Com ou sem Mandetta o governo é o mesmo

Que Bolsonaro seja o maior solapador ao combate à pandemia da Covid-19,  todos sabem. Até a imprensa internacional, como o Washington Post de 14/04 (“o pior líder global”), já repercute. Ele, com boa parte do empresariado que o apoia, incentiva seus seguidores a não apenas boicotarem o Distanciamento Social como exigirem em funestas carreatas a “volta ao trabalho”.

No fechamento desta edição, Bolsonaro demitiu seu ministro da Saúde, Henrique Mandetta e nomeou Nelson Teich, outro médico ligado à medicina privada. A troca tem a ver com tensões, com o horror de Bolsonaro a qualquer coisa que lhe faça sombra, mas Mandetta virou na propaganda o que não é nem nunca foi.

Quando começaram os rumores da demissão, a mídia destacava que Mandetta, em contraposição a Bolsonaro, era representante de um “setor sano e sério” do governo, comprometido com a campanha contra a Covid-19 e com as recomendações técnicas das comunidades científicas e de Saúde. Ele até teria apoiado as medidas tomadas por governadores e prefeitos de urgente Distanciamento Social para retardar o avanço da pandemia e evitar a superlotação (e o colapso) do sistema hospitalar.

Falso, mesmo em relação a tais medidas elementares, Mandetta contemporizou com seu presidente e aceitou implementar sua política, permitindo que Estados e municípios flexibilizem medidas de distanciamento.

O problema é mais embaixo
No seu ministério, Mandetta não preparou o país desde o surgimento da epidemia. Quase nada foi feito. Não providenciou EPI (equipamento de proteção individual) às equipes de saúde. Não abriu leitos hospitalares e de UTI. Não conseguiu adquirir os ventiladores para o tratamento dos casos graves. Não providenciou os kits para a testagem em massa, ao menos dos casos suspeitos de contaminação. E sequer repassou os míseros R$423 milhões (R$ 2 por habitante) de recursos já existentes e devidos aos Estados e municípios.
E isso tem um motivo. Como explica o ex-ministro da Saúde do governo Dilma, Arthur Chioro, Mandetta é e sempre foi contra a Saúde Pública. O fato dele, ainda ministro, aparecer nas TVs de jaleco do SUS “é puro marketing. Ele sempre agiu para tirar recursos do SUS e favorecer planos privados de saúde. Já foi dirigente da Unimed. Quando deputado (DEM/MS), participou ativamente do golpe de 2016, votou a favor da EC-95, que congelou os gastos da Saúde e Educação por 20 anos. Desde 2018, essa sua EC-95 já retirou R$22,5 bilhões para a Saúde! Assim que assumiu o governo, ele destruiu o Programa Mais Médicos, os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf) e a Farmácia Popular”.

O governo fez marketing seu plano emergencial de verbas à Saúde, os R$14 bilhões das duas Medidas Provisórias (março e abril). Além dessas verbas serem muito menores do que os R$ 22,5 bi cortados pela EC-95, parte de seus recursos – se forem mesmo implementados – serão desviados do SUS aos lucros do sistema privado.

Às cegas
E o pior é que o combate à pandemia segue sendo feito às cegas. O próprio Mandetta reconheceu que o número efetivo de casos e de mortes por Covid-19 no Brasil deve ser dezenas de vezes maior do que os registros oficiais (respectivamente 33.682 e 2.141 até 17/04).

Dos 32 países com maior número de casos registrados, Brasil e Índia são os dois únicos que realizaram menos de 300 testes por milhão de pessoas – a média dos demais países tem sido cerca de 11 mil por milhão.

Nos últimos cinco anos, a média do mês de março de internações por SARG (Síndrome Respiratória Aguda Grave: pneumonias, bronquites, asmas, etc) no Brasil foi de 2,9 mil. Em março deste ano, tais internações atingiram os 18,6 mil (6,4 vezes mais). É muito provável que os 15,7 mil a mais deste ano estão com Covid-19. Isso seria quase 11 vezes mais do que aqueles (1,5 mil) positiva e oficialmente notificados. O que coincide com a estimativa da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) e do London Imperial College de que, no Brasil, para cada caso oficial há outros 11 a 12 casos não registrados. O mesmo deve ocorrer com o número de mortos: uma enorme subnotificação.

E essa diferença deve explodir em abril e maio – quando se prevê a aceleração exponencial da contaminação no país que possui 45 mil leitos em UTI, mas só 19 mil são da rede pública, responsável por atender 70% da população. Assim fica desassistida a população mais exposta aos riscos de morte, não apenas os idosos, mas sobretudo os milhões de trabalhadores pobres, negros e o povo das periferias. O governo Bolsonaro com seus ministros, é um obstáculo maior para o país enfrentar a escalada da pandemia que está por vir.

Alberto Handfas

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