Venezuela: a busca de um pacto nacional

No ritmo de negociações e eleições, hiperinflação destrói salários

O quadro político na Venezuela está marcado por negociações visando enquadrar o confronto político no terreno eleitoral. O que, por si só, representa o fracasso da linha de derrubada do governo de Nicolás Maduro, promovida desde os EUA e seguida até aqui pelos principais partidos da oposição.

Os acordos dizem respeito à composição do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), três membros identificados com o chavismo e dois com a oposição; a habilitação da coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), com a qual a oposição ganhou as eleições legislativas de 2015, junto com o anuncio do CNE de que 20 novas organizações políticas estão autorizadas a participar das eleições de 21 de novembro.

Maduro informou a eliminação da figura dos “protetores” – autoridades paralelas aos governadores que eram designadas pelo Executivo – e disse estar disposto a sentar-se à mesa de negociação com a oposição em agosto, mediada pela Noruega e com representação dos EUA, que se dará no México.

Negociações avançam também no terreno econômico. Os EUA renovaram a licença da Chevron e outras 14 corporações para suas operações na Venezuela neste ano. O governo Biden, mesmo sem levantar as sanções, sinaliza flexibilizá-las. Oitenta empresas demonstraram interesse em investir na produção e comercialização de petróleo e gás, após a aprovação das novas leis de abertura ao capital privado, incluindo modalidades em que a nação não terá maioria do capital das empresas na área petroleira.

O Departamento do Tesouro dos EUA autorizou algumas exportações e reexportações para a Venezuela de gás liquefeito de petróleo, proibidas por decreto no governo Trump. A presença de Delcy Rodriguez, vice-presidente, na assembleia da Fedecámaras (federação empresarial. NdT) e seu chamado à convivência e ao diálogo político, social e econômico, completam o quadro.

Com a aproximação da data das “megaeleições” regionais –governadores, prefeitos e conselhos legislativos – o partido de governo (PSUV) concluiu a primeira etapa de suas eleições primárias. A segunda, com votação aberta a qualquer eleitor registrado no CNE, será em 8 de agosto, buscando oxigenar o partido, depois do desgaste sofrido nas eleições anteriores, dada a profunda crise econômica e social.

O arquipélago da oposição –derrotada política e militarmente – segue somando-se à via eleitoral. Stalin González, número 2 na Assembleia Nacional presidida por Juan Guaidó, chamou à participação unitária do anti-chavismo nas eleições. A extrema direita, agrupada por Guaidó, anunciou estar aberta à nova rodada de negociações com o governo Maduro antes das eleições de novembro.

Inflação e repressão a sindicalistas
Enquanto nas cúpulas ocorrem reacomodações dos atores políticos rumo a um novo pacto nacional, a deterioração das condições de vida dos trabalhadores continua.

A inflação foi de 333% nos seis primeiros meses de 2021. O salário mínimo integral, reajustado em maio, situa-se em 3,54 dólares, com a alta recente do dólar caiu para 2,4. Já a cesta básica equivale à soma de U$ 300,27. Além disso, ocorrem agressões e detenções quando há movimentos reivindicativos. Só neste ano foram registradas 11 detenções de dirigentes sindicais.

A resistência existe, mas é dispersa, com um movimento sindical fragmentado, diminuído, com setores cooptados pelo governo e outros circunscritos à oposição de direita. Mesmo nesse quadro, surgem espaços, como a Unidade Sindical de Zúlia e outros, que propõem a luta pela reapropriação pelos trabalhadores das organizações sindicais, sobre a base de plataformas de reivindicações.

Será no calor das lutas que se travam que se constituirão as bases para um agrupamento político dos trabalhadores com clara independência de classe. Este é o trabalho impulsionado pela Coordenação Nacional Autônoma e Independente de Trabalhadores (CAIT), para avançar nos níveis de organização e resistir aos ataques em curso e aos que virão.

Alberto Salcedo, de Maracaibo

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