Cortejo popular e político marca bicentenário da “Independência” na Bahia

Milhares de pessoas foram às ruas de Salvador para comemorar a data que é o marco da expulsão do exército português da Bahia e do Brasil.

Apesar da “Independência” proclamada pelo filho do rei de Portugal em 7 de setembro, foi mantida a escravidão e a monarquia, subordinada aos interesses britânicos, portanto distante de uma independência plena.

Mesmo assim a Coroa portuguesa não aceitava nenhum movimento de independência e ocupou Salvador, fato que desencadeou uma resistência envolvendo setores populares que durou de fevereiro de 1822 a 2 de julho com batalhas intensas e sangrentas.

O estopim
Em fevereiro de 1822 a mando da coroa portuguesa o brigadeiro Madeira de Melo ocupou Salvador gerando confusão e insatisfação.

Entre 18 e 21 ocorreram batalhas na cidade e as tropas assassinaram Joana Angélica no Convento da Lapa quando a abadessa tentou impedir a entrada dos invasores.

A ocupação agravou a crise e muitas famílias se refugiaram no Recôncavo baiano temendo represálias e, também por rumores de que lá se organizava a luta pela independência. Na Vila de Cachoeira, importante reduto econômico de tabaco e algodão, se constituiu em 26 de junho um novo poder apoiado por populares, a Junta Interina, que foi atacada pelas tropas portuguesas. Foi o estopim da guerra.

O exército brasileiro foi se constituindo com batalhões de proprietários, escravos, lavradores, brancos pobres e negros livres.

Batalhas decisivas e o 2 de julho
Em 8 de novembro de 1822, já após a proclamação por Dom Pedro, ocorreram conflitos decisivos em Pirajá, onde combateu Maria Quitéria, feirense que se vestiu de soldado para ingressar no exército. O recuo das tropas portuguesas ocorre após o corneteiro Luís López ter dado a ordem de avançar e degolar ao invés de cumprir a ordem de recuar dada pelo Major Barros Falcão. As tropas brasileiras se encorajaram e os portugueses correram assustados.

A carestia crescia na Salvador ocupada. Carne, galinha, ovos e farinha subiam de preço. Ampliava-se o apoio a dom Pedro I por outras províncias, em que pese este não instalar a Assembleia Constituinte. Cercado em meio à fome e doenças, Madeira de Melo foge na madrugada de 2 de julho de Salvador e as tropas brasileiras tomam os quarteis e desfilam na cidade. Os portugueses são expulsos.

A luta contra a escravidão
Apesar de se apoiarem nos escravos e negros livres para vencer os portugueses, os escravocratas temiam a luta dos escravos e quilombos contra a escravidão. Era uma questão intocável para os proprietários de engenhos brasileiros, Cortes portuguesas, o rei, dom Pedro I e toda a aristocracia, que não queriam uma mudança da ordem social de mais de três séculos do tráfico negreiro e do trabalho escravo.

O assombro não era por acaso. A luta da independência veio no rastro de grandes revoltas escravas como a Conjuração Baiana de agosto de 1798 pela abolição e a República. Era a “revolta dos pulsos contra os ferros” disse Castro Alves. O medo do haitianismo em função da revolução negra no Haiti aterrorizava as elites.

Em meio à guerra havia a luta do povo negro, como do Quilombo do Urubu, localizado em Pirajá e de quilombolas da Ilha de Itaparica que deram uma surra nos portugueses e queimaram vários navios na baía liderados pela marisqueira negra Maria Felipa. Como afirma o historiador Luís Henrique Dias Tavares, “os levantes de negros não podem ser explicados como interferência de militares e portugueses, porque se constituíram episódios autênticos e profundos e refletiram a revolta dos escravos contra a escravidão”.

A independência hoje
O 2 de julho tornou-se um cortejo popular e político com irreverência, criatividade e uma expressão da luta de classes com faixas e cartazes de diversas categorias de trabalhadores e movimentos com suas reivindicações como pôde ver Lula, que participou esse ano.

É o povo trabalhador que segue lutando pela verdadeira independência que ainda está para ser conquistada, num país totalmente liberto do domínio estrangeiro, para fazer jus ao hino ao 2 de julho “com tiranos não combinam, brasileiros corações”.

Paulo Riela

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