Ofensiva contra o direito das mulheres

Seguem na pauta do Congresso Nacional projetos que atacam o aborto legal

Passadas as eleições municipais, já era de se esperar a retomada do Projeto de Lei (PL 1904), que restringe o direito de aborto legal após as 22 semanas e criminaliza pacientes e profissionais. Um PL que aprofunda o abismo entre a necessidade de garantia de políticas de proteção e saúde das mulheres e crianças, com o que é realmente ofertado no nosso Estado, e criminaliza e vitimiza ainda mais quem necessita de serviços de segurança e de saúde. 

Mas no Congresso resgatou-se também um Projeto de Emenda Constitucional (PEC 164/2012) de Eduardo Cunha, que prevê incluir na Constituição Federal a “inviolabilidade do direito à vida desde a concepção”. Traduzindo: essa proposta inviabilizaria todos os casos de aborto previstos em lei no Brasil hoje! Todas as possibilidades de aborto legal permitidas (violência/estupro, anencefalia e risco de vida da gestante) seriam criminalizados, assim como as pesquisas com célula tronco seriam descontinuadas, e as fertilizações in vitro não seriam permitidas.

A PEC 164 representa um ataque ainda mais profundo aos direitos das mulheres do que o próprio PL 1904. 

Ao mesmo tempo se expôs a ausência de justificativas – além do fundamentalismo da gestão da prefeitura de São Paulo- pelo fechamento do serviço de referência de aborto legal do Hospital e Maternidade e escola Vila nova Cachoeirinha em SP, decidida pelo prefeito Ricardo Nunes, reeleito! 

Nos debates eleitorais a desculpa utilizada pelo prefeito era que a decisão de fechar o serviço ao aborto legal foi para dar vazão à fila de cirurgias de endometriose, esta desculpa não se sustenta mais. A fila foi zerada no município e o serviço ainda não foi reaberto. 

Tivemos notícia de inquérito aberto esse mês de novembro pelo Ministério Público Federal contra o CREMESP (conselho regional de medicina de São Paulo), devido a perseguição dos profissionais médicos desse serviço. 

Essas mudanças na legislação e na oferta de serviços não são baseados na avaliação da realidade em que as mulheres e meninas da classe trabalhadora vivem.

Em 2023, o Brasil registrou um estupro a cada seis minutos — o maior número da série histórica do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que acompanha esses dados desde 2011. Das 83.988 vítimas, o maior percentual foram meninas (88,2%), negras (52,2%) e com no máximo 13 anos (61,6%). A maioria dessas vítimas é estuprada por familiares ou conhecidos (84,7%) dentro de suas próprias casas (61,7%). 

A cada ano, milhares dessas meninas engravidam no Brasil. Em 2021, foram registrados 17.456 nascidos vivos de meninas de até 14 anos, e, em 2023, dados preliminares indicam que esse número também foi alarmante, com 13.909 nascidos vivos. 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que as complicações durante a gravidez e o parto são a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 19 anos em todo o mundo. No Brasil, dados indicam que, entre 2018 e 2023, uma menina ou adolescente (10-19 anos) morreu a cada semana devido a complicações relacionadas à gestação.

O avanço da extrema direita nos resultados eleitorais desse ano acirra os defensores de projetos no legislativo e mudanças na saúde pública que significam retrocessos e se tornam um maior risco de aprofundamento desse cenário horripilante.

Para o enfrentar esta ofensiva, devem seguir iniciativas, como a da Frente em Defesa das/os trabalhadoras/es dos direitos reprodutivos, que no último dia 4 de novembro realizou debate em torno do lançamento do documentário “Incompatível com a vida”.  Há também a chamada de audiência pública pela Dep Fed Sâmia Bonfim (PSOL) que acontecerá no próximo dia 28 de novembro na Câmara de Sp com o tema “Violação ao direto de aborto legal na cidade de Sp”. A luta prosseguirá!

O PL 1904, foi alvo de protestos com massivas manifestações de mulheres e jovens. Sigamos mobilizadas e atentas: só nas ruas podemos derrotar esta ofensiva do Congresso Nacional contra o direito ao aborto. Abaixo o PL 1904, abaixo a PEC 164!

Juliana Salles

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