“Queria também pedir aos CACs, aos atiradores que têm armas legais – hoje nós somos, inclusive eu, 900 mil atiradores – venham aqui mostrar presença. Se nós perdermos essa batalha, o que vocês acham que vai acontecer dia 19? Vão entregar as armas. E aí o que vão falar? ‘Perdeu, mané’?”
A fala foi feita em cima de um palco improvisado no acampamento golpista em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, no dia 26 de novembro. O autor é o empresário Milton Baldin. Ele se referia ao dia 19 de dezembro, quando a Justiça Eleitoral havia marcado a diplomação de Lula (antecipada para 12/12).
Neste caso, suscitado pela equipe de segurança de Lula, o Judiciário não demorou tanto a agir. Alexandre de Moraes determinou a prisão de Baldin, que ocorreu na noite da terça (6) no acampamento.
BR-163
O empresário golpista viajou cerca de 1.398 km para se instalar em frente ao QG do Exército em Brasília, já que ele é de Sinop, no Mato Grosso. É nessa cidade que dois caminhões foram incendiados, em meio aos atos golpistas na rodovia BR-163. No mesmo dia, 21 de novembro, dois homens foram presos por atos análogos a terrorismo, flagrados ao abordar um caminhão que não parou no bloqueio. Além de arma e munições, eles portavam nove galões de gasolina.
Na antevéspera, um grupo havia sido flagrado, em vídeo, colocando fogo em outros caminhões na mesma rodovia, porém entre os municípios de Nova Mutum e Lucas do Rio Verde. A polícia encontrou ligações com os bloqueios na BR.
Já no Pará, na mesma BR-163, que um grupo de golpistas abriu fogo contra viaturas da Polícia Rodoviária Federal, no início de novembro, em um bloqueio no município de Novo Progresso.
A Polícia Federal realizou a operação “163 Livre”, cumprindo dez mandados de prisão provisória, que trata os envolvidos no bloqueio como uma associação criminosa, com acusações como homicídio qualificado tentado, constrangimento ilegal e atentado contra a liberdade de trabalho. Segundo jornalistas, as autoridades acreditam que há garimpeiros envolvidos na exploração ilegal de ouro em terras indígenas junto ao grupo que promoveu o ataque.
Punir os crimes
Como se vê, há uma certa reação à escalada violenta dos bolsonaristas inconformados com a derrota e que desprezam a vontade popular. Pode-se perguntar se a contento, e a que custo. O judiciário usa alguns expedientes de condenação “como atentado contra a liberdade de trabalho” que podem se voltar contra trabalhadores no futuro.
A questão é saber como chegamos até aqui. Afinal a lista de crimes vai muito além desses casos extremos, há também os milhares de crimes eleitorais cometidos, já amplamente conhecidos, e a ligação de todas essas ilegalidades a outro QG, o da ex-campanha de Jair Bolsonaro.
Entre os 43 empresários que tiveram contas bloqueadas por Moraes por suspeitas de financiar atos golpistas, estavam os responsáveis por R$ 1,3 milhão em doações à campanha de Bolsonaro.
A escalada aos casos de violência aberta tem a ver com a impunidade aos crimes anteriores. O prefeito de Tapurah, também no Mato Grosso, Carlos Alberto Capeletti (PSD), que foi afastado do cargo por 60 dias, em decisão de Moraes de 7 de dezembro, por convocar atos golpistas em Brasília, por exemplo já tinha cometido um outro crime, ainda durante a campanha. Ele prometeu rifar uma Fiat Strada se Bolsonaro vencesse. A Justiça Eleitoral obrigou o prefeito a apagar o vídeo e se retratar. Nada mais.
Nesse sentido, está correta a campanha de Lula que pediu ao TSE a inelegibilidade de Bolsonaro e aliados, por abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação. A petição por processo, de 8 de dezembro, cita 10 ações do governo federal, como a antecipação dos repasses do Auxílio-Brasil e do Auxílio-Gás durante o segundo turno e a liberação de uso do FGTS “futuro” para financiar imóveis.
Esse pode ser o primeiro passo para passar a limpo toda a podridão recente que vimos nesse país e não dar mais espaço para o ovo da serpente.
Priscilla Chandretti