Desde 4 de fevereiro os servidores municipais de São Paulo estão em greve pela revogação da Lei n°17020/18 que instituiu a contrarreforma da previdência municipal, liderados pelo SINPEEM (sindicato de professores), o SINDSEP (sindicato geral), o SIMESP (Médicos) e outras entidades.
A reforma amplia o desconto previdenciário de 11% para 14%, configurando um “confisco salarial”, e cria o “Sampaprev”, um regime complementar para quem ganha acima do teto geral do INSS. A pauta da greve também inclui reajuste de 10% para todo o funcionalismo.
Em assembleia no dia 13, mais de 50 mil servidores municipais de diferentes áreas decidiram unanimemente pela continuidade do movimento, marcaram manifestações e nova assembleia no dia 19.
Uma luta que vem de longe
A greve é mais um capítulo da mobilização dos servidores contra os ataques a sua aposentadoria. Ainda em março de 2018 os servidores paralisaram e obrigaram o então prefeito João Dória (PSDB) a recuar, e a câmara suspendeu a tramitação da reforma.
Em dezembro o novo prefeito Bruno Covas (PSDB) voltou à carga. Com negociatas envolvendo a troca de secretários do primeiro escalão, subprefeitos e muitos cargos, ele conseguiu 33 votos de vereadores para aprovação do projeto (eram necessários 28).
Apesar dessa “vitória” do prefeito, seu recuo foi considerável. Inicialmente a contrarreforma previa o que os ditos “especialistas” da previdência chamam de “segregação de massas”, ou seja, a separação dos trabalhadores em dois fundos, um com os atuais trabalhadores e o outro com os novos.
O resultado disso seria a quebra do sistema de repartição simples, baseado na solidariedade entre gerações. O fundo com os atuais trabalhadores, sem renovação, geraria um custo adicional aos cofres públicos de R$1,5 bilhões por ano. Já o novo fundo seria utilizado para especulação financeira, através da chamada “capitalização”. Isso ficou de fora.
Outro recuo do governo foi em relação a própria alíquota. A proposta inicial não só ampliava para 14%, como reduzia a alíquota do governo e ainda propunha uma alíquota complementar para o servidor que faria variar o desconto entre 15 a 19%.
Com o projeto pela metade, a votação foi feita entre o natal e o ano novo. Na ocasião, os servidores fizeram intensas manifestações que foram duramente reprimidas pela PM e a Guarda Municipal.
“Não tem arrego”
Apesar da aprovação do projeto, os servidores não se deram por vencidos e no mesmo dia da votação decretaram uma greve para o início do ano letivo, aos gritos de “não tem arrego”.
A greve se espalha por toda a prefeitura. O movimento se choca com um prefeito intransigente e que determina práticas antissindicais para intimidar os trabalhadores.
Bruno Covas declarou que não revoga a reforma “nem morto”. Determinou o corte de ponto e manda arrancar cartazes de aviso de greve das unidades paralisadas. Chegou a falar na imprensa que não “há greve, apenas algumas poucas unidades paradas”, mas, contraditoriamente, exigiu a suspensão do movimento para qualquer negociação, o que a categoria recusou.
Para Sérgio Antiquera, presidente do SINDSEP, “a greve tem crescido desde o primeiro ato e as tentativas de intimidação dos trabalhadores mostram que ele (o prefeito) está assustado com a repercussão da greve, que ataca diretamente sua imagem, ainda mais que quer ser candidato a reeleição. Estamos respondendo a isso, dizendo claramente que se trata de prática antissindical que fere o direito de greve”.
Organização, luta e apoio da população
O grande desafio é conseguir organizar os trabalhadores da Prefeitura numa cidade com mais de 12 milhões de habitantes e mais de 5 mil unidades de trabalho. Segundo Antiquera, a aposta é também “a organização e mobilização regional, através da construção de comandos unificados, porque assim conseguimos parar novas unidades todos os dias”.
Para Fabiana Oshiro, professora do Ensino Infantil e conselheira do SINPEEM, a luta unitária é muito importante pois “mostra que a greve tem uma característica bem diferente das anteriores, a unidade não ficou só no discurso, pois desde o início os comandos foram organizados em conjunto, sem deixar ninguém isolado”.
Oshiro destaca que isso ajuda a mostrar a importância do serviço público para toda a população e aumenta a visibilidade do movimento. “A gente consegue conversar com a população e falamos também sobre a contrarreforma nacional”.
Além de professora, Fabiana também tem uma filha numa escola pública em greve e numa reunião de pais e mestres testemunhou o apoio de 100% dos pais depois da fala de uma grevista: “eles entenderam que o ataque a previdência e à seguridade social está vindo de todos os lados”.
E não é só na educação em que há apoio da população. Segundo a Dra. Ligia, médica em greve, na saúde também os pacientes compreendem e apoiam intensamente. Para ela, “apesar do sofrimento da população com o sucateamento dos equipamentos de saúde, muitos pacientes nos veem como porta vozes da indignação, compreendendo que a defesa da previdência não é uma causa só nossa”
Uma luta nacional
Está claro que não há uma separação entre as coisas. Bruno Covas, João Dória e seus asseclas a serviço do mercado financeiro enxergam a reforma da previdência municipal como um mero complemento da reforma geral preparada pelo governo Bolsonaro.
Os servidores de São Paulo têm consciência desse fato e sabem que não basta derrotar a reforma local, é preciso preparar a luta que virá contra a reforma geral da Previdência. Apesar de alguns dirigentes as vezes “esquecerem” que é a Previdência que está em jogo, focando apenas no “confisco salarial”, na hora de conversar com o povo, os trabalhadores fazem questão de lembrar que há um ataque de conjunto à aposentadoria.
Por isso os sindicatos devem participar com força da assembleia geral da classe trabalhadora no dia 20, organizada pelas Centrais, contra a reforma da Previdência.
O resultado dessa greve ainda é imprevisível, mas já é visível o avanço na consciência dos trabalhadores sobre a dura batalha que terão que enfrentar para defender o seu direito a se aposentar.
João Batista Gomes e Luã Cupolillo
TIREM AS MÃOS DO DIREITO DE GREVE!
Entre as práticas antissindicais do prefeito Bruno Covas está a de arrancar cartazes dos grevistas e transferir trabalhadores da saúde de modo informal para furar a greve em unidades paralisadas.
Foi o que aconteceu no Serviço de Atendimento Especializado (SAE) de Campos Elíseos. Muitos se recusaram a furar greve de colegas e avisaram o SINDSEP, que através do comando regional fez um chamado à categoria para reagir. No dia seguinte, cerca de 30 trabalhadores em greve de diferentes unidades baixaram no SAE, recolocaram os cartazes e avisaram: se transferir gente, vai ter piquete!