Na reforma política o mínimo é ‘Um Homem, Um Voto’

“Do jeito que está não dá mais prá continuar”

Há um sentimento de que uma reforma política é necessária, pois facilitaria reformas populares e, afinal, como dizem muitos militantes, inclusive parlamentares petistas, “do jeito que está não dá mais pra continuar”. Ninguém agüenta mais quatro anos de cantilena “não temos maioria no Congresso” para adotar medidas essenciais.

Mas uma reforma política para contemplar as aspirações populares de justiça social e soberania nacional, tem que garantir um mínimo.

E sem querer esgotar a questão, na democracia, o mínimo é respeitar a regra “um homem, um voto”, estabelecendo:

  • a proporcionalidade da representação popular,
  •  uma assembléia de parlamentares unicameral (fim do Senado antidemocrático),
  • o voto em lista partidária,
  • o fim do abuso do poder econômico.
  • O “Pacote de Abril” da Ditadura

O documento da liderança do PT na Câmara (Repertório da Reforma) confirma que “é a proporcionalidade rigorosa que assegura o princípio democrático a cada eleitor um voto”. E lembra a origem da distorção atual: “os constituintes de 1988 acolheram e radicalizaram um dispositivo do Pacote de Abril de 1977. Estabeleceram que a cada unidade da federação cabe, no mínimo, 8 deputados. E, no máximo, 70 deputados”. Assim, explica o Repertório, um Estado como São Paulo tem 70 deputados quando teria direito proporcional a 111, mas Roraima tem 8 quando deveria ter 1, o Amapá tem 8 quando deveria ter 2, e assim por diante.

Com razão, a bancada do PT votou contra a Constituição de 88, que preservava várias instituições herdadas da ditadura militar, a qual, na década anterior, havia fechado o Congresso no famoso “pacote de abril”, para reconstituí-lo nesta forma antidemocrática.

O resultado 34 anos depois, diz o Repertório, “faz com que as campanhas eleitorais fiquem cada vez mais caras, se constitui num estímulo à corrupção, a multiplicação de siglas partidárias desprovidas de conteúdo, a permissividade no que diz respeito às alianças, um estímulo ao surgimento de siglas de aluguel”.

Então, se hoje se abre uma discussão da reforma política, o PT, a CUT e a entidades populares, não deveriam perder a oportunidade de levantar os eixos de uma reforma democrática.

Todavia, a proposta que está sendo encaminhada até aqui, destaca quatro pontos – financiamento público de campanha, fidelidade partidária, proibição de coligações legislativas e voto em lista, além da facilitação das consultas (plebiscito e referendo) – com muitos companheiros admitindo ficar em dois, se não for só um ponto, o financiamento para “baratear” as campanhas.

Não se fala de proporcionalidade, nem do atual Senado, por exemplo!

Por que? Porque para mexer na Constituição não se pode contar com 2/3 desse Congresso, recheado de partidos de aluguel, e onde 50% dos parlamentares são empresários (dados do DIAP)?

 

“CONSENSO” COM QUEM?

Uma reunião de lideranças do PT com Lula concluiu com “senso de realidade, não há consenso entre os partidos para aprovar mudanças na Constituição que exigem maioria qualificada na Casa. O objetivo é começar a discussão a partir dos pontos de consenso” (OESP, 19.4.11).

É o caso de perguntar que reforma se fará em “consenso” com Sarney e Temer, do PMDB, mais o PSDB, o DEM e outros? A proposta em debate não estabelece a proporcionalidade ‘um homem, um voto’, não questiona o Senado e nem o abuso do poder econômico que o financiamento público não resolve.

Por que? A ambição do PT seria maquiar as instituições? Vamos só “baratear” a eleição – em quanto, em 10% ou 25%?

 

ALTERNATIVA CONSTITUINTE

A questão da representação popular é muito séria para ser tratada assim. Se o atual congresso não é capaz de fazer uma verdadeira reforma, então que se levante uma verdadeira Assembléia Constituinte.

Isso não pode ser um tabu. Está aí história da luta do povo brasileiro, e estamos todos vendo a força renovada dessa bandeira nos levantes populares no Norte da África, por exemplo.

Finalmente, uma reforma política mínima, digna desse nome, depende da mobilização popular. E os homens e mulheres deste país, a juventude, os trabalhadores e setores oprimidos da cidade e do campo, vão se interessar por uma reforma política se virem as suas condições de vida envolvidas na questão. Quer dizer, integrando a luta pelos direitos sociais e por reformas populares, como a reforma agrária, a recuperação do patrimônio privatizado e o fim do superávit para pagar a dívida, entre outros.

O PT tem, com o governo da presidente que elegeu pela terceira vez, junto com a CUT, sindicatos, movimentos sociais e democráticos, tem a força para vencer essa dura batalha, à condição de voltá-la para as grandes maiorias.

São Paulo, maio de 2011

Carta da Corrente O Trabalho do Partido dos Trabalhadores, 18 de maio de 2011

NOTAS

PERIGOSA “INICIATIVA POPULAR” – Uma coalizão de ONGs (ABONG, REBRIP, MNDH etc.) apresenta a Iniciativa Popular de Reforma Política que, na verdade, seria uma reforma regressiva e antipartidária:

“Propomos que determinados temas não podem ser decididos pelos eleitos sem a participação da população, via os instrumentos de democracia direta, como o plebiscitos e referendos… As campanhas dos plebiscitos e referendos devem ter participação, na sua coordenação, das organizações da sociedade civil em pé de igualdade aos partidos…(nos quais) a expressão ‘diretório’ deve ser substituída por ‘comitê de representação’…Os filiados não elegem ‘dirigentes’, mas representantes…(com) critérios da Lei da Ficha Limpa na eleição dos membros do comitê”.

Está claro, essas ONGs querem enfraquecer os partidos num movimentismo de “representantes”, selecionados pela famigerada “ficha limpa”, e ainda querem amputar a competência dos parlamentares em nome da democracia participativa.

É uma manipulação onde as próprias ONGs controlariam tudo – mas com que mandato? Essa “Iniciativa Popular” ainda tenta, através de seminários, envolver as centrais sindicais CUT e CTB, e as fundações do PT, PCdoB, PSB, PSOL e PDT, numa “Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma”.
Nenhum partido ou central, em especial o PT e a CUT, podem entrar na arapuca!

FINANCIAMENTO – A tradição socialista defende a liberdade partidária. O financiamento público deve se destinar ao serviço público, e não a financiar e controlar partidos que devem ser autônomos. Além do que, no sistema capitalista, nenhum “financiamento exclusivo” impede quem detém a grande propriedade privada de influenciar de fato, embora a “exclusividade” possa servir para reprimir a contribuição de entidades populares e sindicatos, por exemplo.

PSBD e DEM – Assim como PPS e PV, todos em crise com a formação do PSD de Kassab, sem muitas condições, estão divididos sobre variações de voto distrital, financiamento, coligação e fidelidade.

PMDB – O mais legítimo produto da continuidade do sistema, propõe aprofundá-lo. Coligado com o PT no governo Dilma, a proposta de Temer, seu vice-presidente, e Sarney, dono do Senado, é o “distritão” – a eleição por Estado dos parlamentares mais votados, independente de quociente partidário. O ataque aos partidos, segundo a liderança do PT, “desencadearia uma disputa tão feroz, mesmo entre os candidatos de uma mesma sigla, que o mais provável é que viéssemos a assistir a encarecimento cada vez mais extravagante das campanhas”.

PSOL – O deputado Ivan Valente defende “o financiamento público exclusivo de campanha e a punição rigorosa de receptores e doadores, além da lista fechada flexível e o sistema proporcional”. Ele não diz se acredita que o Congresso o adote.

PSTU – “não espera nada desse Congresso”, mas “chama os partidos da esquerda, as entidades combativas e democráticas a uma campanha unitária contra retrocessos históricos que poderão ocorrer através desta reforma antidemocrática. Precisamos defender o financiamento público exclusivo das campanhas e a ampliação dos espaços democráticos”. Alerta contra “retrocessos”, mas propõe “ampliar espaços” que não advirão do Congresso, como?

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