Para entender a ofensiva em curso contra Lula e o PT

Esse artigo foi escrito em 2 de março, antes dos acontecimentos de hoje – 4 de março . Ele está publicado na edição nº 781 do jornal O Trabalho. Em nossa opinião, explicam a relação que existe entre as decisões da reunião do Diretório Nacional do PT de 26 de fevereiro e que conclusões tiraram os que comandam a ofensiva contra Lula e o PT e aplicadas por um judiciário que nada mais é que um instrumento dessa política. 

PT apresenta programa de emergência

Lula candidato em 2018: “agora é pão, pão, queijo, queijo!”

Reunido no Rio de Janeiro no 36o aniversario do PT, o Diretório Nacional (DN) tomou decisões que – dependendo de dar seqüência – podem ser históricas. Ao adotar um “programa de emergência” (resumo abaixo), o PT passa a ter uma plataforma própria, distinta da do governo, pela primeira vez em 13 anos. O DN decidiu uma campanha em defesa do pré-sal ameaçado pelo projeto aprovado no Senado com apoio do governo, e ainda adotou uma  moção pelo veto de Dilma à lei antiterrorismo. Em seguida, na festa de aniversário, Lula praticamente se lançou candidato a presidente em 2018, desafiando  juízes, procuradores e a mídia. Reafirmou alguns compromissos com o povo e a soberania, e concluiu assim: “Daqui pra frente, é pão, pão, queijo, queijo. Lulinha não vai ser mais Lulinha paz e amor!” A imprensa e a oposição que já discutiam o descolamento do PT do governo, rebateram as medidas de emergência que destoam dos anúncios do Planalto (v. pág. …). E reagiram raivosamente à fala de Lula. O editorial do Estadão (01/03) avaliou que assim  “Lula abandona de vez apretensão de ser a ponte entre o capital e o trabalho.” Exagero?

Um passo…

É uma situação extrema e dramática. O governo eleito pelo PT ataca a sua base social, cuja condição de vida declina. A oposição começou a votar alguns projetos do governo, mas segue com os atos pelo impeachment. As pesquisas mostram a queda da preferência pelo PT – há casos de hostilidade em porta-de-fábrica -, mas é ainda o partido mais popular. Lula vê cair as intenções de voto, embora ainda esteja bem colocado. É nesse cenário que a direção do PT reagiu com um passo. Limitado mas importante. Ajuda a organizar a resistência – a CUT com as frentes e entidades convocam uma Marcha a Brasília no dia 31, de fato contra a política econômica – e abre um debate fundamental, ao convocar com o programa de emergência uma “Conferencia sobre Política Econômica”, precedida de plenárias com a militância nos diretórios para “popularizar e aperfeiçoar as propostas”. Também é importante que a resolução de Conjuntura afirme que “a luta séria contra a corrupção institucional e disseminada, requer uma mudança em profundidade do funcionamento das instituições do estado, através de uma reforma política democrática que deveria ser objeto de uma Constituinte especifica”.

…os próximos passos

Apresentando ainda outros pontos (abaixo), no DN votei no programa de emergência porque é progressivo. Denuncia que “a renda financeira, remunerada por juros elevadíssimos pressiona o superávit das contas públicas como fator fundamental para a segurança de sua rentabilidade”. Diz que “desonerações e isenções vigentes beneficiaram diversos grupos de empresas, devem ser amplamente revisadas”. Nega claramente o abandono da lei do salário mínimo e das despesas obrigatórias, defende o pré-sal e a posição dos sindicatos no tema da previdência. As 22 medidas propostas são um programa de arrecadação para investir, gerar emprego e consumo. Não para fazer superávit fiscal para pagar juros aos bancos (de fato abandonado como critério de política econômica ), ou para dar garantia cambial aos especuladores como quer o capital internacional. Todavia, ele precisa ser desenvolvido para sustentar-se. Por exemplo, ele admite “atravessar alguns anos de aumento programado e transparente da dívida interna, desde que o destino de novos déficits seja a recuperação econômica do país”. Ora, por que o mercado que exige superávits, aceitaria agora “anos” de déficits com a baixa dos juros, sem provocar a fuga de capitais aqui vindos especulativamente? Essa é razão para uma intervenção pública com controle de capitais rumo á centralização do câmbio. Senão, a manipulação dos grandes especuladores inviabilizará o uso das reservas cambiais para investimento, assim como uma política industrial soberana ou a proteção comercial. Então, sem querer resolver tudo agora nem neste artigo, é preciso falar claro pelo menos sobre o fim do superávit e a intervenção no câmbio para preparar o povo e a nação – definitivamente, não estamos frente a uma “marolinha”. Um apoio às 22 medidas será encontrado nas organizações sindicais e populares. Mas o realismo evidencia um choque com “ponte para o futuro” do PMDB – não tem como manter a aliança esdrúxula – realismo que faltou na resolução do DN sobre as eleições de 2016 que é mais do mesmo, “defesa do legado” e da “base aliada”. A discussão continua. Há 5 meses, o Diálogo e Ação Petista lançou um Manifesto de Alarme que alertava: ou Dilma muda de política econômica, ou o PT deve mudar a relação com ela. Ela ainda não mudou. Mas relações parece que começam a mudar um pouco.

Markus Sokol


“Dobrar a aposta”

O documento “O futuro está na retomada das mudanças”, votado por unanimidade no DN, resumidamente, propõe: (…) “Dobrar a aposta na opção adotada pelo presidente Lula, com mais investimento público, mais desenvolvimento industrial, mais mercado interno, mais integração regional, mais políticas públicas, mais salário e emprego. Muitas das medidas elencadas dependem de aprovação parlamentar; outras são de livre arbítrio do Poder Executivo. Em ambos casos, a viabilidade do programa apresentado pressupõe a reunificação do campo progressista ao seu redor, intensa batalha político-ideológica, potente mobilização social e amplas alianças com setores democráticos dispostos a apoiar opção dessa natureza, incluindo o comprometimento do governo da presidenta Dilma. O desenlace dessa discussão, em âmbito interno, está na convocação de uma Conferência sobre Política Econômica, a ser realizada proximamente, sob a direção da Comissão Executiva  Nacional do PT, precedida por plenárias com a militância e os militantes sociais, que sejam capazes de popularizar e aperfeiçoar as propostas apresentadas. Também levaremos as medidas aqui listadas ao debate na Frente Brasil Popular, além dos partidos e movimentos aliados.

Programa Nacional De Emergência (alguns dos principais pontos):

1.Forte redução da taxa básica de juros como elemento fundamental para diminuir o déficit nominal da União, aumentar o investimento público, impedir a apreciação cambial, baratear o crédito e incentivar a retomada do crescimento . 2.Utilização de parte das reservas internacionais para um Fundo Nacional de Desenvolvimento e Emprego, destinado a obras de infraestrutura, saneamento, habitação, renovação energética e mobilidade urbana. 3.Ampliação do Programa Minha Casa, Minha Vida 8.Retomada da reforma agrária, com prioridade imediata à distribuição de terras para trabalhadores acampados. 10.Tributação de juros sobre capital próprio, com a revogação do benefício fi scal 11.Tributação sobre lucros e dividendos, eliminando isenção de Imposto de Renda 12.Adoção de regime progressivo para o Imposto Territorial Rural sobre propriedades improdutivas. 13.Extensão do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para barcos e aviões. 14.Adoção de Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) 15.Revisão da tabela do imposto de renda sobre pessoas físicas, com aumento do piso de isenção e ampliação progressiva das faixas de contribuição. 16.Aumento do imposto sobre doações e grandes heranças 17.Fim da isenção de contribuição previdenciária dos exportadores agrícolas e das entidades filantrópicas”

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