomar posse, o presidente estadunidense Donald Trump participou, remotamente por vídeo, da Marcha pela Vida, uma das maiores marchas antiaborto do mundo, em 24 de janeiro. Seu vice, J.D. Vance, também discursou.

A participação veio acompanhada de medidas tomadas ainda na primeira semana do novo mandato. Na véspera da marcha, Trump anistiou 23 presos cujos crimes tinham relação à tentativa de impedir que mulheres exercessem o direito ao aborto.

Ele também rescindiu dois decretos que o antecessor Joe Biden instalou depois que a Suprema Corte anulou uma decisão que viabilizava a realização do procedimento nacionalmente, deixando as leis para cada um dos 50 Estados.

Mais do que isso, o governo Trump anunciou que fará uma ofensiva diplomática para tentar impor políticas contrárias ao aborto em agências da ONU, e que vai retomar uma aliança ultraconservadora que tem como objetivo impedir qualquer avanço nas pautas de direitos sexuais e reprodutivos no âmbito mundial. 

Também na Marcha pela Vida, em Washington, estavam Michelle Bolsonaro e alguns deputados. A presença dá o recado: a ofensiva do bolsonarismo para impedir ou dificultar a realização do aborto em caso de estupro, risco à vida da gestante ou anencefalia do feto vai prosseguir.

Retomada da PEC 164 no Brasil: proibição do aborto em qualquer caso

O maior desses ataques é a retomada da PEC 164, de autoria do ex-deputado Eduardo Cunha, que propõe inscrever na Constituição Federal a proibição do aborto em qualquer caso. Pela PEC, o artigo 5º da CF passaria a determinar que a inviolabilidade do direito à vida se aplica desde a concepção, o que se baseia unicamente em conceitos de parte das religiões. 

Noutro terreno, a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) recorreu ao Supremo Tribunal Federal para questionar uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), o qual traz diretrizes para que vítimas de violência sexual possam realizar o procedimento legal sem a necessidade de autorização dos responsáveis ou abertura de boletim de ocorrência. 

Há outras iniciativas legislativas por parte da extrema-direita em terrenos municipais ou estaduais. Por exemplo, na Câmara Municipal de São Paulo e em outras cidades, bolsonaristas propuseram moções em repúdio à resolução do Conanda. Ao mesmo tempo, há uma profusão de projetos que se repetem em várias cidades que atacam as pessoas trans.

A extrema-direita não se furta a esse debate, e dá mostras de que quer seguir até o fim. 

Se não houver uma resistência à altura por parte dos setores que defendem o direito das mulheres, eles terão caminho fácil para avançar nestas pautas e, assim, ganhar mais terreno junto ao povo, além de eventualmente lograrem a proibição total.

O PL 1904 (que criminaliza aborto após a 22ª semana de gestação e cria pena similar à de assassinato) e a campanha “Criança não é mãe” deram duas lições: a primeira, sobre a possibilidade de mobilizar para defender esse direito; sobre a possibilidade de ganhar a opinião do povo, com 66% da população se colocando contra o PL (Datafolha em junho/2024); e de impor recuos à direita no Congresso. A segunda, sobre os erros que o PT pode cometer e os seus prejuízos, ao se acovardar frente aos espetáculos bolsonaristas e a conjuntura eternamente desfavorável no Congresso Nacional.

Esse debate deve voltar ao centro na preparação para o 8 de março, Dia Internacional da Mulher Trabalhadora, junto a outras demandas como o fim da escala 6×1, o acesso a creches pública de qualidade e ações concretas quanto ao combate à violência.

Priscilla Chandretti

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