A Comuna pela Comuna (2° parte): documentos do primeiro governo operário da história

Neste ano completam-se 150 anos desde a vitória dos trabalhadores parisienses que inaugurou o primeiro governo operário da história. Em homenagem aos “comunardos” (combatentes da comuna) publicaremos em três partes, uma série de documentos e decretos da própria Comuna de Paris.
Nesta segunda parte há um apelo de mulheres em defesa da Comuna, de alcance internacional pelo seu conteúdo. Há ainda um comunicado do comitê central da União de Mulheres de Paris denunciando um texto apócrifo que atribua à mulheres um pedido de paz com Versalhes.

O terceiro documento é um apelo aos camponeses produzido pela Comuna.

Na sequência dois curtos documentos mostrando a “Humanidade da comuna” em meio à guerra civil e por ultimo uma declaração ao povo francês com o “Programa da Comuna” de 19 de abril de 1871.


A COMUNA E AS MULHERES

1. Apelo às mulheres
Paris acha-se bloqueada, Paris é bombardeada…
Cidadão, onde estão nossos filhos, nossos irmãos e nossos maridos?…Escutais o canhão que ruge e o rebate que toca o cha­mado sagrado?
Às armas! A pátria está em perigo!

É o estrangeiro que volta para invadir a França? São as legiões coligadas dos tiranos da Europa que massacram nossos irmãos, es­perando destruir, com a grande cidade, até a lembrança das con­quistas imortais que, há um século, compramos com o nosso sangue e ás quais o mundo chama de liberdade, igualdade, fraternidade?

Não, estes inimigos, esses assassinos do povo e da liberdade, são franceses!

Esta vertigem fratricida que se apodera da França, este com­bate mortal, é o ato final do eterno antagonismo do direito e da força, do trabalho e da exploração, do povo e de seus carrascos!

Nossos inimigos são os privilegiados da ordem social pre­sente, todos aqueles que sempre viveram de nosso suor, que sem­pre engordaram com a nossa miséria!

Eles viram o povo se levantar, gritando: – Nenhum dever sem direito, nenhum direito sem dever! – Desejamos o trabalho, mas para guardar o produto dele! Chega de exploradores, chega de sen­hores! – O trabalho e o bem-estar para todos, o governo do povo por si mesmo – a Comuna – viver livre trabalhando, ou morrer combatendo!

E o temor de se verem chamados perante o tribunal do povo lev­ou nossos inimigos a combater a maior das maldades: a guerra civil!

Cidadãs de Paris, descendentes das mulheres da Grande Rev­olução, que, em nome do povo e da justiça, marcharam sobre Ver­salhes, levando cativo Luís XVI, nós, mães, mulheres e irmãs deste povo francês suportaremos por mais tempo que a miséria e a ig­norância façam de nossas crianças inimigos, que pai contra filho, irmão contra irmão, venham eles se entrematar sob os nossos ol­hos, pelo capricho de nossos opressores, que desejam o aniquila­mento de Paris, após a terem entregue ao estrangeiro?

Cidadãs, a hora decisiva chegou. É preciso que ela soe para o velho mundo! Queremos ser livres! E não é somente olhos postos sobre Paris, esperando nosso triunfo para, por sua vez, livrarem-se também. A própria Alemanha, cujos exércitos dos príncipes dev­astavam nossa pátria, jurando a morte às tendências democráticas e socialistas, acha-se ela mesmo agitada e trabalhada pela aragem revolucionária! Também ela, há seis meses, acha-se em estado de sítio e seus representantes operários encontram-se no calabouço! A própria Rússia não vê perecer seus defensores da liberdade senão para saudar uma geração nova, por sua vez pronta a combater e a morrer pela República e pela transformação social?!

A Irlanda e a Polônia, que não morrem senão para renascer com uma energia nova; a Espanha e a Itália, que reencontram seu vigor perdido, para se juntar à luta internacional dos povos; a In­glaterra, cuja massa inteira, proletária e assalariada, torna-se revolucionária por posição social; a Áustria, cujo governo tem de rep­rimir as revoltas simultâneas do próprio país e dos poderes eslavos, este entrechoque perpétuo entre as classes reinantes e o povo, não indica que a árvore da liberdade, fecundada pelas ondas de sangue derramadas durante séculos, por fim produziu seus frutos?

Cidadãs, a luva foi lançada; é preciso vencer ou morrer! Que as mães, que as esposas que se dizem – “Que me importa o tri­unfo de nossa causa, se tenho de perder aqueles que amo!”, per­suadam-se enfim que o único meio de salvar aqueles que lhes são caros – o marido que a sustenta, o filho em que ela deposita sua esperança – é tomar uma parte ativa na luta fratricida que não pode terminar senão pelo triunfo do povo, para não ser renovada num futuro próximo!

Desgraçadas as mães, se mais uma vez o povo sucumbir! São seus filhos, suas crianças que pagarão essa derrota, porque para nossos irmãos e nossos maridos, a sua cabeça está em jogo e a reação levará vantagem ! Clemência, nem nós nem nossos inimigos a queremos!…

Cidadãs, unidas e resolutas, velemos pela segurança de nossa causa! Preparemo-nos para defender e para vingar nossos irmãos! Nas portas de Paris, nas barricadas, nos bairros, não importa onde, estejamos prontas, ao momento dado, para juntar nossos esforços aos seus. Se os infames fuzilam os prisioneiros, assassinam nossos chefes, metralham uma multidão de mulheres desarmadas, tanto melhor! O grito de horror e indignação da França e do mundo ter­minará o que tentamos!… E se as armas e as baionetas forem todas utilizadas por nossos irmãos, restar-nos-ão ainda pedras para es­magar os traidores!

Um grupo de cidadãs
12 de abril de 1871.

2. Um protesto
Em nome da revolução social que aclamamos, em nome da reivindicação dos direitos do trabalho, da igualdade e da justiça, a União das Mulheres para a defesa de Paris e o cuidado aos feridos protesta com todas as suas forças contra a indigna proclamação às cidadãs, aparecida e afixada anteontem, emanada de um grupo anônimo de reacionários.

A referida proclamação afirma que as mulheres de Paris ape­lam para a generosidade de Versalhes e solicitam a paz a todo o preço.

A generosidade de covardes assassinos!

Uma conciliação entre a liberdade e o despotismo, entre o povo e seus carrascos!
Não, não é a paz, mas a guerra a todo transe que as trabal­hadoras de Paris vêm reclamar!
Hoje, uma conciliação seria uma traição! Seria renegar todas as aspirações operárias, aclamando a renovação social absoluta, a aniquilação de todas as relações jurídicas e sociais atualmente ex­istentes, a supressão de todos os privilégios, de todas as explorações, a substituição do reinado do trabalho pelo do capital, a libertação do trabalhador por si próprio, numa só palavra!

Seis meses de sofrimento e de traição durante o sítio, seis se­manas de luta gigantesca contra os exploradores coligados, as on­das de sangue vertidas pela causa da liberdade, tais são os nossos títulos de glória e vingança!

A luta atual não pode ter por solução senão o triunfo da causa popular. Paris não recuará, porque ele conduz a bandeira do fu­turo. A hora suprema soou. Dai lugar aos trabalhadores, para trás os seus carrascos!

Atos! Energia!

A árvore da liberdade cresce, regada pelo sangue de seus in­imigos!

Unidas e resolutas, engrandecidas e esclarecidas pelos sofri­mentos que as crises sociais sempre trazem em sua esteira, profun­damente convencidas de que a Comuna, representante dos princí­pios internacionais e revolucionários dos povos, conduz em si os germes da revolução social, as mulheres de Paris provarão à França e ao mundo que elas também saberão, no instante do perigo supre­mo – nas barricadas, nas trincheiras de Paris, se a reação forçar-lhe as portas – dar , com seus irmãos, seu sangue e sua vida pela defesa e o triunfo da Comuna, isto é, do povo!

Então, vitoriosos, unindo-se e entendendo-se sobre os seus interesses comuns, os trabalhadores e as trabalhadoras, solidários, num último esforço, aniquilarão para sempre todo vestígio de ex­ploração e de exploradores!

Viva a República social e universal!
Viva o trabalho!
Viva a Comuna!
Paris, 6 de maio de 1871.

A Comissão Executiva do Comitê Central:
Le Mel, Jacquier, Lefévre, Leloup, Dmitrieff.


A COMUNA E OS CAMPONESES

Aos trabalhadores do campo

Irmão, estão te enganando. Nossos interesses são os mesmos. O que eu peço, tu queres também; a liberdade que reclamo, é a tua. Que importa se é na cidade ou na campanha que o pão, vestuário, o abrigo, os socorros faltam àquele que produz toda a riqueza deste mundo? Que importa que o opressor tenha o nome de grande pro­prietário ou industrial? Em tua casa , como na nossa, a jornada é longa e rude e não proporciona nem mesmo o que é preciso para as necessidades do corpo. Tanto a ti como a mm faltam a liberdade, o lazer, a vida do espírito e do coração. Nós somos, ainda e sempre, tu e eu, os vassalos da miséria.

Há perto de um século, camponês, pobre jornaleiro, que te repetem que a propriedade é o fruto sagrado do trabalho e tu crês. Mas abre, porém, os olhos e olha em redor de ti; olha tu mesmo e verás que isso é uma mentira. Eis-te velho; sempre trabalhaste; todos os teus dias se passaram com enxada ou foice na mão, do al­vorecer até a noite, e entretanto não és rico, nem mesmo tens um pedaço de pão para a tua velhice. Todos os teus ganhos foram gas-tos em criar penosamente filhos que o serviço militar vai-te tomar ou que, se casando por sua vez, levarão a mesma vida de besta de carga que levaste e acabarão como tu vais acabar: miseravelmente, porque se esgotando o vigor de teus membros, não encontrarás mais trabalho; molestarás teus filhos com o peso de tua velhice e cedo te verás obrigado, sacola às costas e curvando a cabeça, a ir mendigar de porta em porta a esmola desprezível e seca.

Isso não é justo, irmão camponês, não se sentes? Portanto, vês bem que te enganam, porque, se fosse verdade que a propriedade é o fruto do trabalho, tu, que tanto trabalhaste, já serias proprietário. Possuirias aquela pequena casa, com um jardim e um cercado, que foi o sonho, o objetivo, a paixão de toda a tua vida, mas que te foi impossível adquirir, ou que não adquiriste talvez, desgraçado, senão contratando um dívida que te esgota, te rói por dentro e que vai forçar teus filhos a vender, assim que morras, antes talvez, esse teto que já tanto te custou. Não, irmão, o trabalho não dá a proprie­dade. Ela se transmite por sorte ou se ganha pela astúcia. Os ricos são ociosos, os trabalhadores são pobres – e continuam pobres. Isso é regra; o resto não é mais do que a exceção.

Isso não é justo. E eis porque Paris, que tu acusas baseado na fé de gentes interessadas em te enganar, eis porque Paris se agita, reclama, levanta-se e quer mudar a leis que dão aos ricos todo o poder sobre os trabalhadores. Paris quer que o filho do camponês seja tão instruído quanto o filho do rico, e por nada, uma vez que a ciência humana é o bem comum de todos os homens e não é menos útil para as conduzir na vida do que os olhos para ver.
Paris deseja que não haja mais um rei que receba trinta mil­hões de francos, do dinheiro do povo, e que engorde ainda sua família e seus favoritos. Paris deseja que, não se fazendo mais essa grande despesa, o imposto diminua grandemente.

Paris exige que não haja mais funções que paguem 20.000, 30.000, 100.000 francos, dando de comer a um homem, num só ano, a fortuna de diversas famílias, e que com esta economia se criem asilos para a velhice dos trabalhadores.

Paris pede que todo homem que não é proprietário não pague um só vintém de imposto; que aquele que não possui mais do que uma cosa e seu jardim também não pague nada; que as pequenas fortunas sejam taxadas levemente e que todo o peso do imposto caia sobre os ricaços.

Paris pede que sejam os deputados, os senadores e os bona­partistas, autores da guerra, que paguem os cinco bilhões de francos à Prússia, e que se vendam para isso as suas propriedades, junta­mente com o que se chama de bens da coroa, dos quais não há mais necessidade na França.

Paris pede que a justiça não custe mais nada àqueles que dela têm necessidade e que seja o próprio povo que escolha os juizes, entre as pessoas honestas da região.
Paris quer enfim – escuta bem isso, trabalhador da campanha, pobre jornaleiro, pequeno proprietário que a usura corrói, meeiro, rendeiro, fazendeiro, vós todos que semeias, colheis e suais para que o mais puro de vossos produtos vá para alguém que não faz nada; o que Paris quer, no fim das contas, é terra para o camponês, a ferramenta para o operário, o trabalho para todos.

A guerra que Paris faz neste momento é a guerra à usura, à mentira e à preguiça. Dizem-vos que os parisienses, os socialistas são repartidores”. Mas, boa gente, não vedes quem é que vos diz isso? Não são repartidores os que, não fazendo nada, vivem regala­damente do trabalho dos outros? Não ouvistes jamais os ladrões, para fazer a troca, gritar: “pega ladrão!” e escapulir enquanto pren­dem o roubado?

Sim, os frutos da terra são daqueles que a cultivam. A cada um, o seu; o trabalho, para todos.

Não mais muito ricos, nem muito pobres.

Não mais trabalho sem descanso, nem descanso sem trabalho.
Isso é possível, porque mais valeria não crer em nada do que acreditar que a justiça não seja possível.

Para isso, não é preciso senão boas leis, que se farão quando os trabalhadores deixarem de ser iludidos pelos ociosos.

E nessa época, acreditai-o bem, irmãos cultivadores, as feiras e os mercados serão melhores para quem produz o trigo e a carne e mis abundantes para todos, do que o foram jamais, sob qualquer imperador ou rei. Porque então o trabalhador será forte e bem nu­trido e o trabalho, livre dos grandes impostos, patentes e taxas, que a revolução não as levou todas, como parece bem.

Então, habitantes do campo, vós o vedes: a causa de Paris é vossa e é por vós que ela trabalha, ao mesmo tempo que pelo op­erário. Esses generais que a atacam neste momento são os generais que traíram a França. Esses deputados, que vós nomeastes sem conhecê-los, querem nos trazer de volta Henrique V. Se Paris cair, o jugo da miséria continuará sobre vosso pescoço e passará para o de vossos filhos. Ajudai-a então a triunfar e, aconteça o que aconte­cer, lembrai-vos bem destas palavras, porque haverá revolução no mundo até que elas sejam realizadas:

A terra para o camponês, a ferramenta para o operário, o tra­balho para todos.

Os trabalhadores de Paris


A HUMANIDADE DA COMUNA

1. Ao fogo a guilhotina
Quinta-feira (6 de abril), às nove horas da manhã, o 137° Batalhão, pertencente ao XI Distrito, foi à rua Folie-Méricourt; lá requisitou e tomou a guilhotina, quebrou em pedaços a odiosa má­quina e sob os aplausos de uma multidão imensa, queimou-a.
Queimou-a aos pés da estátua do defensor de Sirven e de Ca­las, do apóstolo da Humanidade, do precursor da Revolução Franc­esa – aos pés da estátua de Voltaire.
“Diário Oficial da Comuna”, 8 de abril

2. “Pão para todas as misérias…”
Os comissários de todos os quarteirões tomaram a iniciativa de uma coleta para as vítimas desta triste guerra.
Estabeleçamos a caridade republicana, chorando com os que choram e não amando menos nossos filho que o filhos daqueles que já não mais estão conosco.
A Comuna enviou pão para 92 mulheres daqueles que nos matam.
Não há bandeira para as viúvas!
A República tem pão para todas as misérias e beijos para to­dos os órfãos.
O Chefe da Segurança: Hattelain

O PROGRAMA DA COMUNA

Declaração ao povo francês
No conflito doloroso e terrível que mais uma vez impões a Paris os horrores do sítio e do bombardeio, que faz correr o sangue francês, parecer nossos irmãos, nossas mulheres, nossos filhos, es­magados sob os obuses e a metralha, é necessário que a opinião pública não seja dividida, que a consciência nacional não seja per­turbada.
É preciso que Paris e o país inteiro saibam qual é a natureza, a razão, o objetivo da revolução que se realiza. É preciso, enfim, que a responsabilidade dos lutos, dos sofrimentos e das infelicidades de que somos vítimas retombe sobre aqueles que, após haver traído a França e entregue Paris ao estrangeiro, perseguem com uma cega e cruel obstinação a ruína da capital, a fim de enterrar, no desastre da República e da liberdade, o duplo testemunho de sua traição e de seu crime.
A Comuna tem o dever de afirmar e determinar as aspirações e os desejos da população de Paris; de precisar o movimento de 18 de março, incompreendido, desconhecido e caluniado pelos ho­mens políticos que se acham em Versalhes.
Ainda esta vez, Paris trabalha e sofre pela França inteira, da qual prepara, com os seus combates e os seus sacrifícios, a regen­eração intelectual, moral, administrativa e econômica, a gloria e a prosperidade.
Que pede ela?
O reconhecimento e a consolidação da República, única forma de governo compatível com os direitos do povo e o desenvolvimen­to regular e livre da sociedade.
autonomia absoluta da Comuna, estendida a todas as locali­dades da França e garantido a cada uma delas a integridade de seus direitos, e a todo o francês o pleno exercício de suas faculdades e aptidões, como homem, cidadão e trabalhador.
A autonomia da Comuna não terá por limites, senão, o direi­to de autonomia igual para todas as outras comunas que adiram ao contrato, das quais a associação deve assegurar a unidade francesa.
Os direitos inerentes à Comuna são:
O voto do orçamento comunal, das receitas e das despesas; a fixação e a repartição dos impostos; a direção dos serviços locais: a organização de sua magistratura, da polícia interior e do ensino; a administração dos bens pertencentes à Comuna.
A escolha por eleição ou por concurso, com a responsabili­dade, e o direito permanente de controle e demissão dos magistra­dos ou funcionários comunais de toda ordem;
A garantia absoluta da liberdade individual, da liberdade e consciência e da liberdade de trabalho;
A intervenção permanente dos cidadãos nos assuntos comu­nais, para a livre manifestação de suas idéias, a livre defesa de seus interesses, garantias sendo dadas a essas manifestações pela Comuna, unicamente encarregada de vigiar e assegurar o livre e justo exercício do direito de reunião e de publicidade;
A organização da defesa urbana e da guarda nacional, que elege chefes e cuida sozinha da manutenção da ordem na cidade.
Paris não deseja nada de mais a título de garantias locais, sob a condição, bem entendido, de encontrar a grande administração central, delegada das comunas federadas, a realização e a prática dos mesmos princípios.
Entretanto, em favor de sua autonomia e aproveitando de sua liberdade de ação, Paris se reserva o direito de operar como entender, nela própria, as reformas administrativas e econômi­cas reclamadas por sua população; criar instituições próprias para desenvolver e propagar a instrução, a produção, o câmbio e o crédi­to; universalizar o poder e a propriedade, segundo as necessidades do momento, o desejo dos interessados e os dados fornecidos pela experiência.
Nossos inimigos se enganam, ou enganam o país, quando acusam Paris de querer impor sua vontade, ou supremacia ao resto da nação, e de pretender um ditadura que seria um verdadeiro at­entado contra a independência e a soberania das outras comunas.
Eles se enganam, ou enganam o país, quando acusam Paris de proceder à destruição da unidade francesa, constituída pela rev­olução, sob aclamação de representantes de nosso país, corrido, de todos os pontos da velha França, à festa da Federação.
A unidade, tal como foi imposta até o presente dia pelo im­pério, a monarquia e o parlamentarismo, não é mais do que a cen­tralização despótica, ininteligente, arbitrária ou onerosa.
A unidade política, tal como a quer Paris, é a associação vol­untária de todas as iniciativas locais, o concurso espontâneo e livre de todas as energias individuais com vistas a um objetivo comum: o bem-estar, a liberdade e a segurança de todos.
A revolução comunal, começada pela iniciativa popular de 18 de março, inaugura uma nova era de política experimental, posi­tiva, científica.
É o fim do velho mundo governamental e clerical, do mili­tarismo, do funcionalismo, da exploração, da agiotagem, dos monopólios, dos privilégios, aos quais o proletariado deve a sua servidão, a pátria as suas desventuras e seus desastres.
Que esta grande e querida pátria, enganada pelas mentiras e pelas calúnias, se tranqüilize, portanto!
A luta engajada entre Paris e Versalhes é daquelas que se não podem terminar por compromissos ilusórios: a solução não saberia ser duvidosa. A vitória, perseguida com uma indomável energia pela guarda nacional. ficará com a idéia e com o direito.
Apelamos para a França!
Advertida de que Paris em armas possui tanta calma quanto bravura; que ela sustenta a ordem com tanta energia quanto entu­siasmo; que se sacrifica com tanta razão quanto heroísmo; que não se armou senão por devotamento à liberdade e pela glória de todos, que a França faça cessar este sangrento conflito!
É à França que cabe desarmar Versalhes, pela manifestação solene de sua irresistível vontade.
Chamada a beneficiar-se de nossas conquistas, que ela se de-clare solidária com nossos esforços; que ela seja nossa aliada neste combate que não pode acabar senão pelo triunfo da idéia comunal ou pela ruína de Paris!
Quanto a nós, cidadãos de Paris, temos a missão de realizar a revolução Moderna, a maior e a mais fecunda de todas as que ilu­minaram a história.
Temos o dever de lutar e de vencer!

A Comuna de Paris.
Paris, 19 de abril de 1871.

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