Arcabouço: ameaça de calabouço 

Para que precisam de um arcabouço fiscal?

O Substitutivo do Projeto de Lei Complementar (PLP 93/23) do “arcabouço fiscal”, do relator deputado Cajado (PP) em acordo com o ministro Haddad, tem o mesmo esquema da proposta original do governo Lula, só que piorada. Ele foi aprovado por 372 contra 108 votos, sem destaques, e agora vai ao Senado.

Resumindo, ele substitui o Teto de gastos de Temer por uma novo limite – com poucas exclusões – que vincula o aumento da despesa ao aumento da receita. Mas a nação não é como a receita-despesa numa família, porque o Estado emite moeda e regula a economia. 

Mas a despesa ficará no limite de 70% do crescimento da receita, caso cumpra-se a meta de superávits primários – crescentes nos próximos 4 anos – e caso não cumpra, o limite é reduzido a 50%. Há uma banda de flutuação de 0,6% a 2,5% que não muda o essencial: garantir a dívida.

Não há limite para pagar os juros da dívida, porque os capitais chantageiam ameaçando sair fora, pois desfrutam de livre mobilidade. 

Piorou

A versão votada piorou porque o relator com o ministro, reincluíram no limite de gastos os programas sociais e os investimentos em estatais não-financeiras, como a Petrobras. Também reincluíram o Fundeb, os servidores públicos, além do piso da enfermagem. Voltaram os “contingenciamentos” e os “gatilhos”, e fizeram a regra que ia até 2027 virar permanente. De fora, por ora, ficaram o salário mínimo e o bolsa-família.

O arcabouço pode atingir não apenas certas categorias, e não é exagero dizer que ameaça colocar o desenvolvimento da nação no calabouço das metas de superávit, como nos bons tempos do FMI.

FMI quer mais

Uma “comissão técnica” do FMI esteve discretamente no país entre 2 e 16 de maio, dia da entrega do Substitutivo. Não fique aqui a desconfiança na “coincidência”, pois a sra. Gobinath, vice-diretora do Fundo, já no dia 17, dia da aprovação da urgência do PLP, reuniu-se com o ministro Haddad e tirou uma nota. Entrevistada pelo Valor (19/05), Gobinath repetiu a nota: defende os juros do BC, “maior ambição” no superávit e “enfrentar a rigidez” dos gastos, isto é, os mínimos constitucionais da Saúde e da Educação (que voltarão com a troca do Teto pelo PLP). Essa gente é insaciável.

Por que?

A pressão do mercado é grande devido à crise mundial do sistema, muito maior do que em 2002. Não há boom de commodities facilitando superávits, há a guerra na Ucrânia que, em última instancia, é guerra por mercados.

Mas por que o país precisa de arcabouço fiscal? Não é da “teoria econômica”, muitos países não tem, não é normal nem obrigatório, é uma invenção do FMI. Lula 1 e Lula 2 não tinham, nem o programa de 2018. “Ah, mas tem o Centrão”. Sim, mas quem está surpreso?

Reações

A bancada do PT votou o PLP. Em nome da “lealdade ao governo”, um terço, 22 deputados (e 1 do PCdoB), tirou uma nota crítica. A bancada não questiona o arcabouço. 
O PSOL votou contra, o PL liberou a bancada (1/3 a favor!), mas os destaques de ambos não passaram.

As centrais sindicais tiraram uma nota pedindo para “mudar pontos” do PLP: exclusão dos servidores, dos concursos públicos, e do investimento no serviço público. Mas não questionam o arcabouço. A CNTE denunciou a reinclusão do Fundeb, da saúde e da educação reduzidas ao “mínimo constitucional” (Lula 1 e 2 o superaram), e apelou ao Senado. Mas nesta linha – “farinha pouca, meu pirão primeiro” – arriscam a derrota um por um.

Existem outros caminhos. É necessário unir forças para levar o governo, custe o que custar, ao caminho do desenvolvimento nacional, baseado na soberania popular, na nossa opinião, com novas instituições. É o caminho da mobilização pelos compromissos de campanha.

Markus Sokol

Artigos relacionados

Últimas

Mais lidas