As greves dos professores nos Estados Unidos

O sistema escolar público americano é organizado pelos Estados federados. Os funcionários públicos dos Estados federados são metade professores e, a outra metade são os serviços de segurança, policiais, bombeiros, etc.

Conforme as decisões dos Estados federados, os cortes nos orçamentos são mais ou menos brutais. No nível federal, o governo central reduziu as despesas sociais para financiar as despesas militares, concentrando principalmente nas despesas de Seguridade social (Medicaid e Medicare);o salvamento dos bancos tem custado caro desde 2007 e os Estados membros foram atingidos especialmente nas despesas de educação.

Na média nacional, os professores ganham 23% a menos que os outros trabalhadores com igual qualificação. Mas as diferenças são grandes entre os estados. O desnível é de 50% entre o estado de Nova Iorque e o Arizona. A queda constante em seus salários criou uma situação onde muitos não conseguem mais pagar por seu seguro saúde e tem que ter um segundo emprego. Os estados que aplicaram as recomendações do FMI reduziram à miséria seus professores.

Uma onda de greves está se desenvolvendo. Em um primeiro momento, a resposta das autoridades foi cínica, como aquela de Matt Bevin, o governador republicano do Kentucky: “Eu garanto a você que hoje, em qualquer lugar do Kentucky, uma criança que tenha sido deixada em casa por não ter onde deixa-la, foi vítima de uma agressão sexual.”Essa ameaça venenosa contra os grevistas causou uma tal indignação que ele foi obrigado a se desculpar. Na verdade, os professores não têm o direito de greve e a justiça americana é dura com os trabalhadores, uma acusação dessas foi particularmente grave pois colocava cada grevista como cúmplice de crimes. O colunista do New York Times, Paul Krugman, fala de guerra contra os professores.

A educação é, portanto, gerenciada pelos governadores dos estados. Um verdadeiro modelo para a regionalização e territorialização da educação nacional de Macron…

A existência de uma convenção coletiva, de um estatuto à escala de todo o país é um grande desafio para os professores estadunidenses e esse exemplo nos indica o quanto é importante combater todas as contrarreformas de “modernização” que visam romper os estatutos na França.

Um artigo do New York Times de 28 de abril dá informações, aqui os principais trechos:

A revolta dos professores se alastra no Arizona.

Terça feira, uma marcha histórica de professores reuniu mais de mil escolas públicas no Arizona. Esse estado é o último a ser varrido por uma revolta de professores mal pagos que começou em fevereiro no estado de Virgínia Ocidental, depois se estendeu para Oklahoma, ao Kentucky e também, na terça-feira, ao Colorado. Jason Riley, jornalista conservador, observa com irritação no Wall Street Journal: “Não são apenas os campi. As escolas K-12 públicas (primárias e secundárias NdT), também estão se transformando em ninhos de ativismo político”.

A difusão, como um incêndio, do movimento dos professores – em uma parte do país que é largamente hostil ao movimento operário organizado – é um dos mais surpreendentes e dos mais fascinantes desenvolvimentos desse momento político, e triste por outro lado. Os conservadores têm razão em se preocupar: estamos testemunhando uma revolta cidadã contra suas políticas.

Há vários fatores que interagem por trás do crescimento explosivo do movimento dos professores. O mais significativo, sem dúvida, é que os professores, nos estados republicanos, se sentem encurralados após uma década ou mais de reduções dos investimentos pelos governadores republicanos. Em função de uma série de cortes orçamentários, principalmente nos últimos dez anos, os professores do Arizona estão entre os mais mal pagos da nação e eles têm as classes mais carregadas do país – mais de quarenta alunos por professor, segundo Joe Thomas, presidente do Sindicato dos Professores da Educação.

Nesta semana, visitei uma escola K-8 (faculdade, NdT), no sul de Phoenix, uma área plana, poeirenta e totalmente aberta, que fica a apenas 15 minutos de carro da cidade, mas parece muito mais longe (o diretor me pediu para não o identificar, nem à sua escola, por medo de represálias administrativas por deixar entrar um jornalista).

A professora de ciências me disse que suas classes têm entre trinta e trinta e seis alunos. Assim como as mesas, ela teve que comprar com seus próprios recursos a maioria das coisas que estão na sala de aula, algumas foram doadas; não somente os livros, mas também as cadeiras e mesmo um dispensador de água, que as classes precisaram quando, durante sete meses, os bebedouros ficaram quebrados.

A professora tem normalmente um segundo emprego, mas tem que deixa-loquando tem filhos. Ela ama seu trabalho, mas me disse: “à medida que se envelhece e com uma família, fica cada vez mais difícil continuar”.Ela estava triste e ansiosa em relação à marcha, mas votou a favor, pois está desesperada. “Eu cheguei ao ponto de ruptura”, ela disse, “nós não temos mais crédito. Eu gasto mais e mais dinheiro do meu bolso, e não consigo ter os resultados que gostaria do modo como as coisas estão agora. Algo tem que acontecer.”

A greve dos professores na Virginia Ocidental mostrou aos professores do Arizona que alguma coisa podia acontecer. Eles me disseram que eles foram também inspirados por outras mobilizações, desde a marcha das mulheres até o movimento “NeverAgain” (Nunca Mais, NdT) pelo controle das armas. Em Phoenix, esta semana, eu fui a um encontro organizado no subúrbio, no pátio de uma escola primária chamada Lisa-Wyatt, onde os professores e pais preparavam um porta-em-porta para pedir o apoio dos vizinhos à marcha. “Vendo as crianças organizar as marchas em todo o país, é como ‘Espere, eu também posso fazer isso’.” Eles disseram. (Alusão às marchas dos estudantes nas 800 cidades após o tiroteio em um colégio da Flórida, Ndt).

A impulsão para a marcha no Arizona, como nos outros estados, não veio dos sindicatos de professores, embora eles tenham dado apoio durante a ação. De fato, isso começou em um grupo do Facebook “os professores unidos do Arizona” e uma hashtag #RedforEd (Vermelho para a Educação, NdT), lançado por um professor de música de escola primária, NoahKarvelis, que escolheu o vermelho em solidariedade a seus colegas da Virginia Ocidental.

Não é por acaso que as marchas de professores acontecem nos estados onde os sindicatos são fracos. Quando os professores não têm representação coletiva, pequenas organizações, surgidas rapidamente, como “os professores unidos do Arizona”, podem obter apoio imediatamente. Além disso, os estados que reduzem seus professores à miséria acabam perdendo seus meios de pressão sobre eles. No Arizona a lei não autoriza a greve no setor público e os professores podem, em princípio, perder seus empregos por ter participado em uma marcha.

Mas, por causa de seus salários extremamente baixos, o Arizona tem uma falta tão aguda de professores que muitas escolas já contratam professores sem nenhuma formação, alguns têm apenas o diploma do ensino médio. Os governos conservadores pressionaram os professores ao limite, ao ponto de não terem mais nada a perder.

No momento não se pode dizer quanto tempo os professores podem ter. Neste mês, o governador do Arizona, DongDucey, tem sido bem-sucedido em relações públicas ao oferecer um aumento de 20% aos professores. Muitos não confiam nele, afirmando que seu plano não inclui despesas e receitas suplementares para financiá-lo.Ele também não respondeu às exigências dos professores de restaurar as despesas com educação ao nível de 2008.

Professores temem que a opinião publica não entenda por que eles não aceitam o que parece, à primeira vista, uma oferta razoável. O crescimento rápido do movimento RedforEd significa que uma grande parte da organização é espontânea, e ninguém sabe como será a resposta do público.

Mas, como vimos em todo o país após a eleição de Trump, a mobilização é contagiosa e constrói a si mesma. Ducey, de qualquer forma, é candidato à reeleição este ano em um estado que tende a passar ao azul (cor democrata, NdT). “Talvez eu esteja muito confiante, mas nós temos um relacionamento forte” me disse Karvelis, “nós temos a verdade do nosso lado. Nós temos o povo do nosso lado. E nós temos pessoas que não têm medo de assumir riscos.”.

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