É preciso mobilização unitária para acabar com o governo da Monarquia
A violenta repressão de 1º de outubro contra o direito do povo catalão decidir tem sua raiz na constituição do Estado Espanhol, que não é uma nação mas a composição de diferentes povos, todos oprimidos por um regime baseado na Monarquia. Suas instituições – exército, justiça, administração, Igreja Católica – foram moldadas para se colocar contra os direitos democráticos dos povos e os direitos sociais dos trabalhadores.
Reproduzimos trechos da Declaração do POSI-Partido Operário Socialista Internacionalista, seção da 4a. Internacional no Estado Espanhol, publicada no calor dos acontecimentos e que explica que é a máscara desse regime que está caindo. Não se trata de defender o “independentismo”, mas sim a autodeterminação, o direito do povo decidir livremente.
“As imagens são claras. Dezenas de milhares de pessoas tentando votar pacificamente. E um impressionante aparato policial para impedi-las. Violência, repressão, centenas de feridos.
O regime herdado do franquismo, com seu governo Rajoy minoritário e corrupto, com seu Tribunal Constitucional, com sua polícia e seu aparato judicial, voltou-se inteiro para impedir o povo catalão de exercer democraticamente seu direito de voto.
Com o povo catalão, trabalhadores e povos de todo Estado
Apesar disso, segundo o governo da Catalunha, dirigiram-se para as urnas mais de três milhões de pessoas, de um total de 5,3 milhões possíveis. A polícia fechou 319 dos 2.315 colégios eleitorais. Roubou urnas e cédulas de votação. Mesmo assim, conseguiram votar 2,2 milhões (42,5% dos eleitores). Desses, 2 milhões (90%) votaram sim e 176 mil (7,8%) votaram não. [Para a pergunta “Quer que a Catalunha seja um Estado independente sob a forma de república?” – NdE]. Houve 45 mil brancos e 20 mil nulos.
“Catalães, vocês não estão sozinhos”, “Fora Rajoy”, “Direito a decidir”, foram os gritos ouvidos em maciças manifestações na Porta do Sol, em Madrid, e noutras concentrações por todo o país.
Às 10 da manhã deste 1 de outubro, a União Geral dos Trabalhadores da Catalunha afirmava: ‘é intolerável e injustificável que numa democracia se utilize a força e a violência contra cidadãos que querem votar pacificamente’.
Esse é o sentimento da maioria dos trabalhadores, de todas as regiões, como uma só classe.
Nova etapa
Quaisquer que sejam os desdobramentos, uma certeza se impõem: está desestabilizado o regime da Constituição de 1978, sob a forma da Monarquia herdada da ditadura franquista.
Naufragaram os pactos da ‘transição’, assinados, na época, pelo Partido Comunista Espanhol (PCE), Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), além dos partidos burgueses da Catalunha e do País Basco, com os representantes diretos do franquismo.
As comunidades autônomas se revelaram um instrumento de divisão e enfrentamento entre os povos, todas aplicando disciplinadamente os cortes impostos pelo capital financeiro.
Europa e Estados Unidos se mostram preocupados com a incapacidade de Rajoy resolver a situação. Não lhes preocupam os direitos dos povos, mas, sim, assegurar o domínio das multinacionais e o lugar estratégico da Monarquia no apoio às suas aventuras militares, à sua agressão à Venezuela. É a mesma preocupação dos patrões da Catalunha, plenamente integrados ao capital financeiro espanhol, e que pedem uma “solução política”.
Em todo o país, os trabalhadores estão indignados, mas também desorientados pela atitude de partidos que falam em seu nome. Como Pedro Sánchez (PSOE) pode apoiar Rajoy nessa ofensiva repressiva? Como Pablo Iglesias (Podemos) e Alberto Garzón (PCE) não se pronunciam claramente?
Por que as Confederações Sindicais em nível de todo o Estado Espanhol não chamam à mobilização unificada da classe trabalhadora, contra a repressão, expressando a relação direta entre direitos sociais e direitos democráticos?
Acabar com Rajoy
Abrir a via da República
Puiddemont (governador regional da Catalunha, NdT) parece anunciar uma declaração de independência do Parlamento. Rajoy parece ameaçar nova investida contra os representantes do povo catalão. Ninguém pode predizer o próximo desenvolvimento dos acontecimentos. Mas, para setores crescentes dos trabalhadores e da população, parece mais claro o que o POSI proclamava no momento de sua fundação, em 1980: a Monarquia é incompatível com os direitos sociais e as liberdades.
Vozes se erguem pedindo uma ‘saída negociada’, inclusive um ‘referendo pactuado’ para… salvar o regime! Do ponto de vista dos trabalhadores e dos povos uma negociação somente poderia ocorrer sobre uma base democrática: o reconhecimento do direito à autodeterminação dos povos, ou seja, acabar com o regime monárquico, proclamar a República para que TODOS os povos possam decidir livremente que relação querem manter com os demais povos: federar-se, confederar-se ou separar-se.
De nossa parte, defendemos a República Catalã Livre que livremente se associe a uma União das Repúblicas Livres de todos os povos do Estado Espanhol.”
Comité Executivo do POSI
20h00 de 01.10.17
E AGORA?
Depois da mobilização massiva de uma grande parte do povo catalão para votar no primeiro de outubro (cerca de 3 milhões de pessoas), as manifestações, assembleias, inclusive movimentos de greve, prosseguiram na segunda e terça-feira. Enquanto escrevemos, novas manifestações estão sendo convocadas no centro de todas as cidades da Catalunha.
Ao mesmo tempo, chegam múltiplos posicionamentos de todos os povos da Espanha contra a repressão exercida pelo governo da monarquia.
Rajoy se reuniu, desde segunda-feira com o secretário geral do PSOE e do Partido da Cidadania para tentar uma decisão comum, o que não foi possível. Sanchez (PSOE), embora apoiando o governo central, exigiu uma negociação política. Vários porta-vozes do aparelho de Estado, como o jornal monarquista ABC, pedem que o governo invoque o artigo 155 da Constituição, ou seja, a suspensão das instituições catalãs.
Por seu lado, o governo catalão exigiu uma mediação da União Europeia, evitando recorrer aos demais povos da Espanha. Ele também anunciou o resultado do plebiscito bem como a convocação próxima de uma sessão do Parlamento catalão para eventualmente proclamar a independência. Depois, na terça-feira, chamou todas as classes sociais para uma greve cívica em apoio à sua política. As escolas, os colégios e as universidades ficaram fechados.
Uma boa parte do comércio e dos serviços públicos também fechou e, principalmente o pequeno campesinato, mantém bloqueadas 51 estradas da Catalunha. Os quartéis centrais da Guarda Civil e da polícia nacional estão cercados pelos manifestantes.
As duas confederações majoritárias, a UGT e as Comissões Operárias (CCOO), protestaram contra a repressão policial, participaram das assembleias, mas não apoiaram a greve cívica, receando que ela seja utilizada politicamente pelo governo catalão.
Uma evidência salta aos olhos: mais do que nunca, só a unidade fraternal dos trabalhadores e dos povos em todo o país pode abrir uma saída democrática.
Barcelona, terça-feira 3 de outubro de 2017, 17h
Angel Tubau