Homenagem a Leon Sedov, Leon Trotsky e todas as vítimas do estalinismo.

Sábado, 29 de agosto, às 10.30 h. Cerca de 500 trabalhadores e ativistas (três vezes mais que no ano anterior) reuniram-se no Cemitério de Thiais (Paris), no túmulo de Leon Sedov, respondendo ao chamado da Seção Francesa da Quarta Internacional  que há trinta anos, todos os anos, convoca essa atividade que, neste agosto de 2015, teve uma ressonância particular.

Publicamos os discursos de dois camaradas que, em nome da direção da Seção Francesa da Quarta Internacional, a  Corrente Comunista Internacionalista (CCI) – corrente do Partido Operário Independente (POI), tomaram a palavra:


Discurso de Marc Gauquelin

Camaradas,

A homenagem que rendemos neste 29 de agosto de 2015 a Leon Trotsky, Leon Sedov e todas as vítimas da repressão estalinista, assume particular importância. Ela ocorre em um momento marcado por dois eventos de natureza e importância aparentemente diferentes.

De um lado, um novo salto no processo de decomposição acelerada do sistema de dominação imperialista, com todos os horrores que o acompanham e, de outro, um golpe desferido desde dentro contra a seção francesa da IV Internacional, a Corrente Comunista Internacionalista (CCI) do Partido Operário Independente (POI), e, portanto, contra toda a Quarta Internacional.

Há um ano, quando da nossa última homenagem, o exército israelense massacrava a população palestina de Gaza com suas bombas. Nesse mesmo lugar, significado político daquele ato, já destacávamos as contradições que se manifestam entre os agentes mais fervorosos da defesa do imperialismo mundial e, em particular, no  interior do imperialismo americano. Enfatizávamos que Netanyahu estava tentando “forçar a mão” de Obama e indicávamos que, em tal situação, as piores aventuras eram possíveis; que qualquer deslize poderiam acarretar em guerras que poderiam ser estendidas, desenvolverem-se e se multiplicarem-se em todos continentes.

Chamávamos a atenção para a ameaça de perda de controle por parte dos principais promotores de guerras. E, o que temos visto nos últimos dias confirma essa avaliação: o balé diplomático sobre o tema do Irã, as alianças, as mudanças nas alianças, o armamento de bandos  recentemente opostos pelos mesmos traficantes de armas… entre os quais se incluí o nosso presidente da República, Holande.

Seria tedioso fazer aqui um relatório completo dos horrores que se multiplicam. Todos podem ler sobre isso nas primeiras páginas da imprensa mundial: 71 imigrantes mortos sufocado a bordo de um caminhão abandonado numa estrada austríaca. Mas, camaradas, isso só cresce com o drama daqueles que morreram no mar, para aqueles que, no mesmo dia, padeceram no porão de um navio de carga pelas mesmas razões.

Raramente se expressa de maneira tão clara, a barbárie e o horror do sistema de dominação imperialista. Aqueles que organizaram o desastre, aqueles que têm destruído o Oriente Médio para roubar seus recursos naturais. Essa mesma gente se reúne em Viena justamente para discutir o “acolhimento” de migrantes, para discutir percentagens de acolhimento, para discutir a que países poderiam levá-los e quais os países para os quais deveriam ser devolvidos, de volta à suas casas …

Raramente, tomou tanta força as conclusões políticas fundamentais da Quarta Internacional, em continuidade com as posições tomadas por Lenin antes da Primeira Guerra Mundial, com as tomadas por Trotsky antes da Segunda Guerra Mundial e que podemos resumir em uma frase: “A ordem imperialista deve ser abatida”.

Uma palavra ainda sobre as centenas de milhares de “imigrantes”, cujo número não deixa de crescer. Eles estão, agora, nas mãos de redes mafiosas que organizam sua passagem através do Mediterrâneo. São redes criminosas controladas por grupos que prosperam com a organização do mercado negro de petróleo. Uma vez na Europa, caem nas mãos das máfias dos Balcãs. Máfias protegidas por camarilhas que o imperialismo trouxe ao poder em todos os países dos Balcãs, sob a base do esmagamento e desmembramento da Iugoslávia através dos bombardeios da OTAN.

Então, camaradas, adicione a isso o colapso do preço do “ouro negro”, a ameaça da subida das taxas do Federal Reserve (Banco Central dos EUA) e você terá o quadro que traçam os principais especialistas na economia global quando dizem: “Veja, a Venezuela vai desaparecer, a Argélia vai ficar em situação terrível, o milagre turco desaparecerá, África do Sul … “desenhando o mapa da” destruição previsível “.

Lembremo-nos, camaradas,

O que nós escrevemos na resolução aprovada pelo Secretariado Internacional da Quarta Internacional (SI) de 15 de janeiro: “A única força que pode salvar a sociedade na França, na Europa  e no mundo do naufrágio, do caos e dos confrontos entre comunidades é a classe operária, unindo-se em seu plano de classe com as suas organizações, reunindo todas as suas componentes para colocar todo o seu poder em combate que deve levantar contra seus respectivos governos, colocar-se de pé contra seus governos para forçá-los a abandonar as reformas aprovadas na Europa pela União Europeia, instrumento do capital financeiro, para romper a coalizão militar imperialista. Esse é o primeiro passo, que abre o caminho para a constituição da Europa de governos que empreendam uma cooperação livre e pacífica dos povos do continente, ponto de apoio para a organização em escala mundial de cooperação pacífica entre todos os povos do mundo liberado de dominação imperialista.

A defesa da civilização humana está concentrada nisso “.

E acrescentamos, em uma resolução de aplicação do referido Secretariado Internacional de 15 de janeiro, um chamamento às seções da Quarta Internacional”.

O SI chama todas as seções da Quarta Internacional, a todos os grupos a ela vinculados, a discutir imediatamente essa declaração que desemboca na necessária apreciação – tendo em conta as circunstâncias da orientação de construção das seções da Quarta Internacional –  em todos os grupos de países e das formas transitórias que se reveste.

O SI convida suas seções a rever e reforçar o compromisso de todas as forças que a dispõe (militantes e quadros) na luta para ajudar a agrupar na pratica, as forças da classe para ajudá-las a superar o obstáculo das direções enfeudadas e, assim, prontamente, ancorar-se sem demora e profundamente do coração das grandes organizações da classe que às seguem vertebrando e onde as crises devem desenvolverem-se sob a pressão dos acontecimentos.

Agregamos: O SI apela a todos os grupos e todas as seções ligada à Quarta Internacional para abrir esta discussão e proceder a um rigoroso exame de sua situação, rejeitando toda rotina e conservadorismo. Este convite é dirigido a todas as seções da Quarta Internacional, seja qual for seu tamanho.

O SI insiste: a fase em que entramos é apenas o prólogo de um novo giro. E só é uma fase de transição devido à resistência da classe operária que não foi derrotada, mas está impedida de dispor de toda sua energia.

Temos o tempo contado. Entrar de cabeça imediatamente com todas as nossas forças nos gigantescos combates decisivos que se avizinham, encontraremos os meios de construir a Quarta Internacional com os trabalhadores, ativistas, jovens que estão na vanguarda da luta para preservar a independência das organizações de classe e para ajudar a realizar as condições de combate de conjunto. Construir a IV Internacional construindo as organizações em cada país, sob uma forma adequada frente aos acontecimentos, materializando a estratégia de transição na construção do partido revolucionário. O SI convida as seções estabelecer um plano de construção que inclui metas de reforço, com base em um calendário.

Tudo está concentrado nesta batalha”.

Camaradas,

Peço desculpas pela longa citação, mas ela reveste-se de grande importância. Ela relaciona o giro de a situação objetiva, um novo período de mergulho na barbárie, com a discussão necessária dentro da Quarta Internacional para modificar a disposição de suas de suas forças na classe e na expectativa das lutas que se avizinham.

A seção francesa decidiu aplicar essa resolução.

Decidiu passar pela peneira ” sem espirito de rotina” sua atividade de construção sob o método de transição.

Ele examinou as causas da estagnação e inclusive a regressão do POI.

Ela decidiu, em sua Conferência Nacional de 7 de março propor que a preparação do V Congresso da POI fosse baseada em uma ampliação de sua superfície para os militantes e quadros que se preparam para desempenhar um papel importante no choque que se anuncia.

Decidiu propor a preparação de uma assembleia-debate de militantes, convocada sob os auspícios do jornal Informações Operárias, tendo como ponto de partida a assembleia de 06 de junho. Decidiu fazer dela um ponto de apoio para revitalizar o POI e ancorar-se nos processos em curso utilizando a situação de gestação dos iminentes combates que anunciam os últimos acontecimentos da situação política no país.

Temos que ser claros: foi esse sucesso a que provocou o lançamento da ofensiva que a Quarta Internacional é agora é objeto. Muitos indícios sugerem que essa ofensiva era preparada, de forma subterrânea e cuidadosa, há meses. Mas foi o êxito do 06 de junho que desencadeou a operação.

Por exemplo, a brusca aparição de um jornal concorrente ao Informações Operária (jornal do POI, nota do tradutor) é uma coisa que não se improvisa. Um jornal concorrente do periódico fundado por Pierre Lambert. Um jornal cujo lançamento foi acompanhado por uma campanha de cancelamento de assinaturas de Informações Operárias. Alguns deles já não pagam as suas cotas à Quarta Internacional e chamam seus seguidores a não pagar. Chamam a bloquear os recursos em contas especiais e, assim, impedi-las de chegar à tesouraria nacional da Quarta Internacional … E, para apagar as trilhas, para esconder a longa preparação necessária para publicar um jornal concorrente, para não deixar nenhum vestígio da longa “premeditação” produziram a operação atual. Assediaram militantes da Quarta Internacional e do POI por telefone, pelo correio eletrônico, com toda uma série de interpelações políticas de uma multiplicidade de temas. Deste ponto de vista, a imaginação humana é fértil e pode constantemente inventar uma série de questões que não têm outro objetivo senão tentar paralisar, obscurecer e desmoralizar.

De repente, descobriram novos desacordos fundamentais (diferentes dos que foram discutidos no DN e da CP e que constam nas atas) sobre questões que têm sido discutidas nas instâncias de direção da CCI, com a presença de camaradas que, agora, questionam esses pontos de vista. Sobre isso, eles nada explicam. Camuflam suas posições, ou melhor, inventam sobre os desacordos que lhes interessam para tentar dar à sua operação a aparência de um debate democrático.

Em resumo: o núcleo do problema está no fato de que a Quarta Internacional necessitava de uma análise crítica da situação em que se encontrava. Em toda e em cada uma das seções, nas vésperas das maiores turbulências, para reajustar as disposições das suas forças para poder inseri-las, concretamente, nos processos em cujo interior é possível construir verdadeiros partidos operários revolucionários.

Portanto, o sucesso do 06 de junho provocou imediatamente a operação a ser qualificada como é: uma tentativa de força. Tinham que tentar impedir que o Partido Operário Independente e seu V Congresso se apoiasse nas forças do 06 de junho.

Rendamo-nos às evidências: para os iniciadores desta operação, havia chegado a hora, não podiam esperar mais para emancipar-se das regras políticas da Quarta Internacional, para se livrar do que é chamado de centralismo democrático que é – em duas palavras – a lei da maioria. Depois de uma discussão livre: unidade na ação. Exige-se que se aplique as decisões majoritárias. E, desse ponto de vista, eles precisam, era absolutamente necessário, romper com essa ferramenta.

O problema é simples, camaradas: a recusa feroz a aceitar a proposta da DN da CCI para realizar o Congresso da CCI depois do Congresso de POI, que se apresentava com os melhores predicados após o sucesso do 06 de junho, confirmando a orientação aprovada na Conferência Nacional Extraordinária 07 de março (e orientação reafirmada por todas as reuniões DN desde essa data) tinha apenas um objetivo: colocar em questão os votos da maioria da conferência em 7 de março, impugnar a orientação adotada que proporcionou um plano detalhado para a construção do Congresso do POI. Estando em minoria, eles precisavam inventar algo, acusar a direção da CCI de negar-se à discussão, de negar o direito de tendência. Mas, tudo isso tem um único propósito, impugnar uma decisão tomada legitimamente pela maioria.

Quais seriam os objetivos desta operação? Por conta do que combinação? O futuro nos dirá rapidamente. Mas alguém nos dá uma pista: último 15 de julho, o jornal “Le Monde” o chamado Noblecourt dedicou um editorial para zombar com desdém da “guerra ridícula e enigmática que está sendo travada dentro da corrente lambertista” e, involuntariamente, fazendo uma confissão: A confissão de que a corrente “lambertista” conta com muitas relações importante no movimento operário em FO(1) mas não somente em FO e, consequentemente, uma explosão do “lambertismo” pode interessar ao Senhor Noblecourt, apoiador convicto da CFDT(2), do diálogo social e de certo modo de corporativismo. Conhecemos sua orientação e percebemos que ele tem um “sonho”, o sonho de muitos, no momento em que este governo debilitado por uma crise profunda, no momento em que está criando todas as condições de maturação de ações de classe de uma amplitude sem precedentes, o “sonho” do desaparecimento do “lambertismo”.

Mas Noblecourt sabe que o “lambertismo” tem uma peculiaridade: ele é parte constitutiva do movimento operário na França. Minoritário ou majoritário, essa não é a questão. A questão não é o seu lugar e peso em diferentes organizações. Mas, como todos sabem que pela sua história, pela sua experiência adquirida na luta de classes, a corrente “lambertista” é um elemento que vertebra a resistência da classe na linha de defesa da independência de classe e das organizações e da luta pela frente única.

Desse ponto de vista, é útil organizar uma campanha de difamação, uma campanha para tentar facilitar a operação para expulsar os militantes dessa corrente. Mas isso, camaradas, é outra questão.

Eu acho que, neste momento, temos de prestar homenagem ao camarada Lambert. Ele conseguiu o objetivo que havia estabelecido: tirar o trotskismo do gueto; compromete-lo; implantá-lo; torná-lo um elemento constitutivo da classe operária, de seu movimento. Eu acredito que aqueles que optam por dar uma ajuda na operação contra a corrente “lambertista” vão experimentar a solidez que foi forjada ao longo de sua existência, em sua história, e que é a sua tradição.

No “Manifesto de alarme”, adotado em 26 de maio de 1940, em uma situação dramática, Trotsky escreveu: “A Quarta Internacional afirma-se completa e resolutamente na tradição revolucionária do bolchevismo e seus métodos de organização. Deixemos que os radicais pequeno burgueses reclamem contra o centralismo. Nenhum operário que tenha participado, ainda que seja uma única vez, de uma greve sabe que nenhuma luta é possível sem disciplina e sem direção firme. É essencial tem uma organização da vanguarda proletária soldada por uma disciplina de ferro, uma verdadeira seleção de revolucionários inspirado por uma vontade indomável de vencer. Preparar a ofensiva cuidadosamente e sistematicamente e, quando soar a hora decisiva, jogar todas as forças de classe ao campo de batalha sem vacilar. Isso só pode ser ensinado aos operários, por um partido centralizado e que, ele mesmo, não hesite”.

Só mais uma palavra, a propósito das autoridades intelectuais sem escrúpulos que se apressam a se apresentar – manipulando maldosamente a comparações –  como vítimas de práticas semelhantes às da burocracia stalinista. A esses, Trotsky responde: ” Há Alguns superficiais e céticos que se encantam em nivelar a degeneração do centralismo bolchevique ao burocratismo. Como se todo o curso da história dependesse da estrutura de um partido. Na verdade, é o destino do partido que depende do curso da luta de classes. Mas, em qualquer caso, foi o partido bolchevique o único partido que se mostrou na ação capaz de realizar a revolução proletária. O que, hoje, o proletariado mundial necessita é precisamente de um partido assim”.

Para concluir, eu gostaria de oferecer a resposta a uma pergunta que Trotsky dá a uma pergunta que todos nós já fizemos alguma vez“: Será que vamos conseguir formar a tempo um partido capaz de liderar revolução proletária? “

Trotsky respondeu:” Para responder a essa pergunta corretamente, você tem que colocá-la corretamente. Naturalmente, uma ou outra revolta pode acabar, e certamente irá terminar, em derrota devido à imaturidade da direção revolucionária. Mas não é uma simples revolta. Trata-se de todo um período revolucionário”.

Por isso, camaradas, eu acho que, nesse momento, nessa homenagem que rendemos a Trotsky, no 75º aniversário do seu assassinato, nos dá nosso “mapa do caminho”. Nossa confiança no que nós aprendemos com Pierre Lambert é total. A seção francesa da IV Internacional está viva. Ela vira as costas para a pregação prepotente das eminências autoproclamadas. Construirá – em diálogo com os militantes operários que se incorporam hoje na preparação do combate entre as classes – o Partido que necessitamos para ajudar a classe operária a garantir a vitória da revolução proletária.


 

Discurso de Lucien Gauthier

Camaradas,

Estamos aqui hoje para afirmar a continuidade do movimento operário revolucionário, aquele de Lênin, de Trotsky, de Léon Sédov. E homenagearmos igualmente Pierre Lambert nestes momentos de ofensiva contra a Quarta Internacional.

Estamos aqui para afirmar a continuidade do bolchevismo. Essa corrente revolucionária nascida no partido russo em 1903 quando, durante o Congresso do Partido Operário Socialdemocrata da Rússia, se produziu uma cisão que reagrupou os revolucionários russos. Uma cisão que, na aparência, não ocorreu por razões políticas, porque neste Congresso havia acordo sobre as grandes orientações, havia um acordo afirmado sobre as posições políticas. A cisão se produziu pelo artigo 1 dos estatutos, quando o dirigente deste partido, Martov, apresentou um projeto indicando essencialmente o seguinte: é membro do partido aquele que coloca em ação sua política; Lênin lhe opôs a seguinte emenda: é membro do partido aquele que participa dos organismos do partido e contribui financeiramente.

Não foi por acaso. Um ano mais cedo, em 1902, em Que fazer? Lênin estabeleceu o lugar do jornal na construção do partido revolucionário, o lugar de uma organização delimitada: não um partido que abarca tudo, mas um partido organizado, um partido operário revolucionário.

Durante o Congresso de 1903, o voto foi: 19 para Lênin, 17 para Martov. Na mesma noite, como contou Lênin, os dirigentes da minoria organizaram redes paralelas, máquinas de guerra contra o partido, fizeram A Nova Iskra, contra o jornal do partido. Foi a ofensiva contra o partido revolucionário. Não há nada de novo sob o sol. A revolução, os revolucionários continuam, a ofensiva contra o movimento operário revolucionário continua. E os mesmos indivíduos hoje, com uma ironia e um desprezo condescendente, chamam a direção francesa de “os majoritários”.

Não. Existe uma seção francesa, existe sua direção.

Mas, sim: retomaremos o título de “majoritários” porque, em 1903, designava os bolcheviques (que na Rússia quer dizer “majoritários”) partidários de Lênin que obtiveram a maioria. Minoritários vem da palavra russa “mencheviques”. E nós somos os “majoritários” porque somos os bolcheviques, aqueles que asseguram a continuidade do combate do movimento operário revolucionário.

Aparentemente, não existia desacordo político em 1903. Existia, sabe-se, por trás das questões de organização, grandes desacordos políticos. Foi preciso esperar uma dezena de anos para que os mencheviques capitulassem clara e abertamente diante da burguesia. Foi preciso a vaga revolucionária de outubro de 1917 para que os mencheviques chegassem ao governo para defender a ordem burguesa na Rússia.

Mas não estamos mais em 1917. Estamos em 2015. A crise agonizante do capitalismo é tamanha, a decomposição imperialista é tamanha, a marcha em direção à barbárie é tamanha que tudo acontece aceleradamente. E, aqueles que hoje rompem com o bolchevismo não levaram mais que alguns meses para desvelar o verdadeiro conteúdo de sua política, hostil ao bolchevismo e ao movimento operário revolucionário. Nós continuamos fiéis a este combate de Lênin, à necessidade de construir um partido bolchevique.

Vocês sabem, camaradas, nós celebramos por meio dessa manifestação essas gerações que se sucedem e que constituem uma longa corrente de militantes revolucionários que constituíram o movimento operário e o movimento operário revolucionário. E, para nós, militantes trotskistas da França, um desses elos essenciais é o camarada Pierre Lambert. Jovem operário que participou da reconstrução da CGT clandestina durante o período de ocupação nazista, ele tirou daí a compreensão de que não se constrói um partido por uma série de fórmulas mágicas, mas “por baixo, por baixo”, como gostava de dizer. Por baixo com os operários, por baixo nos diálogos, nas organizações da classe operária. É, então, natural que, saído da guerra, membro da direção da seção francesa, ele se torne responsável pela comissão sindical, quer dizer, pelo trabalho minucioso de organizar o trabalho dos trotskistas na classe operária. E, durante esse tempo, os “grandes chefes” da Quarta Internacional, os grandes chefes do PCI ( sigla do Partido Comunista Internacionalista, nome da seção francesa à época, nota do tradutor) discursavam, escreveram editoriais, comunicados, panfletos, cartas abertas para indicar à classe o que ela deveria e como fazer, através de algumas palavras de ordem.  Pois esses mesmos indivíduos, esses mesmos “grandes chefes” da Quarta Internacional, perceberam muitos anos depois que a classe operária não foi se juntar a eles, que sua posição não a conduziu até eles; eles se desmoralizaram, se indignaram e, inevitavelmente, procuraram caminhos diferentes, sempre acusando a classe operária de ser atrasada politicamente, de ser estalinista espontaneamente. Estes tentaram organizar o aniquilamento da Quarta Internacional tomando uma pretensa política de entrismo nos partidos stalinistas, para “empurrar a burocracia para a esquerda”. Não foi à toa, camaradas, que foi a comissão sindical dirigida por Pierre Lambert que se opôs a esta política de aniquilamento. Não foi à toa que esses militantes começaram a se implantar na classe. E eles se tornaram majoritários na seção francesa. Sim, nós somos também os herdeiros dessa maioria da seção francesa que organizou o combate contra o pablismo, o combate pela reconstrução da Quarta Internacional.

Alguns anos mais tarde, quando a seção francesa, isolada, enfraquecida, reagrupou 52 militantes, o camarada Lambert fez algo decisivo para nós. A organização trotskista de 52 membros publicou uma revista, A Verdade, que teve problema financeiro, pois não correspondia às forças dos 52 militantes, que representava ser um resquício de um passado em que os militantes acreditavam que nós éramos o partido porque nossa orientação era justa. Ele disse: paremos. Vamos lançar um boletim.

Estávamos no ano de 1958. Esse boletim foi Informações Operárias. O camarada Lambert definiu o primeiro critério: “Quem quer me ler deve pagar”. Quer dizer, a independência financeira do jornal, garantia da independência política. Depois, ele definiu o caráter desse jornal ao dizer: “é um jornal feito por trotskistas, e é uma tribuna livre da luta de classes”. Essa concepção que tinha Pierre Lambert, que nos levou a formular essa orientação e, em nosso jargão, chamamos de política de transição em matéria de construção do partido, é indissociável da história de Informações Operárias como tribuna livre da luta de classes. Em toda sua vida, o camarada Lambert trabalhou por essa política.

Em 1964, ocorreu o apelo dos 150 militantes operários de Nantes. Eram anarco-sindicalistas, sindicalistas, militantes políticos, militantes trotskistas. Foi a via da constituição de um agrupamento, para sair da situação em que “somos os exilados em nossa própria classe”, segundo as palavras de Trotsky, nos anos de 1930; foi o início do combate na classe, com os militantes operários, com os trabalhadores. Essa mesma orientação se traduziu, em seguida, sob outras formas: os comitês de aliança operária, e toda uma série de outras formulações. Foi a permanência, em Lambert, da busca pelas vias e os meios de ajudar a classe a se organizar e reagrupar suas forças.

Lambert dizia correntemente: vou reler o que disse Lênin sobre o assunto. Não para buscar o dogma, mas para buscar nas diferentes posições de Lênin em diferentes momentos, o que poderia nos ajudar a formular, em um dado momento, uma política adaptada. Não existe dogma. A teoria não é um dogma, é um guia para a ação. Dizemos que somos os herdeiros do combate de Pierre Lambert. Sim, herdamos da camarada Pierre Lambert a organização e Informações Operárias. Informações Operárias hoje é o órgão do Partido Operário Independente, mas continua a ser a tribuna livre da luta de classes. Porque não partilhamos a concepção de alguns, a ideia de um partido autoproclamado, como a dos chefes da Quarta Internacional do pós-guerra que pensavam que as massas nos seguiriam porque tínhamos posições justas. Não, essa não é nossa concepção. Estamos numa situação onde revolução e contrarrevolução se confrontam. Estamos em uma situação complexa e contraditória, em que a classe operária leva golpes ao mesmo tempo em que procura resistir; onde revoluções se produzem, onde as contrarrevoluções e as guerras se produzem. Estamos em uma situação onde existe um rechaço aos partidos como produto da traição. Estamos numa situação onde a classe operária, em cada país, busca se apegar a suas organizações e seus sindicatos.

E, por que agarra-se aos sindicatos? Porque os sindicatos são uma organização operária particular.

O sindicato, qualquer que seja a política de sua direção, é a materialização da divisão da sociedade em classes, porque somente o sindicato organiza os trabalhadores. É por isso que Trotsky disse: os sindicatos são uma instituição operária, são os germes da democracia operária na sociedade burguesa. Um sindicato operário independente é contraditório com o sistema capitalista, mas o capital, que busca permanentemente questioná-lo seja pela repressão ou pela integração corporativista (aqui, o sentido do termo “corporativista” é o de integração capital-trabalho num único corpo, nota do editor) , é forçado, pela luta de classe, a aceitar sua existência.

Camaradas, com dezenas de milhares de militantes operários, que não são trotskistas, que não são militantes do POI, lutamos para defender a independência das organizações, não por dogma, mas porque sem organização a classe não é nada. Porque a classe tem necessidade de suas organizações, porque os militantes que lutam pela defesa da independência da classe operária e de suas organizações são os mesmos que organizam, enquadram a classe operária em todos os níveis da organização.

Essa é a nossa orientação, camaradas. Uma parte desses militantes estão prontos para integrar o Partido Operário Independente, mas muitos dentre eles não estão, não nesta etapa. Devemos fechar a porta para eles? Ou, ao contrário, devemos compreender que o jornal Informações Operárias (como disse o camarada Gauquelin, em 06 de junho) é um quadro flexível de organização que liga os militantes do POI a estes militantes operários que não são seus membros?

Porque é nosso jornal, sim. Mas é também o jornal deles. O jornal daqueles que escrevem em Informações Operárias, daqueles que o leem e daqueles que o vendem. É o jornal do aparelho político da luta. É o jornal daqueles que se agrupam para ajudar a classe operária em seu movimento, em dado momento dos processos revolucionários, a ultrapassar os obstáculos, a quebrar a resistência contrarrevolucionária. É porque o Informações Operárias é o jornal do POI e a tribuna livre da luta de classes.

É com eles que o faremos, camaradas. E foi essa rede que nós constituímos. É esse quadro que nós constituímos. Apenas os pequeno-burgueses inveterados podem repetir formulas de estilo sobre “o partido diz”, “o partido faz”. O sol está atrás de mim, mas não me pareço com Mao Tse-Tung ( chefe de governo e dirigente Partido Comunista Chinês, nota do editor). Havia um cartaz de Mao com o sol vermelho como tela de fundo, Mao apontando o dedo para indicar às massas chinesas para onde elas deveriam ir. Essa não é nossa concepção.

Nossa concepção é aquela inscrita na capa de Informações Operárias: “A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”. É nossa concepção, camaradas, e é efetivamente aí que se encontra a razão da ofensiva contra a Quarta Internacional. Porque nós existimos como parte integrante da classe operária, porque nós não somos exilados em nossa classe, porque nós ocupamos posições e porque somos, com nosso jornal, o ponto de ligação de milhares de militantes operários, que não são trotskistas, que não estão no POI, mas que se servem desse quadro para o combate, para agir. E isso a burguesia não pode aceitar, no momento em que quer integrar as organizações sindicais.

Nós os conhecemos os discursos radicais, as pregações, as orientações, etc. Não, camaradas. Não estamos fora do movimento operário. Estamos no movimento operário, combatemos nas organizações. É a nossa classe. E não estamos de fora para poder dar conselhos. Estamos no interior. Somos uma corrente legítima do movimento operário. E é o longo combate de Trotsky e de Lambert que levou a esse resultado na França, e do qual nós temos  orgulho. A delimitação, a defesa da Quarta Internacional não procede, como nos aparelhos políticos, por questões de balcão. A defesa da Quarta Internacional, para nós, está ligada diretamente aos interesses da classe operária. Porque não estamos fora da classe operária.

E hoje, camaradas, a retomada do calendário letivo se anuncia. Não somente o ano escolar, mas o trabalho em geral. As questões políticas ressurgirão.  As férias acabaram, infelizmente. E uma situação está em vias de se abrir. Sabemos que há uma ebulição. Sabemos que há movimentos de classes parciais que se procuram. Não somos como os cretinos que dizem de cima: sim, mas não há nada, a situação está tranquila. Sabemos que isso ferve. O que não quer dizer que vai explodir amanhã. Mas sabemos que caminhamos para os enfrentamentos de classe. Em que condições podemos abordá-los? Com quais forças agrupadas em torno de Informações Operárias? Com quais forças agrupadas na Quarta Internacional? Com quais forças recrutadas no POI? Isso vai depender da orientação segundo a qual agiremos, com Informações Operárias no centro.

Eu acrescentarei uma coisa: há aqui, camaradas, militantes que venderam Informações Operárias em 1958 e 1959 e eu os saúdo. Há camaradas que venderam o jornal nos anos 1960. Outros, mais numerosos, nos anos 70. E outros nas décadas seguintes.

As antigas gerações e as novas, e a fusão dessas gerações, são a Quarta Internacional. Para parafrasear Trotsky a propósito da Quarta Internacional, eu diria que Informações Operárias é “nossa pátria no tempo”. É a marca de fábrica da Quarta Internacional. É a marca de fábrica da seção francesa. E não mudamos de nome como se muda de camisa. Salvo se estamos prestes a virar a casaca.

Camaradas, para concluir, e paro por aqui: o tempo agora chegou, o tempo nos é importante porque para a luta de classes conta o tempo. Quando existe um obstáculo, é preciso ultrapassá-lo. Nós iremos ultrapassá-lo. Nós iremos superá-lo. Nós assim o decidimos porque essa é a responsabilidade da seção francesa e que o conjunto de seus militantes colocam, desde agora, em ação. Nós discutimos muito, e continuaremos a discutir porque somos uma organização democrática.

Mas, talvez tenhamos mais discutido do que agido. Vamos agir, mais do que discutir. Nós decidimos, vamos superá-la.

Viva a Quarta Internacional!

Legendas:

  • FO: “Force Ouvrière” Força Operária- nome comum da Confederação Geral do Trabalho – Force Ouvrière (CGT-FO), confederação fundada em 1947. Terceira maior Central na França
  • CFDP: A CFDT Confederação Francesa Democrática do Trabalho – Central de orientação Cristã (de direita) .

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