Quem acredita no Bolsonaro democrata?

Bolsonaro foi contido? Isso é o que muitos dizem, depois da nota de recuo divulgada pela Presidência em 9 de setembro, um texto redigido por Michel Temer. A operação mostrou mais uma vez as instituições e os políticos golpistas trabalhando para preservar o presidente genocida até 2022.

Não se apagam, porém, as palavras de Bolsonaro nos atos do dia 7, em São Paulo e em Brasília, convocados em clima golpista. “Só saio preso, morto ou com vitória. Quero dizer aos canalhas que eu nunca serei preso”, vociferou na avenida Paulista. As frases não têm lógica, como muitas das idiotices que ele fala, mas o sentido é claro: quem manda sou eu e faço o que quiser.

Referindo-se ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao ministro Alexandre de Moraes, disse: “Ou o chefe desse Poder enquadra o seu ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos”. Falou ainda que “qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá”. E, para não deixar dúvidas, afirmou que aquele ato era “um ultimato para todos que estão na praça dos Três Poderes”.

Dois dias depois, na nota, surge um Bolsonaro subitamente democrata: “Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. (…) Por isso quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum”. Ninguém acredita nisso, mas há interesse de muitos em dizer que são palavras sinceras.

“Com Supremo, com tudo”
Há uma linha de continuidade entre o golpe de 2016 que derrubou Dilma, “com Supremo, com tudo”, e o esforço de evitar uma queda do governo agora, quando a situação do povo se torna cada vez mais dramática e o governo despenca em popularidade. Bolsonaro não tem outra política a não ser o golpismo. Mas, chamado às falas, pode interpretar o papel de ponderado. Até o próximo ataque.

Houve um esforço de dizer que tudo voltava ao normal. A reação do presidente do STF, Luiz Fux, aos discursos do dia 7, não passou da declaração de que o Supremo “jamais aceitará ameaças”. Não esboçou qualquer medida efetiva contra o presidente. O Congresso Nacional igualmente se mostrou omisso.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse desejar que “a carta do presidente seja uma oportunidade de recomeço de conversas para estabilização da política”. O presidente da CPI da covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que a carta é louvável, se for “genuína”. A quem querem enganar?

Para o “mercado”, não há problema em manter Bolsonaro no seu cercadinho, desde que os negócios prosperem. Para outros, na oposição, a tática genial é deixar Bolsonaro sangrar até terminar seu governo esgotado, sem possibilidades de se reeleger.

Quem não pode esperar até 2022 é o povo. São quase 600 mil mortes em razão da pandemia, índices de desemprego e de miséria em alta, as condições de vida piorando de forma insuportável, além da intimidação e dos ataques à democracia. Tirar já Bolsonaro e seus generais do governo é uma necessidade em legítima defesa da maioria da população.

Cláudio Soares

Artigos relacionados

Últimas

Mais lidas