Palestina: “na esperança de voltar para casa”

Salah Salah, refugiado palestino desde a Nakba (catástrofe) com a criação do Estado de Israel em 1948, que expulsou os palestinos de suas casas e terras, escreveu uma carta a Luísa Hanune (secretária do PT da Argélia) e Dominique Canut (da direção do Partido Operário Independente da França), ambos coordenadores do Acordo Internacional dos Trabalhadores e dos Povos (AcIT). A carta, uma denúncia da ofensiva do Estado de Israel, fala sobre a ameaça de anexação a Israel de 30% do território da Cisjordânia. Salah pede uma campanha internacional contra esta tentativa. A anexação faz parte do “acordo do século” feito entre os governos dos Estados Unidos e de Israel e foi anunciado por Trump em janeiro deste ano. Abaixo a íntegra da carta.

Salah Salah, do Conselho Nacional Palestino
Salah Salah, do
Conselho Nacional
Palestino

“Camaradas Luísa Hanune e Dominique Canut,
Dirijo-me a vocês com respeito e consideração e parabenizo em particular a camarada Luísa Hanune por ter conseguido recuperar a sua liberdade e retornar à sua atividade militante com energia e dinamismo. Desejo-lhe muita e duradoura saúde.

Devido ao obstáculo que constitui o coronavírus, é difícil realizarmos a reunião da coordenação internacional do Acordo Internacional dos Trabalhadores e dos Povos (AcIT). Por isso, considerei oportuno levantar com vocês, e através de vocês, no âmbito do Acordo, algumas questões e fatos muito sérios a “nível palestino”.

Nos últimos anos, Israel tem levado adiante ativamente sua política racista afirmada pelo Knesset sob o marco da lei do “Estado nação do povo judeu”, que considera todas as fronteiras históricas da Palestina como sendo as fronteiras do Estado de Israel.

Isso lhe dá o direito de erigir colônias na Cisjordânia e anexá-las como já aconteceu em 2019 com a proclamação dos Qods (Jerusalém) como a capital unificada de Israel. Em 2020, é a vez do vale do Jordão, que representa 24% da superfície da Cisjordânia e constitui sua parte agrícola mais rica, o que garante o fornecimento de vegetais aos habitantes das áreas administradas pela Autoridade Palestina.

Depois disso, será anunciada oficialmente a anexação da zona C, cuja área representa 60% da Cisjordânia. Com isso, apenas 12% de toda a Cisjordânia e Gaza permanecerão sob a administração da Autoridade Palestina. Israel se atreve a tomar medidas políticas tão agressivas porque goza de cobertura total dos Estados Unidos de Trump, sob o “acordo do século”.

Também desfruta da normalização das relações com alguns regimes árabes reacionários e goza de impunidade internacional desde 1948, o que encoraja em sua política cada vez mais feroz contra o povo palestino.

Finalmente, Israel se beneficia da divisão das fileiras palestinas, bem como da política de capitulação da Autoridade Palestina.

A política que Israel gradualmente leva a cabo no âmbito da implementação de seus planos é inseparável de sua presença, através da apropriação de 78% do território da Palestina em 1948, seguida por sua progressiva expansão em direção à colonização de toda a Palestina após o Guerra de 1967, e mais tarde a anexação do Golã sírio e das fazendas libanesas de Shebaâ.

Sob pressão de uma ampla oposição ao plano de anexação, tanto em meio à população palestina quanto na árabe, e em todo o mundo, oposição que tomou várias formas, incluindo protestos em massa, o presidente dos EUA e o primeiro-ministro de Israel decidiram adiar a anexação prevista para 1º de julho. Eles concordaram em adiar a anexação, aguardando condições mais favoráveis, ou em etapas e sem ruídos da mídia.

As etapas do plano de anexação de Israel buscam estabelecer de maneira concreta que não há nenhuma perspectiva de uma solução política, que os palestinos não obterão seus direitos, nem ao Estado soberano, nem ao retorno de refugiados, nem à autodeterminação.

Essa situação é clara para a direção de Oslo (Fatah) na Cisjordânia, e o mesmo para o Hamas, que chefia a Autoridade em Gaza. Ambos estão cientes do calibre do impasse no movimento nacional palestino, mas ambos são incapazes de apresentar soluções para escapar dele. O acordo entre a Fatah e o Hamas para lidar com a anexação não oferece nenhuma solução.

A solução realista e prática exige a abertura de um diálogo global entre todos os componentes e forças palestinas para alcançar uma abordagem comum baseada em um Estado da Palestina, democrático e laico, com cidadania que garanta direitos e deveres iguais, sem distinção de origem, religião ou sexo.

Camaradas do AcIT,
Dirijo-me a vocês como um dos membros da Coordenação Internacional, mas também como refugiado palestino, que vive na Nakba de 1948 na esperança de voltar para casa, para pedir que deem conhecimento desta situação às organizações e amigos membros do Acordo Internacional dos Trabalhadores e dos Povos.

Agradeço a constante e permanente postura de apoio ao povo palestino por parte de vocês, em particular ao direito de retorno dos refugiados.

Espero que o pronunciamento que emane da coordenação do AcIT contra a anexação da Cisjordânia seja acompanhado por uma participação na mobilização internacional em andamento contra a política expansionista de Israel e em apoio ao povo palestino: nas campanhas de boicote a Israel e de pressão sobre os governos que lhes vendem armas, e que parem a cobertura política de seus crimes.

Com minha consideração e respeito,
Salah Salah, Membro do Conselho Nacional Palestino e membro da coordenação da AIT.

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