Sem consenso nas elites, não mudou muita coisa
Terminou a mal-chamada reforma política, na verdade, uma miserável reforma eleitoral.
Por falta de acordo na classe dominante, propostas mais ousadas e reacionárias felizmente já tinham sido abandonadas nas semanas anteriores, como o voto distrital misto ou o chamado distritão – que deixaria a legislação ainda mais retrógrada, favorecendo os caciques das legendas e os aventureiros (esportistas, artistas etc.) em detrimento do voto em plataformas.
Assim, no último dia do prazo, 7 de outubro, os vetos do presidente Temer “corrigiram” o serviço dos parlamentares da véspera (abaixo), encerrando os trabalhos sem mexer no essencial para uma verdadeira reforma da representação: o voto unicameral (fim do Senado), proporcional (1 eleitor = 1 voto), o voto em lista pré-ordenada com fundo público exclusivo.
Fim das coligações
A dita reforma de Temer acabou com as coligações proporcionais dos partidos. A medida evita que o voto no candidato de um partido termine elegendo outro, de um partido “coligado”. Também retirou a figura da “federação de partidos” que vinha da Câmara, um subterfúgio para a coligação. Mas a medida só valerá em 2020, até lá a regra pode até voltar.
Clausula de desempenho
Proposta pelo periclitante senador Aécio Neves (PSDB-MG), instituiu-se uma cláusula de barreira progressiva – de acordo com um percentual mínimo de votos, fica condicionado o acesso dos partidos ao fundo partidário, ao tempo de TV e rádio e ao “funcionamento parlamentar” no Congresso. O percentual aumentará gradualmente, começando em 1,5% dos votos já em 2018 até chegar a 3% em 2030.
A pretexto de diminuir o número de partidos – hoje 29 – a medida é antidemocrática: o PT, por exemplo, teria tido mias dificuldade de crescer se a cláusula existisse quando ele nasceu. É o eleitor, pelo voto, quem deve depurar o “mercado partidário”, induzido pelo regime de balcão de negócios no Congresso. A “cláusula” tenta organizar esse mercado em favor dos grandes, aliás, como acontece nos mercados em geral.
Fundo eleitoral
Também se criou um fundo público eleitoral de cerca de R$ 2 bilhões.
Mas ele não é o que parece! Não vai moralizar as eleições porque não é um fundo exclusivo. Continuam autorizadas as doações individuais.
As pessoas físicas podem doar, até o limite de 10% da renda bruta do ano anterior (Temer vetou um limite de 10 salários mínimos). Não se permite doação de empresas, mas os empresários podem fazer a festa, na proporção da sua riqueza, claro.
Para não restarem dúvidas da intenção dos nobres legisladores, o milionário presidente do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE), armou com a cúpula da maioria dos partidos um texto confuso, só para que o veto presidencial deixasse sem limite o autofinanciamento dos próprios candidatos, mecanismo que serviu sob medida ao milionário paulistano João Dória, em 2016.
Agora, em 2018, os candidatos poderão doar até o teto de despesa permitido para o cargo em disputa – por exemplo, módicos R$ 2,5 milhões para um deputado federal!
Perfume no porco
Quem está surpreso com o congresso golpista?
Na resolução sobre o tema, em sua reunião de setembro, o Diretório Nacional do PT constatou que “o Congresso Nacional, a cada dia vê sua legitimidade se esvair”.
Estranho é o líder do PT na Câmara, deputado Carlos Zaratini, no boletim da bancada, avaliar de conjunto que as medidas “vão permitir uma campanha mais democrática”, “então, eu considero que foi uma reforma política muito boa”.
Boa para quem, cara pálida?
João Alfredo Luna