Eleições na Itália causam sobressalto

“Um terremoto político”, escre­veu o jornal “Il Corriere dela Sera” após as eleições italianas de 4 de março. “Um cataclismo eleitoral”, segundo o “Le Monde”. Na votação, manifestou-se uma rejeição ampla aos herdeiros dos partidos que há dé­cadas governam o país em função dos interesses dos patrões, dos banqueiros e dos especuladores, eliminando di­reitos e conquistas dos trabalhadores.

O Partido Democrata (PD), do governo em exercício desde 2013, obteve menos de 19% dos votos (ante 41% nas eleições europeias de 2014). O Força Itália, de Berlusconi, que esteve no poder por diversas vezes entre 1994 e 2011, atingiu 15%. É um sobressalto que atinge toda a União Europeia (UE), já atolada em uma crise profunda. A Itália é a terceira maior potência da zona do euro.

Foi o Movimento Cinco Estrelas (M5S) que ficou à frente, com 32% dos votos. Esse grupo, que se diz “nem de direita nem de esquerda”, capitalizou, com seu slogan “varrer a velha casta de políticos”, a profunda rejeição a esses partidos no poder há décadas, em particular o PD, qualifi­cado como “ninho de corruptos”.

Denunciando de maneira demagó­gica as políticas de austeridade da UE e o euro, apoiando-se no isolamento da Itália diante dos 600 mil imigrantes que entraram na península nos últi­mos anos, comprometendo-se a rever a Lei Fornero (que adiou a idade de iní­cio da aposentadoria para 67 anos) ou o Jobs Act (contrarreforma trabalhis­ta), do ex-primeiro-ministro Matteo Renzi (PD), o M5S conseguiu ganhar os votos do eleitorado decepcionado do PD, dos jovens ditos da “geração desemprego” e dos abstencionistas.

Não é de se admirar, portanto, que esse grupo tenha atingido mais de 50% dos votos na Campânia ou 48% na Si­cília, regiões do sul onde o desemprego é uma praga endêmica. Regiões que, ano após ano, são empurradas para a pobreza, nas quais os serviços públicos têm sofrido desmantelamento por parte do Estado, e que fornecem uma mão de obra sem direitos.

Uma política desenvolvida por dé­cadas, qualquer que fosse o governo, o do PD de Renzi, ou o de Berlusconi, outro grande perdedor das eleições. Berlusconi foi superado por seu aliado da coalizão de direita, a Liga (ex-Liga do Norte), que teve 17% dos votos.

Tranquilizar “mercados”

Há um pouco mais de um ano, em dezembro de 2016, os trabalhadores, os jovens, os aposentados impuse­ram uma derrota contundente ao governo Renzi. Depois de ter aprova­do o Jobs Act, a reforma do serviço público (que introduziu a possibi­lidade de demitir os servidores) e a “modernização” da escola pública (que abriu a via à sua destruição), o chefe do governo propôs uma refor­ma constitucional. Pretendia alterar a Constituição de 1945, em vigor após a derrota do fascismo, para fazer uma reforma do Senado (que tem os mesmos poderes que a Câmara dos Deputados) e a supressão das províncias. A principal central sindi­cal italiana, a CGIL, chamou o voto “não”, e a reforma foi rejeitada por uma votação esmagadora de 60%. Renzi foi expulso do poder.

Agora, após as eleições de 4 de março, nenhum partido pode pre­tender formar sozinho um governo. São necessários 40% dos votos. Uma situação de incerteza política que alimenta a grande inquietação das instituições europeias.

Os “vencedores” estão pressionados a tranquilizar os “mercados” e a UE. Luigi Di Maio, líder do M5S, afirmou: “Nós sentimos a responsabilidade de oferecer um governo ao país. Dizemos isso em primeiro lugar aos investidores”. E Matteo Salvini, pela Liga, dirigindo-se também aos meios empresariais, disse: “Eles não têm nada a temer”. À UE, garantiu: “Nós estamos na Europa e queremos uma Europa que faça pouco, mas bem”.

O certo é que, qualquer que seja o governo formado, quaisquer que se­jam as combinações entre as diferentes forças políticas, será um governo de grande fragilidade e instabilidade, que terá como encargo continuar uma po­lítica rejeitada pela imensa maioria de uma população que deverá enfrentar.

Marie Stagliano, do jornal “Informações Operárias”, da França

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